Dilvanir José da Costa, Professor e doutor em direito civil (UFMG) Merecem destaque, no texto constitucional e seu regulamento no Código Civil, o conceito, os requisitos e efeitos da união estável e seu cotejo com o casamento, o concubinato e a união homossexual. Quanto à forma, o casamento é formal: além do consentimento manifestado perante o juiz, representante do Estado, e da proclamação daquele, deve o mesmo ser inscrito no registro público. A união estável admite todas as formas de constituição tendentes a demonstrar seus requisitos, desde fatos e circunstâncias até o contrato verbal ou escrito, particular ou público, inclusive o casamento religioso sem efeitos civis. Quanto à prova, a Certidão do Registro Civil faz prova plena e imediata do casamento civil, do casamento religioso inscrito no registro público e da união estável convertida em casamento e inscrita naquele registro. Já a união estável sem conversão, se contestada, sua existência dependerá de prova em ação própria e sentença, ainda que resulte de escritura pública. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) admitiu essa prova em instrução sumária, na ação cautelar de alimentos provisionais (REsp. 186.013-SP, 4ª T, unânime, RT 825/178).
São requisitos da união estável: a) a união entre o homem e a mulher (entre dois homens ou duas mulheres poderá existir contrato de trabalho, prestação de serviço, empreitada, sociedade de fato ou de direito, com efeitos obrigacionais ou patrimoniais apenas, sem direito a alimentos e herança, salvo por contrato ou testamento); b) convivência pública, contínua e duradoura, estabelecida com o objetivo de constituir família, independentemente de prazo definido ou limitado em lei. Não o será se com objetivo outro, como trabalho subordinado, serviço autônomo ou sociedade. Na união estável ocorrem os impedimentos do casamento, pelas mesmas razões éticas e eugênicas. Não obstante, embora casados, os separados de fato ou de direito podem constituir união estável. Isso demonstra que o próprio casamento pode decair de seu status legal, se lhe faltar o requisito da convivência ou espírito de casado. Não se constitui união estável em concorrência com o casamento sem separação de fato ou de direito. Meras causas suspensivas (artigo 1.523) não impedirão a união estável.
Quanto aos efeitos, além do respeito e assistência moral, os companheiros estão sujeitos aos deveres máximos dos cônjuges no casamento, sobretudo a fidelidade e os alimentos. Sua infração enseja as ações cabíveis, inclusive para a dissolução da união estável, por iniciativa do companheiro inocente. Quanto a herança, os companheiros sofrem as restrições do artigo 1.790 do Código Civil: “A companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, nas condições seguintes…” (Grifamos). Os bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável são, em regra, comuns, por efeito da sociedade e em razão do regime legal da comunhão parcial entre os companheiros (artigo 1.725). Outro é o direito de herança, que, segundo o artigo 1.790, incide sobre a meação do companheiro morto, nos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável. Tudo a depender ainda da existência de outro regime escrito de bens entre os companheiros. Pode até ocorrer que esses bens sejam produto de sub-rogação de bens exclusivos de um deles, pelo que não incidiria o direito de herança do outro. Podem ainda contratar, por escrito, o regime da comunhão universal ou da separação total. Faltando a convenção escrita, vigora a comunhão parcial ou dos aquestos (artigo 1.725).
A conversão da união estável em casamento exige três requisitos: a) ausência de impedimentos legais; b) pedido dos companheiros ao juiz de casamentos; c) assento no registro civil. Assim, surge o casamento formal, de prova plena e com todos os efeitos legais (1.726), inclusive o mesmo direito de herança atribuído aos cônjuges. As relações sexuais estáveis ou contínuas, ainda que exclusivas, entre o homem e a mulher impedidos de casar, constituem concubinato (1.727). Logo, não caracterizam união estável. Só geram efeitos patrimoniais e obrigacionais a serem comprovados, sem amparo do direito de família e das sucessões. O mesmo ocorre com as uniões entre pessoas do mesmo sexo. Alimentos e herança entre os mesmos dependem de convenção ou testamento. As leis restritivas de direitos não comportam aplicação extensiva ou analógica, tanto mais quando as restrições têm suporte nos bons costumes, amparados pelo artigo 17, parte final, da Lei de Introdução ao Código Civil. Essas uniões ainda chocam e até provocam gracejo e repulsa na própria família e no círculo social. A união estável há de ser entre o homem e a mulher (CF, artigo 226, parágrafo 3º). Seu caráter constitucional e de ordem pública não admite interpretação extensiva e muito menos aplicação analógica.
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