Determinada retificação para registro civil reconhecer mudança de sexo

Se o nome da pessoa não corresponde ao seu gênero/sexo constante do registro civil, poderá ter a sua dignidade violada. Com este entendimento, a 8ª Câmara Cível do TJRS autorizou a mudança do sexo de homem para mulher, no registro civil, negada pelo Juízo de 1º Grau mesmo após ter deferido o registro da mudança do nome, de masculino para feminino.

Alegou a interessada que após cirurgia transexual passou a ter genitália externa feminina, não restando qualquer resquício de genitália masculina no seu corpo. Referiu que parece ser uma mulher, não sendo coerente que, após a autorização da realização da cirurgia e a mudança de nome, tenha sido negada a alteração no registro do sexo, “caracterizando-se como verdadeira afronta à sua dignidade”.

Relatou o Desembargador relator, José Ataídes Siqueira Trindade, que o Conselho Federal de Medicina, em novembro de 2002, divulgou diretriz que autorizou aos médicos realizar o tratamento cirúrgico de transexuais, segundo as normas internacionalmente reconhecidas, que incluem um mínimo de dois anos de acompanhamento terapêutico por uma equipe multidisciplinar antes de ser autorizada a cirurgia, caso o diagnóstico de transexualismo se confirme.

No caso em julgamento, acentuou o magistrado, o transexualismo foi devidamente constatado e a cirurgia foi realizada pela equipe especializada e conhecida nacionalmente, do Hospital de Clínicas de Porto Alegre – UFRGS.  Laudo do Serviço Social do programa de atendimento a portadores de transtorno de identidade de gênero – transexualismo (CID-10) constata que o papel que o autor desempenha na sociedade caracteriza-se como de cunho feminino, e que ele é portador do diagnóstico de transexualidade.

O autor foi examinado e já considerado como “a” paciente em laudo médico, porque constatada “a presença de genitália externa feminina, e mamas bem desenvolvidas, vagina medindo 17cm de comprimento, grandes e pequenos lábios, clitóris presentes e meato uretral tópico. Não há qualquer resquício de genitália masculina no seu corpo. O fenótipo é totalmente feminino.”

Pergunta o Desembargador Trindade – “Ora, de que adianta ao insurgente ter reconhecido o direito de alterar o seu nome de X para Y, e continuar sendo designado como do gênero masculino em seus documentos de identificação?”

“A verdade”, continua o magistrado, “é que a cirurgia de redesignação sexual realizada no recorrente transformou-o em mulher, e qualquer discussão a respeito da preservação de eventuais ´direitos de terceiros´ sucumbe ante o princípio fundamental constitucional da dignidade da pessoa humana”.

“O princípio fundamental que informa o Direito da Personalidade é o princípio da dignidade da pessoa humana, amparado pela proteção internacional dos Direitos Humanos (Corte Internacional de Direitos Humanos – CIDH)”, afirmou. “Se o nome não corresponder ao gênero/sexo da pessoa, à evidência que ela terá a sua dignidade aviltada, desprezada, violada”.

A decisão ainda proíbe o Oficial do Registro Civil de lançar qualquer referência relativamente à alteração em eventual certidão expedida, exceto a pedido da própria parte ou por determinação judicial.

Os Desembargadores Rui Portanova, que presidiu a sessão, e Claudir Fidelis Faccenda, acompanharam o voto do relator. A decisão é desta quinta-feira (17/4).

Proc. 70022952261 (João Batista Santafé Aguiar)

 

Fonte: TJ RS