Estes são as principais recomendações da Carta de Maceió, concluída em uma iniciativa inédita desde a instituição universal da gratuidade para o registro civil, com a realização do 1° Encontro Brasileiro de Fundos Especiais para o Registro Civil, entre os dias 6 e 7 de novembro, na cidade de Maceió, em Alagoas, e que contou com a participação de representantes de Tribunais de 15 Estados brasileiros, bem como representantes estaduais dos registradores civis do Brasil e instituições governamentais.
Responsável por ministrar a palestra de abertura do 1° Encontro Brasileiro de Fundos Especiais para o Registro Civil, o presidente da Arpen-Brasil, Oscar Paes de Almeida Filho, falou a representantes do Poder Judiciário dos Estados Brasileiros e conclamou a todos a trabalharem pela sustentabilidade do registro civil e combate ao sub-registro, em pronunciamento que foi aplaudido por todos os presentes.
“Todos precisamos entender, e o registrador civil também, que hoje o foco mudou. Antes a formalidade era valorizada, a Lei em primeiro lugar, não importando os sacrifícios que isso constituísse ao cidadão. Hoje, o foco é diferente. Nesta década, o foco é o social, a facilitação para o cidadão. Precisamos todos aceitar esta mudança”, disse o presidente nacional, citando decisão do STF da década de 40 sobre o registro de nascimento em local diverso do nascimento. “Naquela época, a decisão obrigou o cidadão a deslocar-se de São Paulo a Pernambuco, em nome da formalidade da Lei. Este tempo acabou”, destacou.
Ainda segundo o presidente da Arpen-Brasil, os registradores civis já demonstraram que, onde existe fundo de ressarcimento digno, casos de Paraná, Rondônia, Santa Catarina, Minas Gerais, Distrito Federal, o trabalho é desenvolvido de forma sustentável e os índices de sub-registro estão caindo continuamente. “Passados mais de 10 anos da instituição da gratuidade, com Lei que determina a instituição de fundos de compensação, chega a ser desumano que tais serviços sejam prestados ainda sem remuneração alguma em diversos estados do Brasil”, enfatizou.
Estiveram presentes ao 1° Encontro Nacional de Fundos Especiais para o Registro Civil os Estados de São Paulo, Paraná, Minas Gerais, Sergipe, Alagoas, Pernambuco, Paraíba, Ceará, Maranhão, Piauí, Pará, Amapá, Goiás, Tocantins e Acre. Destes, seis não possuem ainda fundo constituído (Acre, Pará, Amapá, Tocantins, Goiás e Maranhão), dois possuem fundos de pouca sustentabilidade (Piauí e Sergipe). Entre os Estados não presentes, quatro não possuem Fundos existentes ou que ainda não entraram em funcionamento (Roraima, Rio Grande do Sul, Bahia e Rio Grande do Norte) e dois possuem fundos insustentáveis (Rio de Janeiro e Mato Grosso do Sul).
Segundo o vice-presidente da Arpen-Brasil e presidente do Recivil-MG, Paulo Risso, o evento realizado em Maceió (AL) marcará uma sensível mudança no Brasil. “Nunca havia visto Judiciário e registradores sentado à mesma mesa discutindo um problema que afeta principalmente o interesse do registro civil”, disse. “Sem dúvida é um momento único em nossa história e precisamos implantar os fundos nos Estados e garantir a sustentabilidade da atividade como um todo”, destacou. “Estamos impressionados e gratificados pelo espaço destinado ao Registro Civil e pela atenção à esta atividade que foi demonstrada com este evento”, destacou o representante do Arpen-PR, ArionToledo Cavalheiros Júnior. Pernambuco, Sergipe e Alagoas também participaram representados por seus presidentes de instituições registrais.
Presente à abertura do evento, o presidente do Tribunal de Justiça do Estado de Alagoas (TJ-AL), Desembargador José Fernandes de Hollanda Ferreira, destacou a importância da realização do evento. “O Estado de Alagoas, sensível à alteração da realidade existente em muitos estados brasileiros e ciente da importância dos atos praticados pelos registradores civis dá um passo consistente no sentido de solucionar este grave problema brasileiro e contribuir para que a prestação dos serviços possam chegar de forma sustentável à população”.
