Deputado Carlin Moura pronuncia sobre o projeto Cidadania dos Ciganos no plenário da ALMG

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

O Deputado Carlin Moura

Exmo. Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sras. Deputadas, público presente, servidores da Casa, queridos telespectadores da TV Assembléia, na condição de membro da Frente Parlamentar de Promoção da Igualdade Racial, a pedido da nossa querida Presidente, a ilustre Deputada Elisa Costa, tive a oportunidade e o prazer de participar ontem, no Teatro da Assembléia, do lançamento de um importante projeto intitulado Cidadania dos Ciganos. Ele está sendo implementado pelo Sindicato dos Oficiais de Registro Civil de Minas Gerais – Recivil -, com o Centro de Cultura Cigana, a Defensoria Pública de Minas Gerais, a Subsecretaria de Direitos Humanos, da Sedese, e conta ainda com a parceria do Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome, do nosso querido Ministro Patrus, da Subsecretaria de Direitos Humanos, da Presidência da República, da Secretaria de Promoção e Integração Racial, da Presidência da República, do GTI Cigano, do Ministério da Justiça e de diversos outros Ministérios. É um projeto que tem um conteúdo fundamental de resgate da cidadania de uma parcela significativa do povo brasileiro, que é a comunidade cigana, a qual, em Minas Gerais, tem uma importante participação. Segundo o projeto, a universalização do registro civil foi imposta por decreto, ainda do século retrasado, o Decreto nº 9.886, de 7/3/88, que instituiu a obrigatoriedade do registro de nascimento, casamento e óbito em ofícios do Estado. Apesar dessa universalização, o registro civil demorou a ser aceito pela população, principalmente no interior do País, onde o controle religioso da Igreja Católica e a distância das áreas rurais aos cartórios impossibilitavam um maior índice de registros. O registro civil no Brasil, hoje, é regulado pela Lei nº 6.015, de 1973, denominada Lei dos Registros Públicos, mas ainda é triste a nossa realidade, sendo notório o alto índice de sub-registro, ou seja, muitos brasileiros membros de comunidades tradicionais, entre as quais a comunidade cigana, não são registrados civilmente.

A Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social, a Subsecretária de Estado de Direitos Humanos, a Defensoria Pública e o Sindicato dos Oficiais de Registro Civil – Recivil -, preocupados com a grave situação de abstenção ao registro civil de nascimento, sendo esse documento essencial ao exercício do direito à cidadania, elaboraram o Projeto Cidadania dos Ciganos, objetivando erradicar o sub-registro nessa comunidade tradicional. Com o trabalho de articulação de órgãos públicos, com o apoio do governo do Estado de Minas Gerais, do governo federal, da magistratura, do Ministério Público, de várias entidades governamentais e não governamentais, o projeto será desencadeado durante o ano de 2008. As entidades pretendem fazer uma grande mobilização estadual para o registro civil de nascimento, que irá resultar na erradicação do sub-registro de nascimento nas comunidades ciganas. O Projeto Cidadania dos Ciganos irá de fato levar às comunidades ciganas os direitos garantidos na Constituição Federal de 1988, que assegura o registro civil gratuito de nascimento, direito este reforçado com a promulgação da Lei nº 9.534, de 10/12/97, estendendo a gratuidade a todas as pessoas, indistintamente.

O Projeto Cidadania dos Ciganos pretende romper com um problema histórico de exclusão e preconceito da população cigana. Em grande parte isso se deve a uma situação crítica de marginalidade social. Os registros históricos dessa população demonstram que, desde os primórdios da colonização portuguesa no Brasil, os ciganos sofreram graves censuras e preconceitos por parte das instituições do próprio Estado, no nosso país. A comunidade cigana, por várias vezes, foi vítima de perseguição e de massacres e também do preconceito exacerbado de uma parcela da população brasileira, que tratava os ciganos como se fossem uma parte excluída da população. O sub-registro da população cigana é muito grande, superando os dados relativos à média encontrada no Estado de Minas Gerais.

De um lado, temos um tão elevado índice de sub-registro dessa população que supera a média de sub-registros encontrada no Estado de Minas Gerais: segundo o Centro de Cultura Cigana, numa população de 432.503 ciganos no Estado de Minas Gerais, 26,85% destes, ou seja, 116.127, não possuem registro de nascimento. Minas Gerais é o Estado que tem a maior população cigana do Brasil. De outro lado, existe o desafio de se trabalhar com parte da população cigana, que é nômade e que precisa de um mecanismo que lhe possibilite a concretização do registro de nascimento. Assim, o Projeto Cidadania dos Ciganos visa romper esse problema e criar um mecanismo viável de atendimento dessa demanda social. É importante ressaltar que essa ação pretende modificar o atual cenário, que gera conflito de caráter racial, com conseqüências sérias, do ponto de vista da intolerância e do preconceito, para a promoção da cidadania dos ciganos. A questão racial, nos dias de hoje, tomou uma relevância crucial na conjuntura brasileira e mundial, colocando o tema do preconceito racial como inaceitável em qualquer circunstância.


