Jurisprudência mineira – Agravo de instrumento – Transferência de quotas societárias – Separação consensual – Registro: obrigação das partes

JURISPRUDÊNCIA MINEIRA

JURISPRUDÊNCIA CÍVEL

AGRAVO DE INSTRUMENTO – TRANSFERÊNCIA DE QUOTAS SOCIETÁRIAS – SEPARAÇÃO CONSENSUAL – REGISTRO: OBRIGAÇÃO DAS PARTES – EFEITOS RETROATIVOS: IMPOSSIBILIDADE
 
– O acordo entabulado em ação de separação estabelece determinados direitos e obrigações para as partes, podendo qualquer delas exigir seu cumprimento.
 
– A transferência de quotas societárias depende da mera vontade do cedente e do cessionário, conforme contrato social, mas somente gera efeitos perante terceiros a partir do registro, cuja realização depende da observância das formalidades legais. 
 
– A desídia das partes no cumprimento do acordo não pode ensejar prejuízos a outrem, daí a inviabilidade de retroação dos efeitos do ato registral fora das situações legalmente abrangidas. 
 
Agravo de Instrumento Cível nº 1.0433.05.153900- 8/001 – Comarca de Montes Claros – Agravante: P.A.F.A.J. – Agravado: G.B.F.A. – Relator: Des. Oliveira Firmo
 
A C Ó R D Ã O
 
Vistos etc., acorda, em Turma, a 7ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, à unanimidade, em negar provimento ao recurso.
 
Belo Horizonte, 19 de março de 2013. – Oliveira Firmo – Relator.
 
N O T A S T A Q U I G R Á F I C A S
 
DES. OLIVEIRA FIRMO – I – Relatório.
 
1. Trata-se de agravo de instrumento interposto por P.A.F.A.J. contra decisão (f. 49/TJ) que, em sede de cumprimento da sentença prolatada na ação de separação judicial que propôs juntamente com G.B.F., indeferiu o pedido de exclusão de seu nome do registro de sociedade comercial com data retroativa a 04.03.2005.
 
2. O agravante alega, em síntese, que:
 
a) em 04.08.2005, foi homologado por sentença o acordo celebrado em ação de separação judicial consensual;
 
b) convencionaram que sua participação na empresa C.A.A.S. Ltda. seria transferida para sua ex-mulher, ora agravada;
 
c) peticionou o cumprimento da sentença com efeito retroativo a 04.08.2005, o que foi deferido em parte, só para impor à agravada o prazo de 10 (dez) dias para promover sua exclusão da sociedade;
 
d) a decisão causa-lhe dano de difícil reparação, tendo em vista que permanece indevidamente responsável por obrigações da sociedade de que já não mais participa. Pede, desde a antecipação da tutela recursal, seja determinada a transferência de suas quotas da empresa referida para a agravada, com efeitos retroativos a 04.08.2005 (f. 2/10-TJ). Junta documentos (f. 11/50-TJ).
 
3. Preparo regular (f. 59-TJ).
 
4. Juízo de admissibilidade do recurso e do processamento como agravo de instrumento; indeferido o efeito ativo da tutela recursal (f. 62/68- TJ).
 
5. Informações do juízo pela retratação negativa e pelo cumprimento do art. 526 do CPC, pelo agravante (f. 76-TJ).
 
6. Sem contraminuta (f. 102-TJ).
 
7. A Procuradoria-Geral de Justiça opina pelo não provimento do recurso (f. 105/108-TJ).
 
É o relatório.
 
II – Mérito.
 
8. Conforme me manifestei por ocasião da apreciação do pedido liminar, pretende o agravante seja determinada a imediata transferência de suas quotas para a agravada, com efeitos retroativos a 04.08.2005, data em que homologado por sentença o acordo celebrado em separação judicial consensual. 
 
9. É dos autos que, naquela ação de separação judicial, as partes convencionaram a partilha do patrimônio, de modo que a participação societária do agravante na empresa C.A.A.S. Ltda. passaria a pertencer com exclusividade à agravada. As partes assumiram a obrigação de promover à necessária alteração do contrato social (f. 43/44-TJ). O acordo foi homologado por sentença proferida em audiência de 04.08.2005.
 
