Advogada transexual tenta uma vaga em tribunal máximo da Venezuela

A advogada Tamara Adrián, 56 de idade – com doutorado na Universidade Francesa de Paris II e professora há quase 30 anos das duas principais universidades da Venezuela – é candidata a uma das cadeiras do Tribunal Supremo de Justiça, a mais alta corte do país venezuelano. Pelos seus predicados culturais e pelo seu destaque como operadora do Direito, a nomeação não seria nenhuma surpresa. Mas na imprensa de seu país ganha destaque a informação de que ela é transexual e lésbica.

Para a advogada, também ativista de direitos humanos, sua candidatura propõe ao tribunal um dilema. Ela diz que “se usassem critérios absolutamente objetivos, eu poderia ser indicada”. Mas ela acredita que as chances são mínimas, diante de uma Assembleia Nacional que qualifica de “homolesbotransfóbica” e que contesta a postura “politicamente independente” da advogada.

“Nunca fiz parte de partido político, sou uma pessoa de esquerda de formação, creio na liberdade humana e defendo os direitos humanos. Em consequência, não estou dentro do perfil que se quer ter no tribunal supremo, que é evidentemente de pessoas submissas” – resume ela.

Tamara é um dos 404 candidatos que postulam uma das nove novas vagas de titulares e 32 suplentes no TSJ venezuelano (equivalente ao STF brasileiro) para um período de 12 anos. Feita a pré-seleção pelo tribunal, os candidatos serão designados pela Assembleia Nacional, de maioria chavista, até o próximo dia 20.

“A seleção é fechada, não sei como são os critérios. Não é um processo aberto, transparente, público”, reclama Tamara, que chegou à terceira etapa do processo, de entrevistas.
 
Mudança de sexo

A cirurgia para mudança de sexo, não permitida na Venezuela, ocorreu há quatro anos. Tamara considera ser mais importante usar as palavras “transexual” e “lésbica” como categorias políticas para reivindicação de direitos. “Não me sinto muito diferente do que sempre fui. Não foi um processo fácil, mas nada é fácil quando se vai contra a corrente hegemônica em qualquer âmbito da vida” – conclui.

No dia a dia, diz não sofrer mais preconceito. “Na verdade, o respaldo que tenho hoje não é somente de pessoas lésbicas, gays e transexuais, mas da comunidade de advogados e da comunidade em geral que me vê como alguém fiel a seus pensamentos e suficientemente independente para me realizar como pessoa”, afirma.
 
Na Venezuela, é possível trocar o nome na cédula de identidade, mas o documento anterior não é anulado e deve ser exibido ao lado do novo. Além disso, documentos anteriores à mudança de gênero, como diplomas e outros títulos, permanecem com o antigo nome.

“Isso não é igualdade, porque quando a pessoa vai procurar trabalho tem que explicar porque esse diploma que diz ‘Maria’ é na verdade de ‘Pedro’ e, obviamente, cria-se uma situação de discriminação tácita”, diz a advogada, ela própria vítima da regra que impõe que concorra à vaga no TSJ como Tomáz, seu nome antigo.

 

Fonte: Espaço Vital