Artigo – Comentários sobre isenção de emolumentos – Por Nilo de Carvalho Nogueira Coelho

Por Nilo de Carvalho Nogueira Coelho: Oficial do Registro Civil das Pessoas Naturais – Parque Industrial – Contagem – MG

A Lei estadual Nº 19.414, de 2010, alterou alguns pontos da Lei Nº 15.424, de 2004 e, dentre eles, o artigo 20, que trata das isenções de emolumentos e da Taxa de Fiscalização Judiciária. Foram incluídas novas possibilidades de isenção, com alterações significativas no que toca ao Registro Civil das Pessoas Naturais. Estas alterações são o objeto desta análise.

A redação primitiva do artigo 20 dispunha:

Art. 20 – Fica isenta de emolumentos e da Taxa de Fiscalização Judiciária a prática de atos notariais e de registro para cumprimento de mandado e alvará judicial expedido em favor de beneficiário da justiça gratuita, amparado pela Lei Federal n.º 1.060, de 5 de fevereiro de 1950, e representado por Defensor Público Estadual ou advogado dativo designado nos termos da Lei n.º 13.166, de 20 de janeiro de 1999.

Parágrafo único – A concessão da isenção de que trata o caput fica condicionada à menção expressa da existência dos pressupostos nele exigidos no texto do respectivo mandado ou alvará judicial.

Com a publicação da Lei Nº 19.414, em 30 de dezembro de 2010, o artigo passou a ter a seguinte redação:

Art. 20 – Fica isenta de emolumentos e da Taxa de Fiscalização Judiciária a prática de atos notariais e de registro:
I – para cumprimento de mandado e alvará judicial expedido em favor de beneficiário da justiça gratuita, amparado pela Lei federal n° 1.060, de 5 de fevereiro de 1950, nos seguintes casos:
a) nos processos relativos a ações de investigação de paternidade e de pensão alimentícia;
b) nos termos do art. 6° da Lei federal n° 6.969, de 10 de dezembro de 1981;
c) nos termos do § 2° do art. 12 da Lei federal n° 10.257, de 10 de julho de 2001;
d) quando a parte for representada por Defensor Público Estadual ou advogado dativo designado nos termos da Lei n° 13.166, de 20 de janeiro de 1999;
e) quando a parte não estiver assistida por advogado, nos processos de competência dos juizados especiais de que tratam as Leis federais nos 9.099, de 26 de setembro de 1995, e 10.259, de 12 de julho de 2001;

II – de penhora ou arresto, nos termos do inciso IV do art. 7° da Lei federal n° 6.830, de 22 de setembro de 1980;

III – de escritura e registro de casa própria de até 60m² (sessenta metros quadrados) de área construída em terreno de até 250m² (duzentos e cinquenta metros quadrados), quando vinculada a programa habitacional federal, estadual ou municipal destinado a pessoa de baixa renda, com participação do poder público;

IV – de interesse da União, nos termos do Decreto-Lei federal n° 1.537, de 13 de abril de 1977;

V – de autenticação de documentos e de registro de atos constitutivos, inclusive alterações, de entidade de assistência social assim reconhecida pelo Conselho Municipal de Assistência Social ou Conselho Estadual de Assistência Social, nos termos da Lei n° 12.262, de 23 de julho de 1996, observado o disposto no § 3° deste artigo;

VI – a que se referem os incisos I e II do art. 290-A da Lei federal n° 6.015, de 31 de dezembro de 1973;

VII – a que se refere o § 3° do art. 1.124-A da Lei federal n° 5.869, de 11 de janeiro de 1973, que institui o Código de Processo Civil.

§ 1° – A concessão da isenção de que trata o inciso I do "caput" deste artigo fica condicionada a pedido formulado pela parte perante o oficial, no qual conste a sua expressa declaração de que é pobre no sentido legal e de que não pagou honorários advocatícios, para fins de comprovação junto ao Fisco Estadual, e, na hipótese de constatação da improcedência da situação de pobreza, poderá o notário ou registrador exigir da parte o pagamento dos emolumentos e da Taxa de Fiscalização Judiciária correspondentes.

