Filha vítima de abandono consegue exclusão de nome dado pelo pai

Abandonada pelo pai ainda na infância, uma mulher conquistou o direito de alterar seu registro para retirada de nome dado por ele. A maioria da 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ deu provimento ao recurso especial interposto por Maria Lúcia (nome fictício adotado nesta matéria para preservar a identidade), que ajuizou ação para excluir o prenome Maria, porque a constrange e a faz lembrar do genitor.

Segundo relato nos autos, após o nascimento da filha, o pai se comprometeu em registrá-la como Lúcia, mas chegou em casa levando o registro incluindo o prenome Maria. Em primeiro grau, o pedido para alteração foi deferido, mas o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios – TJDFT reformou a decisão.

Ao analisar o caso, os magistrados entenderam que a autora não comprovou a notoriedade do nome social, sobretudo com depoimento de testemunhas, tampouco o constrangimento real por seu uso cotidiano. O prenome Maria, por si só, não justifica o pleito, no entendimento apresentado em segunda instância.

Para o STJ, contudo, as exceções ao princípio da imutabilidade do nome expressas na Lei de Registros Públicos (6.015/1973) são meramente exemplificativas. É possível que o juíz responsável determine a modificação se entender que existe o constrangimento. A análise indubitavelmente subjetiva deve ser realizada sob a perspectiva do próprio titular do nome.

Constrangimento pode ter causas diversas

O relator, ministro Antonio Carlos Ferreira, destacou que o constrangimento em razão de nome pode ter causas diversas. Para Ferreira, o TJDFT “limitou-se a elogiar o nome”. Destacou, em seu voto, que a autora é conhecida em meio social e profissional exclusivamente como Lúcia. A exclusão do prenome Maria, não causaria prejuízo à identificação familiar, já que o sobrenome será mantido, sem evidência de má-fé ou prejuízo de terceiros.

O voto foi acompanhado pelos ministros Luís Felipe Salomão e Isabel Gallotti. Já Marco Buzzi divergiu: para ele, o acórdão recorrido deixou claro que não existem provas suficientes para configurar a excepcionalidade necessária para permitir a mudança no registro civil. Não houve sequer comprovação de que o prenome Maria foi dado pelo genitor.

Segundo Bruzzi, alterar essas conclusões esbarraria na Súmula 7 do próprio STJ, que impede reanálise de provas. Mera alegação, desacompanhada de outros elementos, não é suficiente para afastar o princípio da imutabilidade, sob pena de se transformar a exceção em regra, de acordo com o ministro.

Lei de Registros Públicos

Já o ministro Raul Araújo, que também divergiu do relator, chamou a atenção para os critérios elencados na Lei de Registros Públicos: casos excepcionais e fundamentados ou situações como fundada coação ou ameaça decorrente da colaboração com a apuração de crime. Ele ressaltou a necessidade de higidez na análise desses casos para impedir que não ocorra de forma indiscriminada.

Em seu voto, o relator destacou que o artigo 56 da norma supracitada admite a modificação do prenome em circunstâncias menos rigorosas do que a relatada. Ele afirma que é possível fazer a mudança em até um ano após completar 18 anos de idade, “desde que não prejudique os apelidos de família”, sem quaisquer outros requisitos.

Além disso, Ferreira observou que a Lei de Registros é de 1973, quando a imutabilidade dos nomes era necessária para conservar a segurança jurídica das relações. De acordo com o ministro, o nome deixou de ser o único ou o principal recurso de identificação com o advento da tecnologia. Cedeu espaço para formas mais eficientes, como identificação numérica ou digital, por imagem e em redes sociais.

 

Fonte: Assessoria de Comunicação do IBDFAM (com informações do Conjur)