Discussão latente no cenário jurídico atual é a promulgação da Lei nº 11.441/07 e seus reflexos diretos no cotidiano das pessoas e dos próprios operadores do direito.
Nesse contexto, a inexistência de “vacatio legis” aliada à singeleza do texto legislativo obrigou tabeliães e advogados a tecerem uma série de debates para se averiguar as inúmeras situações que deveriam decorrer dos atos que a partir de então e a critério dos interessados não mais seriam jurisdicionais – leia-se, aqui, as separações, partilhas, divórcios e inventários quando as partes forem plenamente capazes e houver entre eles o indispensável consenso.
A despeito de todo esse debate, causou-me estranheza que às uniões estáveis dispensou-se (mais uma vez) tratamento diferenciado na medida que o legislador pátrio parece ter se esquecido de elencar tais situações dentre as quais estariam, a partir de então, sujeitas ao simplificado procedimento da lavratura de escritura pública, com vistas a se pôr termo final nestas uniões nos casos em que presente o consenso entre seus partícipes.
Acredito que a questão poderia ser dirimida – a exemplo do que ocorrera em outros tempos com a própria união estável – mediante a previsão do assunto em provimento regulamentador a ser expedido pelos Tribunais de Justiça dos Estados.
Entretanto, ao se verificar o Provimento nº 04/07 da Corregedoria Geral de Justiça do RS e o Provimento nº 01/2007 da Corregedoria Geral de Justiça de São Paulo constata-se que o assunto não é sequer mencionado – o que, por óbvio, está impossibilitando a ação dos tabeliães no tocante à dissolução destas uniões ainda que declaradamente amigáveis.
Poder-se-ia aqui indagar no sentido de que a desconstituição de uma união estável de forma consensual seria inócua tendo em vista que, não havendo litígio, não haverá qualquer problema para os conviventes que o término do relacionamento fique limitado a um acordo verbal.
Entretanto, a necessidade da declaração se dar de forma oficial (hoje pela declaração judicial e futuramente, quem sabe, através de simples Escritura Pública), além de ser um direito de todo e qualquer cidadão que se ache nesta situação, é salutar para que se tenha delimitado um marco final da união com vistas a resguardar o patrimônio dos conviventes que, a partir de então, poderão adquirir outros bens a título oneroso sem, contudo, ter de partilhá-los com o ex-convivente.
Neste norte, parece-me um grande equívoco não se fazer a dissolução das uniões estáveis junto aos tabelionatos. E acrescento: afora o fato de que no caso dos divórcios os tabeliães estão autorizados a colher testemunhos [1], os tabelionatos gaúchos hoje produzem em larga escala escrituras públicas em que os conviventes podem, à vista de simples declaração e sem a necessidade de se ouvir qualquer testemunha, constituir, formalmente e para todos os fins a existência de uma união estável (reconhecimento, portanto), podendo inclusive declarar que esta união já existe há tantos anos atrás (retroagindo no tempo, inclusive).
Ademais, se pela Lei nº 11.441/07 podem o mais (desconstituir casamentos) porque motivo não poderiam os tabeliães desconstituir um ato mais simples, menos formal e que foi constituído, na maioria das vezes, por eles mesmos ?
Acredito, portanto, ante a inexistência de impedimento legal que é somente questão de tempo para que o tema reste regulamentado, oportunidade em que, nos casos consensuais, as uniões estáveis poderão ser dissolvidas mediante a confecção de simples Escritura Pública nas mesmas condições expostas pela Lei 11.441/07.
(*) E.mail: marcelo@moraesadvogados.com
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[1] Conforme artigo 619-F da Consolidação Normativa Notarial e Registral introduzido pelo Provimento 04/07-CGJ
Fonte: Espaço Vital