§ 2° – A isenção a que se refere o inciso III do "caput" deste artigo aplica-se às legitimações de terras devolutas, quando efetuadas pelo Instituto de Terras do Estado de Minas Gerais, em cumprimento à Lei n° 7.373, de 3 de outubro de 1978.

§ 3° – A isenção a que se refere o inciso V do "caput" deste artigo destina-se às entidades que efetivamente prestam serviços de assistência social no cumprimento dos objetivos previstos nos incisos I a V do art. 3° da Lei n° 12.262, de 1996, não se aplicando às entidades mantenedoras cujas sedes funcionem apenas como escritório administrativo, sem atuar diretamente na área da assistência social.(NR)

Do confronto entre as duas redações, percebe-se que o legislador detalhou os casos de isenção, que antes era disposto de uma forma genérica aos beneficiários da justiça gratuita amparados pela Lei Nº 1.060, de 1950, desde que assistidos por defensor público ou advogado dativo, designado nos termos da Lei Nº 13.166, de 1999. Não havia previsão de isenção se a parte fosse assistida por advogado particular ou advogados de determinadas instituições como as prefeituras, câmaras de vereadores, faculdades de direito, sindicatos, organizações não-governamentais, etc.

Agora, em se tratando de ações de investigação de paternidade ou de pensão alimentícia, não se cogita mais inquirir o tipo de assistência, se defensor público/advogado dativo ou advogado particular (Art, 20, I, “a”). No entanto, a distinção persiste para os atos notariais e de registro em se tratando das demais ações, ou seja, ações de divórcio, reconhecimento de filhos, retificações diversas, etc. (Art, 20, I, “d”).

Este entendimento decorre das regras de interpretação das normas legais, especialmente em se tratando de direito tributário, pois qual teria sido a intenção do legislador em destacar o defensor público e o advogado dativo na redação anterior do art. 20 e na atual, na alínea “d” do inciso “I”? Como se sabe, não existem palavras inúteis em leis. Se determinadas palavras foram inseridas no texto legal é porque elas têm uma razão de estar ali. E, neste caso, a razão só pode ser uma: destacar as causas patrocinadas pelo defensor público e pelo advogado dativo, causas estas nas quais não há pagamento de honorários advocatícios por parte do assistido, daquelas outras patrocinadas por advogado particular.

Deve-se atentar, ainda, para o fato de que os atos notariais e de registro são custeados pelos emolumentos, ou seja, a regra é que esses atos sejam pagos; a isenção de emolumentos e, em conseqüência, da Taxa de Fiscalização Judiciária, é exceção. E, como tal, deve ter um tratamento restritivo.

A Constituição Federal, em seu Art. 150, § 6º, dispõe:

§ 6.º Qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155, § 2.º, XII, g.

Assim, nos expressos termos da norma citada, somente o ente federado a quem compete a cobrança de determinado tributo tem competência para conceder isenções sobre taxas “suas”, no caso, os emolumentos e a Taxa de Fiscalização Judiciária. Aliás, é expressamente vedado à União dar isenção de tributo estadual, conforme consta no Art. 151, III, o que torna inconstitucional a norma do § 2º do Art. 982, do CPC, que concede isenção de emolumentos às escrituras de inventário para quem se declarar pobre:

Art. 982.  Havendo testamento ou interessado incapaz, proceder-se-á ao inventário judicial; se todos forem capazes e concordes, poderá fazer-se o inventário e a partilha por escritura pública, a qual constituirá título hábil para o registro imobiliário.

§ 1º  O tabelião somente lavrará a escritura pública se todas as partes interessadas estiverem assistidas por advogado comum ou advogados de cada uma delas ou por defensor público, cuja qualificação e assinatura constarão do ato notarial.
§ 2º  A escritura e demais atos notariais serão gratuitos àqueles que se declararem pobres sob as penas da lei.

