Jurisprudência mineira – Direito das Sucessões – Agravo de Instrumento – Abertura de inventário – Escritura de testamento público – Nomeação de inventariante indicado pelo de cujus

DIREITO DAS SUCESSÕES – AGRAVO DE INSTRUMENTO – ABERTURA DE INVENTÁRIO – ESCRITURA DE TESTAMENTO PÚBLICO – NOMEAÇÃO DE INVENTARIANTE INDICADO PELO DE CUJUS – LEGITIMIDADE – DISPOSIÇÃO DE ÚLTIMA VONTADE – MULTA – LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ – EXCLUSÃO – POSSIBILIDADE


– Considerado válido o testamento, suas disposições devem ser cumpridas, desde que não contrariem a lei, inclusive quanto à nomeação do inventariante.


– A legitimidade do agravado independe da condição de herdeiro, legatário, testamenteiro, etc., e decorre do interesse direto no cumprimento da manifestação de vontade constante da cláusula 17 da Escritura de Testamento Público, mediante a qual o de cujus o indicou para a inventariança.


– A discussão a respeito da validade de testamento demanda dilação probatória, devendo ser discutida nas vias ordinárias. 

 

– Quando não se vislumbra intento protelatório na oposição dos embargos, deve ser excluída a multa.


– Recurso provido em parte, apenas para decotar a multa.


Agravo de Instrumento Cível nº 1.0024.13.269618-8/001 – Comarca de Belo Horizonte – Agravantes: Darcy Bessone, Alexandre Garcia Blanco Bessone e outro, Ana Paula Bessone Reis – Agravados: Guilherme Coelho Colen em causa própria – Interessados: Espólio de Leopoldo Pacheco Bessone, Leonardo Cunha Campos Bessone e outro, Frederico Garcia Blanco Bessone – Relatora: Des.ª Heloísa Combat


ACÓRDÃO


Vistos etc., acorda, em Turma, a 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos em dar parcial provimento ao recurso.


Belo Horizonte, 6 de fevereiro de 2014. – Heloísa Combat – Relatora.


NOTAS TAQUIGRÁFICAS


DES.ª HELOÍSA COMBAT – Trata-se de agravo de instrumento interposto por Alexandre Garcia Blanco Bessone, Darcy Bessone e Ana Paula Bessone Reis contra a r. decisão do MM. Juiz da 2ª Vara de Sucessões e Ausências da Comarca de Belo Horizonte que, nos autos da ação de inventário, rejeitou os embargos de declaração opostos pelos agravantes e impôs multa de 1% do valor do monte partilhável em favor do espólio, a título de litigância de má-fé (f. 239-v./241-v.). 


Em suas razões, defendem os agravantes que os embargos não são temerários nem intempestivos, mas um recurso previsto em lei, no que não há litigância de má-fé, devendo-se excluir a multa imposta.


Expõem que o Dr. Leopoldo Pacheco Bessone, pai dos agravantes, faleceu em 07.07.2013, e o ora agravado requereu a abertura do inventário em 08.07.2013 para que ele fosse nomeado inventariante.


Que r. decisão do MM. Juiz primevo que nomeou o agravado como inventariante foi omissa por não apresentar os fundamentos para a abertura de inventário por pessoa que não tinha legitimidade.


Salientam que Guilherme Coelho Cole não é herdeiro, legatário ou credor dos herdeiros, legatários ou do autor da herança, tampouco se encontra na administração dos bens do de cujus.


Arguem que a questão é de ordem pública, devendo-se indeferir a inicial, julgando-se extinto o processo, ausente condição da ação.


Dizem não haver justificativa para nomear estranho, quando existe cônjuge supérstite e filhos do autor da herança para serem nomeados.


Sustentam que não há decisão judicial determinando o cumprimento do testamento, conforme previsto nos arts. 1.125 e 1.126, CPC.


Requerem seja provido o agravo de instrumento, para reforma da r. decisão a quo, cassando-se a multa imposta aos agravantes e julgando extinto o inventário, em face da ilegitimidade do Dr. Guilherme Coelho Colen para pedir a abertura do inventário e destituí-lo da função de inventariante.


Recurso recebido apenas no efeito devolutivo (f. 260/261).


Informações prestadas pelo MM. Juiz primevo à f. 266.


Contraminuta do recorrido (de próprio punho) às f. 268/275.


Decido.


