Embora o reconhecimento de paternidade seja irrevogável, diante de comprovado erro ele pode ser desconstituído. Segundo os Desembargadores da 8ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça gaúcho, nessas circunstâncias não se trata de revogação e sim de vício no ato de reconhecimento, circunstância que torna irrelevante o debate em torno da paternidade socioafetiva. Com base nesse entendimento, foi mantida a decisão de 1º Grau, proferida na Comarca de Feliz, e negado provimento à apelação interposta no TJRS.
Caso
Inconformada com a sentença que julgou procedente a ação de anulação de reconhecimento voluntário de paternidade, a autora da apelação sustentou que a procedência da demanda requer três requisitos: ausência de relação biológica, comprovação de vício de consentimento no ato de reconhecimento da paternidade e ausência de filiação socioafetiva. Segundo ela, não ficou comprovado o vício de consentimento no ato do registro, uma vez que o homem compareceu espontânea e pessoalmente para reconhecer a paternidade. Além disso, levou mais de 14 anos para questionar a paternidade. Na época do nascimento, o homem era casado e a mãe da apelante era solteira. Assim, se possuía alguma dúvida, deveria ter buscado prova da paternidade à época, o que não fez. Sustentou não ter sido comprovada a inexistência de paternidade socioafetiva, sendo que a jurisprudência do RS se firmou no sentido de ser impossível revogar o reconhecimento voluntário de paternidade.
Apelação
Segundo o relator do acórdão, Desembargador Luiz Felipe Brasil Santos, a sentença apelada não merece qualquer reparo. Diante da incontrastável prova técnica que exclui a paternidade sob o aspecto genético/biológico, resta evidenciado o erro que viciou inarredavelmente o reconhecimento de paternidade, diz o voto. O apelado acreditou na palavra da mãe da apelante, com quem efetivamente havia mantido um relacionamento amoroso, acrescentou. O fato de ter prestado alimentos indica que em que, pese tenha mantido relacionamento extraconjugal, o apelado agiu de boa-fé e, sendo pessoa responsável, diante do nascimento de uma criança que pensava ser sua filha, o mínimo que poderia fazer era lhe prestar alimentos.
No entendimento do relator, o fato de o homem ser casado e da menina ser fruto de uma relação extraconjugal, inclusive residindo em outra cidade, somente reforça a afirmação de que os litigantes não conviviam e o vínculo entre eles era meramente documental, em decorrência do registro e da obrigação alimentar. Porém, mesmo que constatada a relação socioafetiva, ainda assim não se poderia manter o reconhecimento da paternidade decorrente de uma vontade viciada pelo erro comprovado.
O Desembargador relator reconhece que a desconstituição do reconhecimento de paternidade trará danos à apelante. Contudo, não podem ser atribuídos ao apelado, que foi a maior vítima da falácia que o levou a reconhecer e prestar alimentos a uma filha que não era sua.
Participaram do julgamento, além do relator, os Desembargadores Alzir Felippe Schmitz e Ricardo Moreira Lins Pastl.
Fonte: TJRS