O projeto tem como foco, portanto, a erradicação do sub-registro, para, conseqüentemente, tornar acessível a formalização do estado jurídico de direito vigente em nosso país a segmentos da sociedade incluídos na diversidade cultural e racial que fazem do Brasil um dos países mais ricos de influência cultural.


O Projeto Cidadania dos Ciganos tem como objetivos a promoção e o resgate da cidadania da população cigana de Minas Gerais, oferecendo-lhes a oportunidade de ter sua documentação civil básica e acesso aos programas sociais do governo federal. A população cigana, pela inexistência do registro, é, muitas vezes, impedida de participar de programas sociais como o Bolsa-Família e o Pronaf. São vários os programas que hoje estão em curso pelo governo federal, e de que o cigano é excluído, porque é considerado inexistente para efeito do registro legal – é oficialmente considerado inexistente, pela ausência do registro civil. Muitas crianças da comunidade cigana são impedidas até de se matricularem em escolas públicas do nosso Estado, ou mesmo particulares, pela ausência dessa documentação.

Nesta Casa, tivemos o privilégio e a oportunidade de contar com o Deputado Biel Rocha, na legislatura passada, que tratava com muito carinho e atenção a questão da cidadania dos ciganos. Entre os projetos por ele elaborados, há um que garante a matrícula dos filhos de ciganos em qualquer época do ano, em função da especificidade dessa comunidade, que é nômade. Esse projeto será, por iniciativa da Frente Parlamentar de Promoção da Igualdade Racial, reeditado nesta legislatura, por este Deputado e pela Deputada Elisa Costa.


Minas Gerais tem uma das maiores populações ciganas do Brasil, e a situação de sub-registro desta população é muito grande, acima da média geral de sub-registro do Estado.


O nomadismo – ou seja, o fato de a comunidade cigana estar a cada dia em um lugar; de não ter um local fixo de residência, em função de sua cultura – dessa população é a condição mais difícil para a realização dessa ação social.


Essa exclusão jurídica é um fator potencializador de conflito racial no Estado e no Brasil. O trabalho deve, contudo, ser iniciado o mais rápido possível, tendo em vista o alcance que essa ação deverá ter, considerando sua abrangência nos demais Estados da Federação.


O Sindicato dos Oficiais de Registro Civil, por meio de seu Presidente, o Dr. Paulo Riso, encampou o Plano Nacional de Mobilização pela erradicação do sub-registro e tem plenas condições estruturais de coordenar uma ação com essa complexidade, tomando como base a experiência acumulada nas ações desenvolvidas em outros projetos sociais, principalmente a Caravana da Assistência Social em convênio com a Sedese e o governo federal. Esse é um fator fundamental para iniciar esse projeto por Minas Gerais e sob a coordenação da equipe do sindicato Recivil.


As metas do projeto da cidadania cigana são: efetuar o registro de nascimento e fornecer outros documentos, como segundas vias de certidões de nascimento, casamento e óbito, reconhecimento de paternidade, transformação de união estável em casamento, registro de óbito extemporâneo e outros atos civis básicos a mais de 100 mil membros da comunidade cigana em Minas Gerais; criar um banco de dados para cadastrar os ciganos e dar suporte à realização daqueles atos de registro civil e outros documentos; e executar eventos em forma de mutirão em 80 Municípios mineiros, percorrendo aproximadamente 25.000km.


É importante registrar que a tradição do Estado brasileiro, quando procurou fazer o registro dessas comunidades, foi sempre a de coagir, controlar, perseguir. Hoje, o principal desafio de um projeto como esse é romper essa barreira e mostrar que visamos a implementar a cidadania dessa população tão sofrida e perseguida, que vive tantas agruras em seu dia-a-dia. E isso acontece em um Estado com o privilégio de ter uma grande comunidade como essa, a comunidade cigana. Este Estado teve ainda o privilégio de, pela primeira vez na história da humanidade – mesmo que alguns não queiram assim reconhecer -, propiciar um Presidente da República de origem cigana: o nosso grande mineiro e grande Presidente Juscelino Kubitschek, que tem uma tradição cigana, pois seu pai é filho de ciganos, apesar de muitas vezes a história tentar esconder esse fato. Portanto, Minas Gerais teve o privilégio de oferecer à Nação um Presidente que, sem dúvida, foi um dos melhores do País, e de origem cigana. Assim é mais do que justo o Estado criar esse mecanismo.


Assim, queremos parabenizar todas as entidades que participam do projeto de cidadania cigana, especialmente o Sindicato dos Oficiais de Registro Civil, na pessoa de seu Presidente, Paulo Riso. Convocamos toda a comunidade cigana do Estado a se informar melhor sobre o projeto e a integrá-lo e participar dele, pois, sem dúvida nenhuma, é um projeto importante de resgate da cidadania de uma importante parcela da população de Minas Gerais.


 

Fonte: Imprensa Oficial de Minas Gerais – 02.10.07