Organizador do evento, o presidente do Fundo Especial para o Registro Civil (FERC), Dr. Maurílio da Silva Ferraz, que durante o evento lançou o projeto “Registro Integral”, que visa erradicar o número de crianças sem o nome do pai no registro no Estado de Alagoas, através da instituição de núcleos de promoção da filiação, também destacou a importância do evento. “Creio que ainda exista uma falta de sensibilidade de alguns Tribunais e de algumas casas Legislativas em se preocupar com este importante mecanismo de sustentabilidade para os cartórios. Com este evento, estamos dando um primeiro passo que pretende reverter esta injustiça em todo o Brasil”, afirmou.
O 1° Encontro Brasileiro de Fundos Especiais para o Registro Civil teve, em seu segundo dia, uma ampla discussão individualizada da situação de cada estado participante no tocante à instituição do Fundo de Ressarcimento dos atos gratuitos do registro civil. São Paulo, Paraná, Minas Gerais, Alagoas, Pernambuco, Ceará, Paraíba expuseram suas Leis e mecanismos de ressarcimento, alguns deles demonstrando a plena eficácia da compensação da gratuidade.
A exposição da situação dos demais estados causou preocupação nos presentes, uma vez que um longo caminho ainda deve ser percorrido para se atingir a plena compensação dos atos gratuitos. No Estado do Piauí, o Fundo é administrado pelo Tribunal de Justiça, a distribuição dos recursos se dá por faixa de renda, mas a compensação não foi repassada nos últimos meses em razão da determinação do presidente do TJ-PI. No Estado de Sergipe, uma batalha travada pelos registradores com o Poder Judiciário reverteu o repasse que antes previa 90% das receitas do Fundo destinadas ao Tribunal e 10% destinadas à compensação dos atos gratuitos. Os registradores não participam da administração do fundo, que é distribuído por faixas de atos, pro-rata, e muitas vezes não atinge o montante necessário para a compensação.
O Estado do Pará apresenta uma situação atípica, uma vez que existe a Lei que instituiu o Fundo, mas este prevê a participação do Executivo em sua administração e a formação do conselho de administração está suspensa há mais de três anos. Os Estados do Amapá, Tocantins, Goiás e Maranhão não possuem fundo constituído, embora o estado de Tocantins já tenha Lei que criou o Funcivil, que ainda não está implantado. Esta situação de não existência de compensação da gratuidade se estende ainda para os Estados de Roraima, Bahia, Rio Grande do Norte e Rio Grande do Sul (Fundo já criado e acumulando receita, mas ainda não compensa os atos). Participante do encontro o Estado do Acre, que prevê para o início do ano que vem o final do concurso que privatizou as serventias, participou do encontro e afirmou que já possui Lei de criação do fundo, embora ainda não regulamentada.
Discussões e palestras
O evento teve início na noite do dia 6 de novembro, com a presença de um coral musical, que encantou os presentes à abertura oficial. Em seguida, formou-se a mesa de trabalhos, composta pelo presidente do TJ-AL, Desembargador José Fernandes de Hollanda Ferreira, pelo presidente do Ferc-AL, Dr. Maurílio da Silva Ferraz, pelo presidente da Arpen-Brasil, Oscar Paes de Almeida Filho, pelo presidente da Anoreg-AL, Iran Vilar Malta e pelo defensor público, Eduardo Antônio de Campos Lopes.
Após as exposições do presidente do TJ-AL, Desembargador José Fernandes de Hollanda Ferreira, pelo presidente do Ferc-AL, Dr. Maurílio da Silva Ferraz, foi a vez do presidente da Arpen-Brasil, Oscar Paes de Almeida Filho dirigir-se ao púlpito do auditório para, durante cerca de 40 minutos, falar a todos os presentes. “A solução para o combate ao sub-registro encontra-se nos fundos, na boa vontade dos tribunais e dos poderes legislativos em trabalhar, junto conosco, pela sustentabilidade do registro civil”, destacou o presidente, aplaudido pelos participantes. Em seguida, foi servido um cocktail, à beira da piscina, a todos os presentes.
