Em julgamento inédito no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, a 7ª Câmara Cível da corte decidiu, por 3 votos a 2, que o corpo de engenheiro Luiz Felippe Dias Monteiro deve ser enterrado e não submetido a criogenia — ou seja congelado a temperaturas baixíssimas —, como queria uma das filhas do falecido.
Entretanto, a decisão vitoriosa está suspensa por ter sido concedida parcialmente. O relator dos Embargos Infringentes, Ricardo Couto de Castro, disse que o enterro só poderia acontecer após o trânsito em julgado da ação. “A questão é muito delicada por não haver testamento expresso de vontade do falecido, que queria ser congelado após sua morte, e nem há uma legislação que prescreva o modus operandis do emprego da criogenia no Brasil”, ressaltou o relator, ao votar nesta quarta-feira (20/8).
Com a morte do engenheiro, em 2012, sua filha mais nova, de um segundo casamento, avisou às duas meias-irmãs que moram no Rio Grande do Sul que o corpo de seu pai seria embalsamado e enviado aos Estados Unidos para ser congelado, atendendo a pedido feito por ele antes de falecer. A decisão foi contestada por não haver documentos provando esse pedido. Entretanto, a filha mais nova apresentou 29 declarações no mesmo sentido, feitas por empregados próximos, enfermeiros, amigos e colegas de profissão do engenheiro. Eles confirmaram que seu desejo era ser congelado nos Estados Unidos. O Brasil ainda não oferece essa opção.
Os desembargadores se viram tendo que julgar os Embargos Infringentes entre o que diz a lei — ou seja, fazer o enterro ou a cremação, já que não havia prova cabal expressa em contrário —, ou atender a vontade de um morto, manifestada por sua filha, sem que ele tenha deixado em um testamento sua vontade de se submeter à criogenia. Os votos foram longos, extensos, com reflexões sobre religião e filosofia.
O relator entendeu que a procuração registrada em cartório apresentada pela filha mais nova serviria apenas para efeitos civis, e não para manifestação da vontade do representado após sua morte. O documento foi feito, perante escrivão, em um hospital, após o engenheiro sofrer um Acidente Vascular Cerebral (AVC), vindo, posteriormente, a morrer. “Se não houver uma emissão expressa de vontade, a nossa legislação diz que a regra é o sepultamento. Até para haver cremação é necessário deixar registrado em cartório de notas esse desejo”, ressaltou o desembargador.
A advogada da caçula, Renata Mansur, argumentou no tribunal que as declarações de pessoas que estiveram até o último momento ao lado do engenheiro e o ouviram expressar essa vontade devem ser consideradas como provas de seu desejo. “Em Direito Sucessório, as declarações podem ser válidas contra as provas legais, escritas. O Direito é dinâmico”, disse.
Ela defendeu a tese de que, por analogia, utilizando a Lei de Introdução ao Código Civil, essa nova forma de “sepultamento” deve ser levantada para julgamento. Ela prometeu levar o caso até o STJ e o STF, se necessário, para que a vontade do morto seja atendida.
Já o advogado das irmãs mais velhas ressaltou que o assunto histórico poderá, sim, chegar ao STJ e ao STF, mas para que o pai delas seja sepultado convenionalmente, em cemitério. “Há ainda a possibilidade de Embargos de Declaração, para que fiquem esclarecidas todas as questões que eventualmente não tenham ficado manifestamente claras sobre o assunto. Vamos aguardar a publicação do acórdão”, disse o advogado Rodrigo Crespo.
O relator foi acompanhado em seu voto pelo revisor, André Emilio Ribeiro Von Melentovytch, e pelo desembargador Luciano Saboia Rinaldi de Carvalho. Já os votos vencidos foram proferidos pelos juizes André Andrade e Cláudio Brandão.
Fonte: Conjur