Sérgio Marinho Falcão, quando Juiz de Direito da 2ª Vara de Família da Comarca do Recife, ofereceu importante reflexão sobre a adoção do nome de família do cônjuge, pelo casamento. O tema posto em questão aparenta singeleza mas o tratamento a seu respeito ganha especial relevo, por não ser amplamente conhecido pelos nubentes, como destinatários da ordem jurídica.
Disse ele, em estudo da questão: "O Código Civil, em seu art.1.565, º 1º, assegura o direito a qualquer dos cônjuges a, pelo casamento, acrescer ao seu o sobrenome do outro. Todavia, ante a redação dada ao texto legal, dois aspectos são carecedores de uma reflexão amiúde, a saber: (i) poderiam os cônjuges, cada um acrescer aos seus, o nome de família do outro, ou a apenas a um deles resta garantido esse direito? (ii) para efetivarem essa opção, seria necessário suprimir dos seus, o matronímico, como soe acontecer em nosso País?
Entendemos, em relação à primeira questão, ser perfeitamente viável que ambos os nubentes adotem, cada um, o nome de família do outro, posto que não há qualquer dispositivo na lei que contrarie ou proíba tal posicionamento. E no respeitante à segunda, nenhum dispositivo legal prevê a supressão do matronímico, haja vista que a lei refere a acrescer, ou seja, adotar, tão-somente".
De saída, entenda-se para uma melhor compreensão conceitual o significado de "matronímico". O vocábulo, oriundo do latim "mater" ("mãe") e do grego antigo "?íïìá" ("nome") e um nome ou apelido de família ("sobrenome"), cuja origem-se encontra-se no nome da mãe ou de um ancestral do genero feminino. É, pois, o nome da mãe. Fácil observar, daí, que a mulher ao casar e em adquirindo os apelidos do marido, por acréscimo (como faculdade ditada pelo parágrafo 1º do artigo 1.565 do Código Civil) ao tempo desse novo momento registral, suprime ao seu nome como mulher casada, o matronimico de origem, correspondendo à sua ascendência linear materna; mantendo apenas os sinais da família de origem paternal.
Outro fato tem o mesmo cariz, quando o genitor ao dar a registro o nascimento do filho, contempla apenas seu patrinomíco, sem aditar ao nome do infante o matronimico correspondente, nos assentamentos de origem. Bem é certo observar quantas pessoas se acham registradas, sem menção aos apelidos de família de sua geratriz, ou seja, à sua origem familiar materna, com prejuizo notável à sua perfeita identidade pessoal e aos estudos genealogicos.
As diretivas de reflexão apostas por aquele magistrado continuam muito presenciais na jurisprudência. No caso, cumpre considera-las, com os destaques seguintes: (i) O acréscimo recíproco dos apelidos conjugais, como permuta nominal dos patronimicos, exsurge como um problema de segurança jurídica, em multiplos aspectos. Imagine-se o cônjuge varão casar sucessivas vezes, adquirindo com essa opção diferentes identidades ao longo de sua existência.
(ii) a manutenção dos matronímicos ou a sua inclusão posterior, sem prazo decadencial, é saudável, para além de constituir inequívoco direito da personalidade. Acórdão paradigmático, de extrema valia, indica a um só tempo, duas situações relevantes: (a) o direito de acréscimo quando do registro do nascimento apenas o sobrenome do pai havia sido registrado e, (b) mais ainda, tornar admissível a alteração no registro de nascimento do filho para a averbação do nome de sua mãe que, após a separação judicial, voltou a usar o nome de solteira; o que para tanto, devem ser preenchidos dois requisitos: (i) justo motivo; (ii) inexistência de prejuízos para terceiros.(STJ. — 3ª Turma – REsp 1.069.864/DF. Rel. Min. Nancy Andrighi, DJe 03/02/2009).
Aliás, a inclusão do sobrenome materno omitido no assento não implica em alteração do nome, apenas suprimento; a tanto instruído o pedido nos termos do 109 Lei nº 6.015/1973 (Lei de Registros Públicos). No mais, o suporte legal está no art. 56, da reportada lei registral.
Mas não é só. Podem ser perspectivadas, verdades axiomáticas, embora sem aplicação prática: (i) Inexiste obrigatoriedade legal de o apelido final, na composição do nome, pertencer ao genitor, como de costume. Nada impede que o sobrenome materno (matronímico) venha por último, quando do registro de nascimento, a exemplo da tradição das sociedades culturalmente matrilineares. (ii) não é vedada solução bastante criativa: filhos terão ao final o patronímico (nome do pai); filhas, por sua vez, o matronímico pertencente à mãe (iii) O matronímico deve acompanhar a nubente, como vinculo parental matrilinear indelével. Cumpre pensar, pois, que o matronímico é o santuário onde a pessoa pode ali celebrar a sua própria gênese.
JONES FIGUEIRÊDO ALVES — O autor do artigo é desembargador decano do Tribunal de Justiça de Pernambuco. Diretor nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), onde coordena a Comissão de Magistratura de Família
Fonte: Jornal Diário de Pernambuco – PE