Agosto: o mês dos divórcios no Brasil

Mês do cachorro louco. Mês do desgosto, do mau agouro. Às muitas famas negativas do oitavo mês do ano soma-se uma nova e inusitada: agosto é o mês campeão em divórcios no País, como mostram dados do Colégio Notarial do Brasil – obtidos com exclusividade pelo Estado.


A diferença não é pouca. Desde 2007, quando os divórcios consensuais passaram a ser feitos em cartório, foram 40.017 separações formalizadas neste mês – ante 33.978 do mês de janeiro, com o menor índice de tal ocorrência. Considerando dados apenas do Estado de São Paulo, a discrepância é ainda maior: 11.606 divórcios registrados em agosto, ante 7.900 em janeiro.

 

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“Podemos levantar hipóteses. Agosto é uma ‘planície’: está longe de datas comemorativas importantes para a família, como Natal”, afirma o psicólogo especializado em relacionamentos Ailton Amélio da Silva, professor da Universidade de São Paulo (USP). Ele também acredita em uma espécie de “ressaca” do Dia dos Namorados. “Observo em minha clínica um agravamento de problemas de relacionamento após o 12 de junho”, diz ele. A explicação estaria na imagem de “amor ideal e perfeito” vendida pela mídia: quem já não está lá muito bem com o seu par, tende a reavaliar duramente a situação após a data. “O que culminaria em um divórcio, em alguns casos, pouco tempo depois”, afirma Silva.

 

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“Não pensei muito sobre o mês”, diz a médica dermatologista Carolina (que pediu para omitir o sobrenome), de 38 anos, que se divorciou em agosto de 2014 após 11 anos casada. “Separei-me porque tinha sido traída.” O ânimo para o recomeço veio em seguida. Carolina resolveu fazer uma festa. “Gostei da proposta”, conta. “Divertir-se em um momento triste, virar a página e bola pra frente. Deixar a alegria fluir e não se sentir tão mal com tudo.”

 

Bem-separados. A empresária Meg Sousa, de 35 anos, teve a ideia de se tornar organizadora de festas de divórcio em 2009. Ela estava se separando do marido e, pela internet, viu que comemorações do tipo já aconteciam nos Estados Unidos, no Canadá e no Japão. “Pensei: por que não? Foi muito bom eu ter casado, mas não deu certo. Achei que era importante dar uma ideia de recomeço para minha vida”, conta ela.

 

Até o ex foi convidado – mas desistiu da presença em cima da hora. Deu tão certo que Meg passou a ser procurada por amigas e, depois, outras pessoas na mesma situação. Fez do limão a limonada – ou melhor, a caipirinha e todos os outros bons drinques. No papel de organizadora de festas de divórcio, tem realizado cerca de 35 por ano (todas as fotos que ilustram este post são de eventos do tipo). “Há festas para todos os perfis, mas as menores, mais intimistas e apenas para familiares e amigos próximos, costumam custar a partir de R$ 6 mil”, diz.


O “descasamento” é completo. Com direito a bolo (com “noivinhos” de costas um para o outro, ou com a recém-separada na companhia de um gogo boy) e bem-separados (sim, a réplica divorciada do clássico docinho bem-casado).

 

E por que as separações são oficializadas mais em agosto? “Difícil arriscar uma resposta”, diz. “Mas talvez seja porque logo está chegando a primavera e o verão. Com as temperaturas mais quentes, o instinto de paquera aumenta. Se já há uma crise no casamento, deve ser o momento para resolver de uma vez, para que ambos possam passar o verão livres e soltos.”

 

Do outro lado do balcão, os cartorários também ficam intrigados. “Não vamos ousar analisar mas, brincando entre a gente, comentamos que deve ser consequência de quem pensa em resolver a crise com o ano-novo, naquele espírito de renovação. Passou o carnaval, não deu, tentou esperar mais um pouco, chegaram as férias de julho. Aí, se o problema do casal persiste, vem a separação”, diz o tabelião Andrey Guimarães Duarte, presidente da seção paulista do Colégio Notarial do Brasil. “Os números dão a entender que se trata de uma decisão que vem sendo maturada durante o ano e que deságua no início do segundo semestre.”
 

Os números do Colégio Notarial também mostram um aumento no número de divórcios consensuais a partir de 2007. O maior crescimento se deu entre 2009 e 2011, de 7.693 para 17.535 registros.


Há uma explicação. Em 2010, quando foram formalizados 13.701 divórcios em cartórios paulistas, entrou em vigor a Emenda Constitucional 66, que simplificou o procedimento. A medida passou a dispensar alguns requisitos antes exigidos, como a necessidade de que o casal contasse pelo menos dois anos de separação para poder oficializar o divórcio. “A conclusão a que chegamos é que havia uma interferência indevida da legislação na vida privada e íntima das pessoas”, diz Duarte.


Com o procedimento mais rápido – há casos em que um divórcio é formalizado em menos de 1 hora -, o Colégio Notarial percebeu que havia uma demanda reprimida. “Passamos a ser muito procurados por pessoas que já estavam separadas há coisa de 10, 15 anos, e nunca haviam formalizado. A agilidade do processo acabou incentivando a regularização dessas situações”, acredita o tabelião.

 

 

Fonte: Estadão