Clipping – O que diz Lei – Direito das sucessões – Jornal Estado de Minas

O QUE DIZ A LEI
Direito das sucessões
Ana Carolina Brochado Teixeira: Advogada especializada em Direito de Família e Sucessões, professora de Direito Civil no Centro Universitário UNA, diretora do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM).

Bens


Troca de regime

Sou casada em comunhão universal de bens. Eu e meu marido temos três filhos, mas ele tem um filho mais velho com outra mulher. A herança que recebi dos meus pais deve ser repartida com esse filho do meu marido, no caso de meu falecimento? E qual a porcentagem de meus bens que posso vender ou doar aos meus três filhos, para assegurar que o filho do meu marido não os herde? E, se eu alterar hoje, em cartório, o regime de bens, qual seria o mais indicado para que os bens que eu, sozinha, adquiri, não sejam repassados ao filho do meu marido?

L.M.M., por e-mail

No caso do seu falecimento, seus bens serão distribuídos da seguinte forma:

a) primeiramente, em razão do seu regime de bens, a metade será do seu marido e a outra metade será destinada a seus herdeiros. Esse cálculo ocorrerá da seguinte forma: serão reunidos todos os bens do seu marido, ou que estão em nome dele, e os seus bens – pois todo o patrimônio do casal deverá ser colocado em um único acervo – para só depois dividir igualmente por dois, uma vez que, neste regime, comunicam-se os bens passados e presentes, independentemente de terem sido adquiridos a título gratuito (por herança ou doação) ou oneroso (por meio do esforço comum do casal para tal aquisição, seja tal esforço direto ou indireto);

b) depois de encontrada a sua meação ou a sua parte do acervo total do patrimônio do casal, estes bens serão distribuídos apenas aos seus filhos. Tendo em vista o regime de bens, seu marido não participará desta divisão relativamente à herança, mas tão somente seus filhos.

Logo, o filho do seu marido não recebe nada da sua herança; ele receberá apenas quando o seu marido falecer.

É claro que ele receberá, por via indireta, parte da meação dos bens que pertencerão ao seu marido, por força do regime de bens, quando este falecer, mas não receberá diretamente de você.

Caso você queira adiantar a partilha em vida, poderá doar até a metade dos seus bens aos seus filhos ou, alternativamente, pode fazer um testamento, deixando a sua parte disponível – equivalente a 50% dos bens que pertencerem a você – aos seus descendentes.

Qualquer mudança de regime de bens interfere em duas lógicas: tanto da divisão do patrimônio que chamamos de meação, que pode ser feita em vida ou no momento da morte, e na sucessão, pois atualmente o Código Civil de 2002, no artigo 1.829, I, estabeleceu uma ordem concorrencial do cônjuge com os descendentes, de modo que o cônjuge dividirá a herança com os descendentes se for casado no regime da separação total de bens, comunhão parcial no qual o falecido tenha bens particulares, participação final nos aquestos, bem como outro regime de bens não previsto que foi acertado via pacto antenupcial. Logo, qualquer atitude para a mudança do regime deve ser pensada nesses dois âmbitos: meação e herança.

Separação

Divisão de bens
na comunhão parcial


Tenho 40 anos, sou casada judicialmente (embora separada há pouco tempo, mas só de boca) e tenho uma filha de 9 anos. Gostaria de sua ajuda para tirar uma grande dúvida: sou casada em regime de comunhão parcial de bens, mas tudo que possuímos hoje foi adquirido depois do casamento. São 14 anos de união e descobri por meio de um disque-denúncia para o meu telefone particular que ele tem outra mulher há dois anos. Meu marido não mora mais comigo e minha filha. Com a nossa separação e partilha, minha filha perde alguma coisa se a outra mulher engravidar? Ele pode doar ou fazer um testamento da parte dele integralmente para a filha? Qual o percentual de direito de cada um hoje? A menina já tem direito aos bens atuais ou só depois de nossa morte? A mulher pode obrigá-lo a repartir a parte dele com ela mesmo com a situação legalmente errada? O fato de ele ter arrumado outra e saído de casa traz alguma vantagem para mim?

A.C.C., por e-mail

No caso da pessoa casada, mas separada de fato, como parece ser o caso, a situação já não é a mesma de alguém que é simplesmente casada e que convive com o seu marido. Em razão de o regime de bens ser o da comunhão parcial, tudo aquilo que for adquirido onerosamente na constância do casamento pertencem ao casal; entretanto, com a separação de fato, rompe-se o regime de bens, ou seja, caso tenha havido bens adquiridos após a separação de fato, com dinheiro auferido após o rompimento fático do casamento, este bem pertence apenas àquele que o adquiriu.

No que se refere aos direitos dos filhos, estes são iguais. Depois da Constituição Federal de 1988, todos os filhos passaram a ter os mesmos direitos em relação aos pais, independentemente da origem. Logo, se seu marido tiver outros filhos, a herança dele, quando do seu falecimento, será dividido, seguramente, entre os filhos que ele tiver, devendo ser analisado, também, se ele é casado, vive em união estável etc., no momento da morte. Esse direito também só surge com a morte, pois não existe herança de pessoa viva.

Quanto ao testamento, é possível fazê-lo deixando até 50% dos bens para quem ele quiser, com raras exceções que não englobam a filha. Logo, ele pode fazer um testamento deixando até a metade dos bens para apenas uma filha. Lembre-se de que o testamento é um documento revogável na sua essência, ou seja, a pessoa pode fazer quantos testamentos quiser durante a vida, valendo o último para nortear a sua vontade, depois do falecimento do testador.

No que tange à sua separação, não existe nenhuma penalização para ele no que se refere à partilha dos bens, mesmo tendo sido infiel durante os dois últimos anos do relacionamento. Caso seja proposta uma ação de separação litigiosa, a penalização para o seu marido, no caso de ser considerado culpado pelo fim do casamento, ocorrerá em duas órbitas:

a) a impossibilidade, caso ele necessite, de receber alimentos destinados à preservação do padrão de vida, embora ele possa receber alimentos destinados à sua subsistência;

b) no caso de ele ter agregado seu sobrenome quando do casamento (realidade possível depois do Código Civil de 2002), ele também pode perder o direito a utilizá-lo, caso seja requerido expressamente na petição inicial.

Após feita a partilha de bens entre vocês, nada obsta que ele compartilhe desses bens com a nova companheira, por meio da nova família que veio a constituir.
 
Fonte: Jornal Estado de Minas – Caderno Direito e Justiça