Artigo- Como iniciar no Serviço Registral das Pessoas Naturais- Bruna de Lima Duarte e Rodrigues Gheren

      Hodiernamente os concursos para as Serventias Extrajudiciais têm atraído cada vez mais candidatos. A autonomia administrativa, o caráter vitalício, a ausência da aposentadoria compulsória e promessa de bons rendimentos – ainda que futuramente em eventual concurso de remoção – são os principais atrativos.

Faz algum tempo que a paixão pela área somada ao conhecimento prático deixou de ser requisito para o ingresso na carreira. Hoje a realidade encontrada são concursos que exigem cada vez menos a matéria específica e o conhecimento da prática. Consequentemente, quem se prepara para enfrentar o concurso, acaba não se especializando como deveria ou gostaria.

Ocorre que após todo o difícil e longo caminho do tão sonhado concurso, é chegado o momento de assumir a Serventia e iniciar os trabalhos, pois o serviço não pode parar. E é para esta turma que está ingressando que o artigo é dirigido.

I-             ENTRADA EM EXERCÍCIO PERANTE O JUIZ DIRETOR DO FORO

Escolhidas as Serventias e publicada a outorga, ocorre, conforme Edital, a Investidura perante a Corregedoria-Geral de Justiça em 30 dias, prorrogáveis por mais 30. Após, há que se entrar em exercício perante o Juiz Diretor do Foro. Há que se tomar cuidado quando essa transição ocorrer no final e início de ano, pois apesar de existirem plantões sabemos que a realidade de cada local é peculiar, então o ideal é que tão logo ocorrida a Investidura na Delegação, se procure a secretaria do fórum para conhecimento da agenda do magistrado.

II-            DIVISÃO DAS SERVENTIAS

Em Minas Gerais as Serventias são divididas da seguinte forma:

Em cada comarca haverá pelo menos 01 especialidade de cada tipo de Serviço, existindo ainda 02 Tabelionatos de Notas. Haverá também 01 RCPN (Registro Civil das Pessoas Naturais) com atribuição notarial em cada distrito ou município que não seja sede da comarca.

Uma Comarca é composta por um ou mais municípios. A sede da comarca fica no município e distrito principal que levam o mesmo nome, ou seja, o nome do município principal que compõe a comarca, também será o nome da mesma. Lá estarão situados o Fórum e outros órgãos.

Porém, cada município pode ser composto de mais de um distrito. O distrito principal é o distrito–sede e também receberá o mesmo nome (município e distrito-sede). Os distritos menores receberão outras denominações.

É importante que se conheça tal organização para que se saiba se poderá ou não praticar um ato, já que o Registro Civil das Pessoas Naturais possui competência territorial.

Se o distrito por menor que seja, possuir um RCPN instalado, ainda que de forma precária – como ainda acontece em muitos casos – o RCPN da sede da comarca NÃO poderá, por exemplo, lavrar um óbito de pessoa que tenha falecido no pequeno distrito.

A única Serventia que possuirá o livro “E” é a localizada no distrito-sede da comarca. Esta será denominada de Registro Civil das Pessoas Naturais e de Interdições e Tutelas (RCPNIT). Os municípios que compõe a Comarca, mas não possuem o seu nome, são impedidos de realizar os atos do Livro E (transcrições de estrangeiros, registros de emancipações, interdições, ausências etc.). Caso a Serventia possua este tipo de livro erroneamente, deve se comunicar ao Juiz Diretor do Foro (que é o Juiz-Corregedor local) para que seja feita a transferência para o acervo correto.

A Serventia que possui o Livro E, não possui atribuição notarial. Todos os RCPN’s que não estão na sede de comarca, possuem tal atribuição. Mas atenção: o titular não é um notário ou tabelião. Este só o é quando titular de um TABELIONATO. A denominação correta para o titular deste tipo de Serviço é “Oficial(a) do RCPN com atribuição notarial”. Nem todos os atos que o Tabelionato pratica poderão ser praticados pelo oficial com atribuição notarial, dependendo sempre de regulamentação específica.

Importante também é ser definida a delimitação do município e do distrito. Caso passem por eles rodovias estaduais ou federais, deve se obter conhecimento sobre a quilometragem inicial e final que os integram. Também devem ser conhecidos os bairros e a área rural que os compõe.

Tais informações podem ser obtidas na Polícia Rodoviária Federal, Fórum (a tabela dos oficiais de justiça ajudam com as distâncias) e Prefeituras, para que se possa saber até onde se pode ou não realizar um casamento fora da Serventia, lavrar um óbito, um nascimento, habilitar noivos para o casamento, entre outros atos. 

