Uma forma de se evitarem as conhecidas brigas de herdeiros é a divisão dos bens do casal em vida, fazendo-se uma doação de bens como antecipação de legítima
Domingos Xavier Teixeira – Advogado e contador, presidente do Instituto de Direito de Empresa, professor da PUC Minas, diretor da Teixeira e Advogados Associados
Todos nós conhecemos o velho ditado sobre casamento: no início “meu bem para lá”, “meu bem para cá” e, depois de algum tempo, com a discórdia entre o casal, tudo muda para “os meus bens para cá” e o “resto para lá”. E fica difícil, o diálogo acaba e o casal tem que recorrer a um juiz para resolver o que os dois não conseguiram. É para evitar mais discórdias que o planejamento sucessório deve ser elaborado, mesmo antes do casamento.
Começa-se pela escolha do regime de matrimônio. Hoje, o mais usual é o da comunhão parcial de bens, que consiste no compartilhamento de todos os bens e rendimentos adquiridos depois do casamento, mantendo-se a propriedade dos bens que cada um possuía antes do matrimônio. Pode-se também optar pelo regime da comunhão universal de bens, consistente na sociedade de todos os bens existentes antes depois do casamento ou pela separação total dos bens, em que cada um fica somente com o que lhe pertencer. Outro regime, não usual, é o da participação final dos aquestos.
Escolhido o regime de bens, é importante planejar o dia-a-dia de suas vidas. Por exemplo, se o casal é formado por médicos, ou por qualquer outro tipo de profissional liberal, pode-se reduzir o custo do Imposto de Renda de 27,5%, que é pago por pessoa física, para 11,5% sobre todos os ganhos, pagando-se todos os tributos federais. Basta para tal criar uma clínica.
Outra forma de reduzir os tributos da empresa – custo total de 6,73% sobre a receita, e pagar apenas 5,5% – é transferir para a pessoa física todos os bens produtivos da área rural do casal, em vez de mantê-los em uma empresa. Essas e outras alternativas, todas lícitas e permitidas por lei, podem ser implementadas, gerando ganho tributário muitas vezes grande para o casal, pela economia tributária. Isto é o que os advogados tributaristas chamam de “planejamento tributário”.
Outras sugestões são importantes. O casal deve, por exemplo, conhecer e participar da administração dos bens comuns, não a deixando somente para um deles, como quase sempre ocorre. É muito confortável para aquele que não se envolve e não participa dos problemas do dia-a-dia da administração dos bens, mas a experiência mostra que esta atitude pode trazer inúmeros prejuízos.
Esse descuido de uma das partes para com o patrimônio viabiliza as diversas fraudes em separações de que se tem notícia. Portanto, é importante que o casal esteja a par dos ganhos e da evolução dos bens do casal e participe de sua administração. Também é importante advertir cada cônjuge que é sempre necessário e importante ler e entender tudo o que vai assinar. Se não conhecer do assunto, o melhor é consultar um especialista. Não é desconfiança, mas a precaução sempre é recomendável. É bom dizer que mulheres e homens têm evoluído muito neste sentido, mas não ainda o suficiente.
Outra fase importante da vida do casal é a preparação para a sucessão. Uma forma de se evitarem as conhecidas brigas de herdeiros é a divisão dos bens do casal em vida, fazendo-se uma doação de bens como antecipação de legítima. Mas é importante não se esquecer de manter para o casal o usufruto dos bens, isto é, a administração dos bens e todos os seus rendimentos, que continuarão a pertencer aos doadores até a morte.
Eles apenas não poderão vender o patrimônio. O usufruto é uma figura importante do direito, que assegura a qualidade de vida do doador, que não ficará à mercê da vontade do donatário. Se os bens forem constituídos por empresas, pode-se fazer um arranjo societário criando-se, por exemplo, uma empresa para cada filho e nela colocando os bens a serem doados. O direito societário traz inúmeras alternativas neste sentido. Assim, far-se-á a doação apenas de cotas.
No caso da doação, é importante mencionar que existe a antecipação de um imposto devido ao estado, chamado de ITCD, que, de qualquer forma, será pago na transferência da herança pela morte e cuja alíquota varia de estado para estado. Em Minas Gerais é de 5% sobre o valor de mercado dos bens doados. Se o casal deseja manter com a família alguns bens, basta que a doação seja com a cláusula de inalienabilidade; ou se deseja que dos bens doados não participe o outro cônjuge, basta fazê-la com a cláusula de incomunicabilidade, ou finalmente, se quer evitar que o herdeiro coloque em risco o bem doado, basta que a doação tenha a cláusula de impenhorabilidade.
Finalmente, se o casal acha que deve retribuir a um ente querido um favor ou lhe deixar um benefício, por exemplo, para um sobrinho, basta fazer um testamento deixando-lhe parte dos bens, lembrando que somente pode ser testada a parcela disponível do casal, consistente na metade dos bens de cada cônjuge. Ou pode ser feito um conjugamento de doação com testamento.
Para o planejamento do dia-a-dia antes do casamento, durante o mesmo, ou a preparação para a sucessão, dois aspectos devem ser monitorados pelo casal: o primeiro é a forma de fazê-lo, seja na pessoa física ou por meio da criação de empresa. E segundo, associar a esse planejamento um estudo dos efeitos tributários em cada caso, que pode gerar ganhos ou mesmo evitar fazer transações erradas que podem gerar contingências futuras ou mesmo dívidas tributárias. Portanto, a recomendação é simples: consulte um advogado tributarista. Vale a pena.
Fonte: Jornal Estado de Minas – Caderno Direito e Justiça