10. Em 08.11.2011, o agravante pleiteou o cumprimento da sentença, com a expedição de ofício à Jucemg para a "retirada de seu nome da empresa", com data retroativa à do termo de audiência (f. 47/48-TJ).
 
11. O pedido foi indeferido, mas determinada a intimação pessoal da agravada para cumprir a decisão em 10 (dez) dias, sob pena de multa, nos exatos termos do art. 475, I, do CPC, que trata do cumprimento da sentença condenatória à obrigação de fazer, verbis:
 
“Art. 475-I. O cumprimento da sentença far-se-á conforme os arts. 461 e 461-A desta Lei ou, tratando-se de obrigação por quantia certa, por execução, nos termos dos demais artigos deste Capítulo.
 
[…]
 
Art. 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento”.
 
12. Nos termos do art. 32, II, da Lei nº 8.934/1994, o serviço de registro público a cargo das juntas comerciais compreende o arquivamento dos documentos relativos à alteração de sociedades mercantis. O pedido de arquivamento, por seu turno, deve ser instruído obrigatoriamente com o instrumento da modificação, assinado pelos sócios ou procuradores (art. 37, I, da Lei nº 8.934/1994) e apresentado em 30 (trinta) dias de sua assinatura, data a que retroagirão os efeitos do arquivamento.
 
Extrapolado o prazo, o arquivamento só terá eficácia a partir da data de sua concessão (arts. 36 da Lei nº 8.934/1994 e 1.151 do CC/2002).
 
13. A atividade de registro público de empresas mercantis é de natureza essencialmente formal, pois visa a garantir a publicidade, autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos das empresas (art. 1º da Lei nº 8.934/1994). Bem por isso, é vedado o registro de documentos que não obedeçam às prescrições legais ou regulamentares, contrariem a ordem pública ou os bons costumes (art. 35 da Lei nº 8.934/1994).
 
14. Além disso, o art. 1.057 do CC/2002 dispõe que o sócio pode ceder total ou parcialmente suas quotas a quem seja sócio, independentemente da audiência dos demais. Prescreve, porém, que a cessão somente terá eficácia quanto à sociedade e terceiros a partir da averbação do respectivo instrumento, inclusive para fins do parágrafo único do art. 1.003, que estabelece que "a cessão total ou parcial de quota, sem a correspondente modificação do contrato social com o consentimento dos demais sócios, não terá eficácia quanto a estes e à sociedade" e que o cedente responderá solidariamente com o cessionário, perante a sociedade e terceiros, pelas obrigações que tinha como sócio, até dois anos depois de averbada a modificação do contrato. 
 
15. Igualmente informada pelos princípios da publicidade e da segurança ínsitos à atividade de registro das sociedades empresárias, a norma do art. 1.154 do CC/2002 dispõe o seguinte:
 
“Art. 1.154. O ato sujeito a registro, ressalvadas disposições especiais da lei, não pode, antes do cumprimento das respectivas formalidades, ser oposto a terceiro, salvo prova de que este o conhecia.
 
Parágrafo único. O terceiro não pode alegar ignorância, desde que cumpridas as referidas formalidades”.
 
16. Por tudo, persevero na convicção acerca da ausência de verossimilhança do alegado direito ao arquivamento de ato modificativo da estrutura societária, pois deduzido em desacordo com as formalidades legais, com pedido de atribuição de eficácia distinta da que lhe confere a lei. 
 
17. Ademais, de se registrar ausente o risco de dano irreparável ou de difícil reparação ao nome do agravante, advindo da sua manutenção nos quadros da sociedade empresária, porquanto, mesmo detendo instrumentos para fazer cumprir desde aquela época o pactuado, deixou transcorrer mais de 6 (seis) anos, havendo, lado outro, a possibilidade de dano a terceiros com a mudança retroativa do quadro societário fora das hipóteses legalmente autorizadas. 
 
III – Conclusão
 
18. Custas, pelo agravante. 
 
É o voto.
 
DES. WASHINGTON FERREIRA – De acordo com o Relator.
 
DES. WANDER MAROTTA – De acordo com o Relator.
 
Súmula – NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO.


Fonte: Diário do Judiciário Eletrônico – MG