III-           MONTAGEM DA SERVENTIA

 

 

Há detalhes importantes no momento da aquisição do mobiliário, tais quais:

1-    A impressão a jato de tinta de fato é mais dispendiosa do que aquela a laser, em virtude da reposição do cartucho ou toner. Porém, segundo especialistas, com o passar do tempo, o que foi impresso a laser pode se perder, apagar, já que no momento da impressão ela só colore o papel, sem marcá-lo. Logo, para perpetuidade e por determinação da Casa da Moeda quando do fornecimento dos papeis de segurança, os livros e certidões somente poderão ser impressos em impressoras a jato de tinta ou matriciais.

Logo, isso deverá ser levado em consideração na hora de adquirir a impressora. Porém devemos lembrar que há necessidade de se fazer fotocópias, impressão de ofícios e outros impressos – que poderão ser a laser.

Dica: Adquirir uma impressora a jato de tinta ou matricial (esta é bem mais cara no momento da aquisição, porém a reposição da fita em longo prazo faz compensar todo o gasto inicial) para as impressões de livros e certidões e outra multifuncional a laser para as demais.

Para adquirir o computador é bom que seja lembrado que o mesmo funcionará o dia todo e que muitas cidades pequenas possuem quedas de energia com frenquência, logo, um bom computador e o no-break são essenciais.

O material ideal para as estantes onde ficarão os livros é o aço inoxidável. Deve ser evitada a madeira por absorver umidade e repassá-la aos livros. Qualquer tipo de estante deve ser com material reforçado, já que os livros são extremamente pesados. Elas devem ser alocadas preferencialmente no meio da sala (e não encostadas na parede) em local separado do atendimento ao público. Os livros jamais poderão ficar no chão. Devem ser observados todos os riscos possíveis que eventualmente poderão ocorrer no momento de limpeza, chuva, enchente, curto, início de incêndio, para que a localização permita o salvamento dos mesmos.   

Uma mesa redonda faz acontecer um atendimento bem mais pessoal e educado, porém, lidar com o público “nem sempre são flores”! Temos que proteger o acervo que nos foi confiado e para tanto a melhor forma conhecida de se separar cliente e funcionário é o balcão.

4-    Os papeis entregues podem ser arquivados em caixas e pastas plásticas para facilitar a limpeza.

5-    Se o caso for de instalação do acervo em novo endereço, o ideal é que se procure local que possua banheiros comunitários (shoppings) ou salas com banheiros internos e externos. O local deve ser central, próximo a bancos, fórum, prefeitura, ponto de ônibus, mas nos dias de realização de casamentos os noivos adorarão se tiver um cenário para fotos e estacionamento para os convidados! Lembre-se de dar acessibilidade a todos, por mais especiais que sejam!

6-   As placas deverão conter a denominação, o horário de atendimento (incluindo os plantões), a titularidade, telefone, endereço e e-mail.

Exemplo:

Registro Civil das Pessoas Naturais com atribuição Notarial do distrito tal

Oficial: Fulano de tal

Substituto: Beltrano de tal 

End: xxxxx            Tel:xxxxxxxx 

Horário de atendimento 

Segunda à sexta – das 9h às 12h e das 14h às 18h

Sábados, domingos e feriados – atendimento em sistema de plantão das 8h às 12h

Em casos urgentes de óbito ligar para: (DDD) celular.

(Conforme Provimento 35/98  CGJ) 

        Não se aconselha mais a utilização das denominações “cartório” na placa oficial, a não ser nas placas de indicações para o público em geral. Também não se indica mais a elaboração e manutenção de nome fantasia. 

Internamente deve haver placa do atendimento prioritário (idosos, gestantes, portadores de necessidades especiais, pessoas com crianças de colo); da gratuidade do Registro de Nascimento, e Óbito para todos e demais atos para os hipossuficientes; tabela básica de emolumentos (com o valor dos emolumentos + TFJ = valor final do usuário – sem os códigos e a divisão do Recompe). Além de quadro de avisos com cartaz dos selos e demais Avisos e ainda quadro para afixação dos proclamas.

8-  Os serviços gráficos dependerão do rendimento mensal de cada serventia. Sabemos que quando se assume uma nova Serventia há vontade e necessidade de divulgar em impressos, cartões de visita, panfletos, envelopes, canetas. Mas deve se conhecer a renda e quantidade de atos feitos primeiramente, pois poderá fazer diferença no orçamento futuro.

