Asterisco substitui o nome paterno em certidões de nascimento de filhos que não foram reconhecidos por seus pais.
Os dias que antecedem o segundo domingo de agosto são sempre difíceis para Priscila dos Santos, 27. Até os 23 ela não conhecia o pai. Há quatro anos, chegou a ter um contato, mas a relação foi esfriando sem que ela realizasse seu maior sonho.
“Sinto falta é de não ter o nome do meu pai em meus documentos. É o que mais magoa. Ninguém nasce de chocadeira. Não sou filha de um asterisco, como aparece na minha certidão de nascimento.”
Ainda que não se saiba exatamente a dimensão do problema, não são poucas as crianças que nascem no Brasil sem o direito de saber quem é seu pai.
Levantamentos realizados em algumas cidades mostraram que em pelo menos 10% das certidões não constavam o registro paterno. Especialistas estimam que, em todo o país, o percentual varie de 15% a 25%.
No caso de Priscila, sua mãe, Ildenaura dos Santos, 57, nunca havia se preocupado seriamente com o fato de a filha não conhecer o pai. Professora aposentada em Pernambuco, Ildenaura começou a perceber que, com a proximidade do Dia dos Pais, sua filha ficava mais triste. Até que decidiu perguntar se gostaria de procurar o pai. A busca não foi difícil e, num primeiro momento, tudo parecia caminhar bem. “De repente, começou a ficar mais frio. Até que resolvi ligar para ele. Uma mulher atendeu e me tratou muito mal. Desde então, parei de insistir”, diz Priscila.
Histórias como essa levaram a cineasta Susanna Lira a realizar um documentário sobre filhos em busca dos pais. Ainda em produção, a obra deverá ser exibida no próximo ano com o título “Nada Sobre Meu Pai”, uma referência ao filme “Tudo Sobre Minha Mãe”, do espanhol Pedro Almodóvar.
Um dos depoimentos mais emocionantes do filme é do corretor de imóveis José Ingo. Aos 50 anos, ele não titubeou quando sua mãe lhe perguntou qual presente gostaria: “Quero o nome de meu pai”. A mãe atendeu ao pedido, e Ingo iniciou a busca, mas descobriu que ele já estava morto. Foi, no entanto, muito bem recebido pelos irmãos, pois o pai alertara a todos que desconfiava ter um filho que nunca o procurara.
Ingo fez questão de trocar todos os documentos para que constasse a filiação completa. A própria Susanna nunca conheceu o pai. Sua mãe namorou um equatoriano que viveu na década de 70 no Brasil clandestinamente, por causa de atividades políticas. Ela conta que seu objetivo no filme é retratar a questão da paternidade de forma diferente. “Quero mostrar que nenhum tempo é demais para reatar laços afetivos.”
Esse medo de assumir responsabilidades quase afastou Vitória de Oliveira Carvalho, 4, de seu pai. A mãe, Patrícia Oliveira, conta que tentou fazer com que o ex-namorado assumisse a paternidade, chegando a ir à Justiça para exigir exame de DNA. O reconhecimento só aconteceu graças à interferência da atual mulher do pai. “Foi a mulher e a irmã que o convenceram. Este Dia dos Pais, ela passará com eles”, diz Patrícia.
Associação em PE ajuda quem busca reconhecimento
Por causa do preconceito que sofreu por ser mãe solteira e por ter tido que lutar para que o pai de seu filho o reconhecesse, Marli Márcia da Silva criou em 1992 a Apemas (Associação Pernambucana de Mães Solteiras). Desde então, a associação tem ajudado mães -e às vezes pais- no reconhecimento da paternidade.
Marli diz que o mais comum é o pai se recusar a reconhecer o filho, mas que muitas crianças ficam sem registro paterno também por burocracia ou opção das mães.
“Muitas vezes, o pai aceitava reconhecer, mas os cartórios cobravam taxas absurdas. Fizemos em 2006 uma campanha em que esse serviço era oferecido gratuitamente, e em uma semana 1.688 pais fizeram reconhecimento”, diz ela.
De acordo com Marli, o Tribunal de Justiça pernambucano conseguiu garantir a gratuidade em todo o Estado, o que tem contribuído para diminuir o número de registros sem a referência ao pai.
Pesquisas sobre paternidade são escassas
Estudo aponta que maioria dos órgãos não acompanha casos de letalidade policial.
A maioria das ouvidorias de polícia do país não acompanha de perto os casos de pessoas mortas pela própria polícia. Pesquisa feita pelo Núcleo de Estudos da Violência da USP mostra que boa parte dos órgãos serve apenas como uma espécie de “balcão de reclamações” da população. Apontadas como um dos principais órgãos de controle externo das ações policiais, as ouvidorias contam com poucos e mal treinados funcionários. As ouvidorias não têm orçamento próprio e também não têm poder para nomear seus funcionários.
O estudo, encomendado pela Sedh (Secretaria Especial de Direitos Humanos), vinculada à Presidência da República, foi feito com as 14 ouvidorias de polícia que existiam até 2007 -atualmente são pelo menos 17 em todo o país.
O diagnóstico foi a base para a criação de um manual para acompanhamento da letalidade policial, distribuído às ouvidorias de polícia.
A pesquisa aponta que em só três Estados (São Paulo, Minas e Pará), as ouvidorias são informadas automaticamente de cada morte cometida por policial.
A maioria das ouvidorias não recebe respostas quando solicitam a informação à Secretaria de Segurança.
No Rio (Estado onde a polícia mais mata no país), as mortes cometidas por
policiais só são investigadas caso alguém acione o órgão. “As resistências das corporações para investigar os casos de letalidade e punir possíveis culpados, além das omissões diante desses casos por parte das autoridades, torna o trabalho das ouvidorias desafiador”, diz o estudo.
Para Isabel Figueiredo, diretora do Programa de Apoio às Ouvidorias da Sedh, o órgão é o “espaço institucional da sociedade civil” no controle da polícia. Mas apenas cinco ouvidores são eleitos com participação da sociedade civil. Os demais são indicados por governadores ou secretários.
“Vínculos políticos com as autoridades da Secretaria de Segurança ou do governo do Estado podem servir de impedimento para que ouvidores coloquem a letalidade [policial] como ponto central no trabalho das ouvidorias.”
O ouvidor do Rio, o procurador aposentado Luiz Sérgio Wigderowitz, considera que não é sua função controlar o trabalho da polícia. Em 2008, quando a polícia matou 1.134 civis em supostos confrontos, a ouvidoria acompanhou apenas dez casos -o resultado das investigações não foi divulgado. O órgão só age quando procurado pela família da vítima. Para Wigderowitz, é papel do Ministério Público controlar a ação da polícia.
Fonte: Jornal Folha de São Paulo