O presidente do TJ-AL, Desembargador José Fernandes de Hollanda Ferreira, e o presidente do Ferc-AL, Dr. Maurílio da Silva Ferraz, durante a abertura do Encontro na cidade de Maceió (AL)
A manhã do dia 7 de novembro iniciou-se com uma exposição do juiz superintendente do Fórum de Arapicara, Dr. Orlando Rocha Filho, que falou sobre o funcionamento do Fundo Especial do Registro Civil de Alagoas, suas ações de cidadania, o mecanismo de controle e compensação. Em seguida, o diretor adjunto de assessoria de planejamento do TJ-AL, Dr. Felipe Lobo, falou sobre os mecanismos de fiscalização e o selo de autenticidade, que controla os atos praticados e o recolhimento para o fundo.
Após um intervalo para almoço, iniciou-se os debates do período da tarde, com a apresentação da situação individualizada de cada Estado e a discussão dos próximos passos da iniciativa, assim como a criação do Fórum Nacional dos Fundos Estaduais para o Registro Civil. Por fim, discutiu-se os princípios que nortearão os trabalhos deste Fórum, bem como as recomendações da Carta de Maceió, que serão remetidas a todos os Tribunais de Justiça do Brasil e ao Conselho Nacional da Justiça (CNJ).
Ao final agendou-se ainda a participação do presidente da Arpen-Brasil, Oscar Paes de Almeida Filho, no L Encontro Nacional dos Corregedores Gerais da Justiça (Encoge), onde apresentará as recomendações do Fórum e a necessidade de implementação dos fundos de compensação. O encontro também determinou o local da próxima reunião, que se dará em 2009, no Estado do Paraná.
Veja abaixo a íntegra da Carta de Maceió:
Carta de Maceió
Maceió, aos 7 de novembro de 2008.
Os presentes ao Primeiro Encontro Brasileiro dos Fundos Especiais para o Registro Civil, conjuntamente manifestam sua intenção de verem implantados, em todo o Brasil, os sistemas de compensação da gratuidade do Registro Civil, bem como verem efetivadas ações sociais para erradicação do sub-registro no país.
Para que isso realmente ocorra, assumem o compromisso de, também conjuntamente, encetarem esforços no sentido de:
1. estimular a criação de fundos especiais para o registro civil em todos os Estados, conferindo-lhes plena autonomia administrativa e financeira;
2. promover a estruturação do Fórum Nacional dos Fundos Estaduais para o Registro Civil, cuja criação foi aprovada pela unanimidade dos presentes a este encontro;
3. estabelecer uma pauta de reuniões periódicas do Fórum Nacional para aprofundar conceitos e discutir acerca de procedimentos relacionados ao sistema de gratuidade do registro civil;
4. postular junto aos Poderes Estatais no sentido de adotarem medidas eficazes para compensar, inclusive com recursos do orçamento estatal, os atos de cidadania praticados em nome dos atos gratuitos em sede de serviços notariais e registrais;
5. orientar os Fundos Estaduais para a adoção de campanhas direcionadas à eliminação do sub-registro;
6. estimular as entidades representativas de classe (ANOREG, ARPEN, Fundos Especiais e outras) a assumirem parcerias com os Tribunais de Justiça no sentido de tornar efetiva a erradicação do sub-registro, o que se fará, também, com o aporte de recursos dos Fundos Especiais para o Registro Civil;
7. celebrar parcerias com Bancos, Empresas Privadas, Órgãos, Entidades e Municípios no sentido de implementar medidas para aumentar a prática de atos de cidadania;
8. adotar medidas no sentido de padronizar os procedimentos para rateio dos recursos dos Fundos para o Registro Civil e programas para a emissão das respectivas certidões;
9. divulgar a prática dos atos de cidadania e da relevante função social dos registros civis;
10. aprofundar estudos sobre técnicas e boas práticas para reduzir os índices de fraude, inclusive com a adoção do papel de segurança em todo país;
11. recomendar a adoção de selos de fiscalização para fins de controle e de arrecadação, de modo que deve ser amplamente difundida e aplicada pelos Fundos para o Registro Civil;
12. propugnar para que no órgão gestor de cada fundo se faça presente registrador civil, de preferência cabendo-lhe a presidência da entidade gestora;
13. desenvolver gestões junto aos Tribunais de Justiça do País, ao Conselho Nacional de Justiça e a outros órgãos para que os registradores de registro civil sejam dotados das mínimas condições materiais e humanas necessárias ao seu pleno funcionamento.