9-   Os carimbos devem demonstrar o nome e a função de cada pessoa que integra a serventia.

10- Os livros devem seguir o padrão estabelecido em lei, ainda que o responsável anterior tenha feito de forma diversa, deve ser encerrado o livro anterior para que se corrija. Diversas gráficas já trabalham de forma especializada para cartórios. O livro correto para os registros do RCPN é o de 3 colunas.

11- A publicidade deve ser feita em caráter de informe para o interesse público e deve visar o conhecimento da população acerca do local e horário de atendimento e serviços disponíveis e não a captação de clientes e a concorrência desleal, já que não se trata de um comércio e sim de um serviço público.

IV-          TRANSFERÊNCIA DO ACERVO

O acervo pertence ao Estado e com ele tudo que o acompanha, como banco de dados, cadastros de clientes, livros, papéis e pastas relativos ao mesmo. Isso nos é confiado em caráter privado através de delegação, portanto, extinta uma delegação e iniciada outra, a transferência deverá ocorrer obrigatoriamente e da melhor forma possível. Caso isso não seja possível, pode ser solicitado ao Juiz-Corregedor local, o auxílio de oficiais de justiça, e até de auxilio de força policial caso seja necessário, para tal transição. Independentemente de ser consensual ou não a transferência, TODA a documentação repassada deve ser relacionada em inventário onde assinarão antigo responsável e atual oficial. Caso haja recusa, o juiz resolverá o impasse.

Selos e papéis de segurança quando repassados devem ser enumerados, conferidos e relacionados no inventário. Para as serventias que eventualmente tiverem sido vítimas de muitas fraudes ou crimes, o ideal é que se faça devolução dos selos e papéis de segurança e se solicitem novos, tudo com autorização ou ciência judicial.

V-           CONTRATAÇÃO DE FUNCIONÁRIOS

Os tipos de funcionários conhecidos das serventias extrajudiciais são:

1.    Auxiliares de cartório ou Auxiliares de serviço geral – celetistas contratados por admissão ou sucessão:

    Auxiliam na limpeza, arrumação, serviço externo, setor de arquivo e estoque, sem nada poder lavrar ou assinar.

2.    Escreventes autorizados – celetistas contratados por admissão ou sucessão:

    Podem assinar tudo o que for autorizado (por escrito) pelo Titular, com exceção da subscrição dos livros e de atos não permitidos em lei.

3.   Escrevente substituto designado para responder nas ausências do Titular – celetista contratado por admissão ou sucessão: É quem substitui o Titular em sua eventual ausência, podendo tudo assinar. Deve haver comunicação à Corregedoria-Geral de Justiça e ao Juiz-Corregedor local sobre sua contratação e sua indicação, conforme artigo 20 § 5º da Lei 8.935/94.   

4.  Escreventes substitutos – celetistas contratados por admissão ou sucessão: Assinam tudo o que for permitido pela lei e pelo Titular, porém, não respondem pela serventia na ausência do Titular. Deve haver comunicação Corregedoria-Geral de Justiça e ao Juiz-Corregedor local sobre sua contratação.

Observação: Quem será designado a responder interinamente pelo Serviço quando da renúncia do atual titular ou perda de delegação até o regular provimento por concurso público é o substituto mais antigo e não o nomeado na forma do item 3.

5.    Estatutários que já exerciam função na serventia:

     Deve ser observado o regramento próprio.

Observação: A contratação de escreventes celetistas deve ser feita em nome próprio (pessoa física) com o cadastro “CEI” no INSS. Deve ser ainda baseada nas leis federais e estaduais e ser observado o respectivo piso, dissídio coletivo etc. Em Minas Gerais não há piso mínimo para escreventes, sendo observado o salário mínimo vigente. Para tal contratação deve ser requisitada a prestação de serviços de um contador, já que deverá haver emissão de contracheques, assinatura de CTPS, escrituração em livro de registro de funcionários entre outros atos.   

Demais serviços também poderão ser terceirizados, tais como, serviço de informática, advocacia, entre outros.

