Doação conjunta a cônjuges. Falecimento de um deles

O Código Civil de 2002, aludindo à doação em comum a mais de uma pessoa, dispõe, no parágrafo único do art. 551: Se os donatários, em tal caso, forem marido e mulher, subsistirá na totalidade a doação para o cônjuge sobrevivente.

Jones Figueiredo Alves comenta esse parágrafo único: No caso dos donatários casados entre si, há uma perfeita mutualidade legal para o direito de acrescer: o cônjuge sobrevivo assume, por direito exclusivo, em substituição, a proporção igualitária do outro que faleceu, subsistindo a totalidade da doação em seu favor, não passando os bens aos herdeiros necessários (Novo Código Civil, coordenado por Ricardo Fiúza, ed. Saraiva, 2002, pág. 489).

Perfilham esse entendimento Maria Helena Diniz (Curso de Direito Civil Brasileiro – Teoria das Obrigações Contratuais e Extracontratuais, 3º vol., ed. Saraiva, 2003), César Fiúza (Direito Civil – Curso Completo, ed. Del Rey, 2004) e Carlos Roberto Gonçalves (Direito Civil Brasileiro, ed. Saraiva, 2004, vol. III, pág. 267).

O XXXIII Encontro dos Oficiais de Registro de Imóveis do Brasil, realizado em Porto Alegre em 10/2006, discorrendo sobre o tema O Direito de Acrescer na Doação: Algumas observações sobre o Parágrafo Único do Artigo 551 do Código Civil, assentou, com apoio na doutrina e jurisprudência: O parágrafo único do art. 551 prevê a hipótese de que, em caso de doação de bem a casal, não havendo, expressamente, declaração em contrário, a titularidade de tal bem subsistirá, no caso de falecimento de um deles, ao cônjuge sobrevivo. Acrescentou, em caso de doação de imóvel, que Ao Oficial do Registro de Imóveis cumpre fiscalizar a observância do referido dispositivo. Assim, não poderá, de forma alguma, registrar o formal de partilha em que o imóvel que havia sido doado ao casal, na forma do parágrafo único do artigo 551, seja destinado a outros herdeiros, que não ao próprio cônjuge. Concluiu, afirmando que bastará ao cônjuge sobrevivo levar a certidão de óbito do outro ao Oficial do Registro de Imóveis, para averbação à margem da matrícula do imóvel e assim veja incorporada ao seu patrimônio a parte que pertencia ao finado, fazendo valer o preceito do parágrafo único do art. 551.

A Corregedoria Geral de Justiça do TJSP, interpretando o parágrafo único do art. 551 do CC de 2002, destacou, em 4 de junho de 2007, com amparo na doutrina, que subsistirá a doação de imóvel feita a marido e mulher, na totalidade, para o cônjuge sobrevivo, quando um deles falecer, não passando a parte deste aos seus herdeiros, se não houver disposição expressa em contrário (Processo CG.958/2006).

O art. 551 e seu parágrafo único reproduzem, literalmente, as regras do art. 1.178 e parágrafo único do CC de 1916, em cuja vigência outro não era o entendimento da doutrina e jurisprudência.

Clóvis Beviláqua via, na exceção do parágrafo único do art. 1.178, um direito de acrescer, que atende à situação especial dos cônjuges, cujos interesses se transfundem reciprocamente (Código Civil, Ed. Rio, 1958, pág. 280).

Em lição de Agostinho Alvim, a parte do cônjuge que falece em primeiro lugar não passa aos seus herdeiros (sucessão legítima) nem aos que porventura designasse em testamento (sucessão testamentária), e sim ao outro cônjuge, exclusivamente, salvo convenção em contrário, sendo indiferente o regime de bens dos donatários, porque a lei nenhuma distinção faz (Da Doação, ed. RT, 1963, págs. 204/205).

Para Washington de Barros Monteiro (Direito das Obrigações, ed. Saraiva, 1972, vol. 2, pág. 137). Se os beneficiados são marido e mulher, a regra é o direito de acrescer; a doação subsiste, na totalidade, para o cônjuge sobrevivente (art. 1.178, parágrafo único).

Em julgamento de 1980, o STF, interpretando o parágrafo único do art. 1.178, destacou que bem doado a casal, seja pelos pais, seja por estranho, não tem que ser inventariado, visto que pertence exclusivamente ao cônjuge sobrevivo, em razão da relação matrimonial, acrescentando que o parágrafo único abarca qualquer regime de bens (RTJ 99/813, 815).

O Conselho Superior da Magistratura do TJSP já ordenou, em 1982, ao Oficial de Registro de Imóveis de S.J.do Rio Preto, em processo de dúvida, a averbação da certidão de óbito do cônjuge à margem da transcrição do imóvel doado, provendo recurso do cônjuge sobrevivo, em face do parágrafo único do art. 1.178 do CC de 1916 (RT 559/109).

Em síntese, o parágrafo único do art. 551 do CC atual, correspondendo ao parágrafo único do art. 1.178 do CC anterior, contém uma exceção imperativa – subsistirá na totalidade a doação para o cônjuge sobrevivente – de modo que, não havendo cláusula de incomunicabilidade nem outra restrição, a única interpretação possível é a de que a parte do premorto incorpora-se, automaticamente, à do supérstite, qualquer que seja o regime de bens do casamento.

José Walter Tintori é magistrado estadual aposentado


 

Fonte:Cruzeiro do Sul Online – SP – Últimas Notícias