Ainda analisando a nova redação segundo as regras de interpretação, o próprio CTN indica impossibilidade de ampliação dos casos de isenção de emolumentos e da TFJ. Especificamente, o Art. 111 dispõe:

Art. 111. Interpreta-se literalmente a legislação tributária que disponha sobre:
I – (…)
II- outorga de isenção.

Esta norma fecha definitivamente as portas a uma interpretação extensiva, capaz de, por exemplo, admitir que as partes assistidas por advogado particular (ou aquele vinculado às diversas instituições mencionadas no início deste comentário) nas diversas ações, excepcionando-se as de investigação de paternidade e pensão alimentícia, possam receber o benefício das isenções dos emolumentos e da TFJ.

Outro aspecto que precisa ser considerado é que na redação anterior do Art. 20, em seu parágrafo único, ficava expresso que o atendimento da condição para obtenção da isenção de emolumentos e da TFJ deveria constar do próprio mandado: “A concessão da isenção de que trata o caput fica condicionada à menção expressa da existência dos pressupostos nele exigidos no texto do respectivo mandado ou alvará judicial.”

Com a redação atual, esta condição foi deslocada da atuação judicial. Agora, não é mais o juiz que deve fazer constar do mandado ou do alvará a existência dos pressupostos para a obtenção das isenções. Nos termos do parágrafo primeiro do ‘novo’ artigo 20, a concessão da isenção “fica condicionada a pedido formulado pela parte perante o oficial, no qual conste a sua expressa declaração de que é pobre no sentido legal e de que não pagou honorários advocatícios”.

Como se vê, foi atribuída à parte requerente do serviço notarial ou de registro a obrigação de declarar, perante o oficial, a pobreza e declarar que não pagou honorários advocatícios. Isto indica que se a parte contratou advogado particular e pagou a ele honorários, ainda que tenha obtido a assistência judiciária ela não faz juz à concessão da isenção de que trata o inciso I do "caput" do artigo 20.

No entanto, uma situação muito comum nesses casos de concessão de assistência judiciária a pessoas que contrataram advogados particulares, com pagamento de honorários, é a determinação judicial para que os atos de registros sejam feitos com isenção de emolumentos e da TFJ. E isto é feito por alguns juízes que entendem como inconstitucional o art. 20 da Lei mineira de emolumentos, seguindo orientação da Corregedoria-Geral de Justiça expressa no Aviso Nº 42, de 2005. Por este documento, a CGJ recomenda aos juízes que, no caso concreto, se entenderem como inconstitucional as disposições do art. 20, que façam constar esse entendimento, de forma expressa, nos mandados e alvarás, para que a parte obtenha a isenção no momento do ato registral. Desta forma, não há como o Oficial exigir o pagamento dos emolumentos e da TFJ, e nem pode ele ser cobrado pela SEF pelo não-repasse dos valores ao Tesouro estadual.

De todo o exposto, conclui-se que o legislador foi bem seletivo na concessão de isenção de emolumentos e da TFJ. Assim, pode-se estabelecer que as condições para o atendimento das isenções no tocante ao Registro Civil das Pessoas Naturais são as seguintes:

1 – referência expressa no mandado ou na sentença que acompanhar o mandado da concessão do benefício da assistência judiciária, prevista na Lei Nº 1.060, de 1950;
2 – Ações judiciais em geral – A parte somente fará jus às isenções se tiver sido assistida por defensor público ou advogado dativo, nomeado nos termos da Lei estadual Nº 13.166, de 1999.
3 – Ações de investigação de paternidade e pensão alimentícia – mesmo tendo sido assistida por advogado particular, a parte faz jus às isenções;
4 – Ações em geral, com patrocínio de advogado particular – constando no mandado o entendimento do juiz de que as normas para concessão das isenções são inconstitucionais, o Oficial processará o pedido sem a cobrança dos emolumentos e da TFJ.