VI-          INSTALAÇÃO DE PROGRAMAS

Alguns dos programas indicados para instalação a fim de facilitar o envio das comunicações obrigatórias e a funcionalidade do Serviço são:

1.    CARTOSOFT – programa de automação da Serventia fornecido gratuitamente pelo sindicato RECIVIL aos seus associados;

2.    SISOBINET – programa da Previdência Social para envio dos óbitos;

3.    CERTUNI – programa para solicitação e informação das certidões unificadas em papel de segurança emitido pela Casa da Moeda;

4.    INTRANET – sistema de comunicação entre as Serventias;

5.    GERADOR DE MATRÍCULA – Sistema do CNJ para gerar a matrícula obrigatória (Provimento 3/09) nos modelos padronizados de certidão;

6.    TJMG – Sistema de Declaração de Apuração e Informação da Taxa de Fiscalização Judiciária (DAP/TFJ);

7.    Criação de e-mail para a Serventia

VII-        COMUNICAÇÃO DE NOVA TITULARIDADE AOS ÓRGÃOS

A atualização do cadastro deve ser feita em todos os lugares onde o mesmo tenha sido feito em algum momento, tais como:

1.    CGJ-MG

2.    CNJ

3.    RECIVIL

4.    RECOMPE

5.    INSS

6.    FGTS

7.    CNPJ

8.    E-MAIL, REDES SOCIAIS

9.    CERTUNI

10. DAE

11. DAP

Observação: Deverá ser aberta conta em banco para recebimento do ressarcimento dos atos gratuitos.


VIII-       DIFERENCIAÇÃO ENTRE OS DIVERSOS ÓRGÃOS E ENTIDADES

 

1.  RECOMPE – Fundo de Recursos de Compensação dos Atos Gratuitos criado por lei;

2.  RECIVIL – Sindicato dos Oficiais de Registro Civil das Pessoas Naturais do Estado de Minas Gerais;

3.  ANOREG – Associação dos Notários e Registradores do Brasil – entidade de classe com legitimidade para representar os titulares dos Serviços extrajudiciais;

4.  SERJUS – Associação dos Serventuários da Justiça do Estado de Minas Gerais;

     CNJ – Conselho Nacional de Justiça – instituição pública que visa aperfeiçoar o trabalho do sistema judiciário brasileiro;

     Corregedoria Nacional de Justiça – Órgão do CNJ;

CGJ – Corregedoria-Geral de Justiça-MG – Órgão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais com funções administrativas, de fiscalização e orientação;

Casa da Moeda – empresa pública responsável pela emissão do papel de segurança unificado;

Secretaria de Estado de Fazenda – MG – Planeja, coordena, executa e avalia a política tributária e fiscal estadual;

Receita Federal – Órgão subordinado ao Ministério da Fazenda responsável pela administração dos tributos da União.

IX-          ATENDIMENTO AO PÚBLICO

Alguns detalhes fazem a diferença no atendimento que é dado ao público. O Oficial que se preocupa em realizar um casamento diferenciado, por exemplo, ganha a graça do povo com a leitura de textos com mensagens, a troca de alianças, o espaço especial para fotografias, a sala separada para a sua realização, entre outras delicadezas.

No atendimento diário também é feita a diferenciação quando é vista a preocupação com o “cliente” que está aguardando em uma cadeira confortável, com água e banheiro à sua disposição.

As certidões entregues na hora (independente do prazo legal), a cobrança correta da tabela de emolumentos, a informatização da serventia, a acessibilidade a todos, um coletor digital que não suje o dedo do impossibilitado de assinar e a certidão solicitada por telefone ou e-mail e enviada pelo correio corretamente sem cobranças adicionais proibidas por lei, fizeram dos “cartórios” a 2ª instituição mais confiável para a população, segundo pesquisa do Instituto Datafolha.

X-           DICAS DE CONSERVAÇÃO DO ACERVO

Os principais inimigos do acervo e dos livros são a umidade e o próprio usuário, portanto, quanto mais antigo o livro, mais cuidado deve se ter ao utilizá-lo.

Eles devem ser guardados preferencialmente na vertical (não é bom empilhar um em cima do outro), em estantes de aço inoxidável que estejam afastadas da parede e da umidade, em local com pouca iluminação (de preferência lâmpada incandescente). O manuseio deve ser feito com muito cuidado e a limpeza pode ser feita com pano seco por fora e escova macia por dentro que retire a “poeira” interna sem danificar a folha. Deve ser utilizado equipamento de segurança para efetuar a limpeza (óculos, luvas, máscaras e até jalecos) a fim de se evitar o desencadeamento de doenças respiratórias e de pele.  

 

 

Bruna de Lima Duarte e Rodrigues Gheren

Oficiala de Registro Civil

Especialista em Direito Notarial e Registral pela EMERJ

Aprovada nos Editais 01/05, 01/07, 02/07 e 01/11.