Em sede de agravo, faz-se indispensável a presença da prova inequívoca das alegações de quem pleiteia a liminar, bem como a comprovação da urgência no provimento antecipado; caso contrário, deve-se aguardar a melhor elucidação dos fatos, que se fará nos autos principais.


Da análise do presente conjunto probatório, ressai a irresignação dos herdeiros do espólio de Dr. Leopoldo Pacheco Bessone, ora agravantes, em face da r. decisão primeva de f. 239v./241v., por dois motivos.


A uma, pela nomeação do Sr. Guilherme Coelho Colen, pessoa estranha à herança, para desempenhar a inventariança, o qual não reputam legitimado para o exercício do munus.


A duas, pela fixação de multa de litigância de má-fé em virtude da interposição de embargos declaratórios reputados infundados.


Não obstante, em que pesem os fundamentos externados na peça recursal, deve-se ter em mente que a disposição testamentária é clara e objetiva, não deixando dúvidas quanto à real intenção do testador. Veja-se: "17) – para inventariante o testador nomeia o Dr. Guilherme Coelho Colen, brasileiro, casado, advogado, com escritório na rua […]" (f. 26).


O testamento público, às f. 23/26, redigido pelo Sr. Tabelião de Notas do 5º Ofício de Notas desta Capital, na presença de duas testemunhas, preenche os requisitos legais previstos no art. 1.864 do CC/02, estando o testador em seu perfeito juízo e claro entendimento, no gozo pleno de suas faculdades mentais, como constou.


Assim, nesse juízo sumário, não vejo óbice à manutenção do agravado como inventariante, que inclusive é advogado, e, possivelmente, não irá causar nenhum dano aos agravantes.


Observa-se que o art. 990, inciso VI, do CPC traz a possibilidade de nomeação de "pessoa estranha idônea" como último da lista.


Não se olvide, porém, que esse dispositivo elenca rol taxativo e preferencial daqueles que podem ser nomeados inventariantes, cuja ordem não possui caráter absoluto (vide: REsp 1055633/SP, Rel.ª Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 21.10.2008, DJe de 16.06.2009).


Por ora, devem-se privilegiar as disposições de última vontade do testador, e, consoante constou do v. decisum, o caminho para impugnar a nomeação do inventariante não são os embargos de declaração.


Lembre-se, inexiste direito líquido e certo à permanência no cargo de inventariante; prevalecendo divergências, admite-se sua destituição.


Doutro giro, eventual declaração de nulidade/falsidade de testamento exige dilação probatória, o que inviabiliza sua discussão.


Portanto, o testamento apresentado deve prevalecer, por não ter sido objeto de declaração de falsidade nas vias próprias.


Com efeito, como bem assinalou o agravado, não é a aprovação do testamento que dará legitimidade ao inventariante, e sim a sua nulidade, declarada na ação própria, é que lhe retira essa legitimidade.


A legitimidade do agravado independe da condição de herdeiro, legatário, testamenteiro, etc., decorre do interesse direto no cumprimento da manifestação de vontade constante da cláusula 17 da Escritura de Testamento Público, mediante a qual o de cujus o indicou para a inventariança.


Nesse norte, o art. 1.128 do CPC reconhece a qualquer interessado que demonstre essa condição legitimidade para requerer ao juiz que ordene o cumprimento de testamento público.


Considerado válido o testamento, suas disposições devem ser cumpridas, desde que não contrariem a lei, inclusive no que concerne à nomeação do inventariante.


Quanto à cominação da multa de 1% sobre o acervo partilhável em favor do espólio, em desfavor dos agravados, sob o fundamento de que opuseram embargos declaratórios infundados, tenho por bem decotá-la.


A meu ver, é indevida a imposição da multa por litigância de má-fé, tendo em vista que, por mais que o MM. Juiz tenha rejeitado os embargos, a oposição do recurso não se mostrou infundada ou de cunho protelatório. Entendo que se deu apenas exercício de um direito.


Pelo exposto, dou parcial provimento ao recurso, reformando a r. decisão guerreada, apenas para decotar a condenação à multa de 1% do montante partilhável em desfavor dos agravantes por litigância de má-fé.


Custas, rateadas na proporção de 50% para cada parte.


Votaram de acordo com a Relatora os Desembargadores Ana Paula Caixeta e Moreira Diniz.


Súmula – DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO.

 

Fonte: Diário do Judiciário Eletrônico – MG