Apesar da clareza dos artigos de lei que tratam da matéria, não há ainda uma posição pacífica com referência ao real direito do cônjuge.
Com frequência somos questionados sobre as peculiaridades do regime de separação de bens, o que ocorre, na maioria das vezes, em razão da separação obrigatória de bens, cujas regras são impostas pelo artigo 1.641 do CC, que tornou obrigatório o regime de separação de bens no casamento de pessoa maior de setenta anos, bem como para todos os que dependerem, para casar, de suprimento judicial, entendendo neste caso, aquelas pessoas não emancipadas e menores de 18 anos, observando exclusivamente, neste último caso, que quando os cônjuges ou cônjuge atingir a maioridade, pode alterar o regime de separação obrigatória de bens.
Além da separação obrigatória, prevê o mesmo ordenamento jurídico, a separação convencional, ou seja, a possibilidade do casal escolher o regime de separação total de bens no momento do casamento, mediante a realização de um pacto antenupcial optando por esse regime, sendo que o pacto deverá ser feito em cartório, onde os nubentes devem estabelecer que os bens são incomunicáveis, além de outras tratativas consideradas importantes para o casal com referência aos seus respectivos bens e suas aquisições futuras.
Em ambos os casos, ou seja, na separação obrigatória de bens e na separação convencional de bens, a maior dúvida surge com referência à divisão de bens nos casos de divórcio e sucessão.
No regime de separação obrigatória de bens, também chamada de separação legal de bens, em caso de divórcio, deve ser levado em consideração a regra pacificada pela Súmula 377 do STF, que diz: "No regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento", ou seja, os bens adquiridos durante a união devem ser divididos pelos cônjuges em caso de divórcio, aqueles adquiridos antes da união, pertencem exclusivamente àquele que o adquiriu. Há outros julgados, no entanto, que entendem que para que ocorra a divisão, deve ser provado o esforço comum, caso que deve ser proposta ação judicial para provar e requerer a divisão, cuja decisão final depende exclusivamente do Judiciário, e pelo que se vê, depende também da realidade de cada caso concreto.
No caso de falecimento de qualquer um dos cônjuges, em regime de separação obrigatória de bens, caso haja descendentes, o cônjuge sobrevivente não será considerado herdeiro. Porém, caso o falecido deixe apenas ascendentes, o cônjuge sobrevivente terá direito à herança, na mesma proporção que os ascendentes. Caso o falecido não deixe nem descendentes e ascendentes, o cônjuge sobrevivente receberá a herança em sua totalidade. Tais regras, contudo, também são objeto de discussões judiciais, inclusive considerando o posicionamento da citada súmula 377 do STF, que embora destinada a casos de divórcio, também está sendo interpretada para discussões sobre sucessão.
Já no regime de separação convencional de bens, em caso de divórcio, não há divisão de bens, cada um dos cônjuges permanece com os seus respectivos bens. No falecimento de qualquer um dos cônjuges, caso tenham descendentes, o cônjuge sobrevivente concorrerá com esses ao seu quinhão na herança. (artigo 1829 do CC). Caso não tenham descendentes, o cônjuge sobrevivente, concorrerá com os ascendentes, conforme determinam os artigos 1.836 e 1.837 do CC, e caso não hajam descendentes ou ascendentes, o cônjuge sobrevivente herdará a totalidade da herança, independente do regime estabelecido.
É importante que se lembre da existência de uma corrente jurisprudencial entendendo que em razão da existência do pacto antenupcial, que declara a vontade das partes com referência a separação total de bens, o cônjuge não seria herdeiro em hipótese alguma, sendo essa uma discussão que também dependeria de discussão judicial, caso a parte interessada recorra ao Judiciário.
Também não se pode esquecer, e nesse caso não há muito o que se discutir judicialmente, que é garantido ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja o regime de bens, e sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito real de habitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família, desde que seja o único daquela natureza a inventariar, conforme preceitua o artigo 1.831 do CC.
Diante das peculiaridades acima levantadas, verificamos que apesar da clareza dos artigos de lei que tratam da matéria, não há ainda uma posição pacífica com referência ao real direito do cônjuge em caso de divórcio ou de falecimento do seu consorte, em ambos os regimes de separação de bens, pois o Judiciário, caso buscado pelas partes interessadas, acabará aplicando a lei de acordo com a interpretação que tiver de cada caso concreto.
Jane Resina F. de Oliveira é advogada do escritório Resina & Marcon Advogados Associados e mestre pela UnB – Universidade de Brasília. Possui MBA em Gestão Empresarial/FGV-RJ e MBA Internacional em Gestão Empresarial na Ohio University.
Fonte: Migalhas