JURISPRUDÊNCIA (Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo) ISSQN – Notários e registradores – Constitucionalidade – Base de cálculo – Valor destinado ao oficial ou tabelião, excluídos os demais encargos, como, por exemplo, custas destinadas ao Estado e a órgão representativo – Na realidade, in casu, a tributação deve ser entendida apenas sobre o trabalho pessoal daquele que responde pela delegação – Artigo 9º do Decreto-lei nº 406/69 – Revogação – Lei Complementar n° 116/03 – Inocorrência – Precedentes – Inexistência de incompatibilidade entre as normas anteriores (decreto-lei nº 406/69) e as novas (lei complementar nº 116/03) – Aplicabilidade do Decreto-lei n° 406/68 reconhecida, notadamente pelo fato de ter sido recepcionado pela Constituição Federal – Precedentes – Cálculo do imposto que deve ser realizado por meio de alíquotas fixas em função da natureza do serviço – O tabelião ou oficial de registro prestam serviço sob a forma de trabalho pessoal e em razão da natureza do serviço tem direito ao regime especial de recolhimento, alíquota fixa, e não em percentual sobre toda a importância recebida pelo Delegado a título de remuneração de todo o serviço prestado pela serventia extrajudicial que administra – Imposto que deve ser recolhido na forma do artigo 9º, §1º do Decreto-lei nº 406/68, ou seja, na forma de trabalho pessoal, não havendo qualquer ilegalidade ou incompatibilidade em sua aplicação – Importante ressaltar que a cobrança do imposto por meio de valor fixo, anual, é mais favorável aos notários e registradores e não implica na violação dos princípios da isonomia (art. 150, II, da CF) e da capacidade contributiva (art. 145, § 1 °, da CF) e sim na observância de tais vetores constitucionais – Recurso voluntário da municipalidade provido para reconhecer a constitucionalidade da incidência do ISSQN sobre os serviços notariais e registrais e provido também recurso oficial do contribuinte para determinar o recolhimento do imposto pelo regime especial estabelecido no Decreto-lei 406/68, julgando a ação parcialmente procedente a ação e revogando a tutela antecipada anteriormente concedida. (Propriedade intelectual de Boletins Informativos Ltda., responsável pela edição das Publicações INR). EMENTA 1. TRIBUTÁRIO – DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE CRÉDITO TRIBUTÁRIO – ISSQN – SERVIÇOS CARTORÁRIOS (registrais e notariais) – INCIDÊNCIA – ISS incidente sobre serviços prestados por notório e oficial de registro – Serviços delegados exercidos em caráter privado. Serviço de natureza pública, mas cuja prestação é privada. Precedente do E. Supremo Tribunal Federal reconhecendo a constitucionalidade da exigência (ADI 3089/DF, julgada em 13/02/2008) – Base de cálculo do ISS – Valor destinado ao oficial delegatário, excluídos os demais encargos, como, por exemplo, custas destinadas ao Estado e a órgão representativo. 2. O regime instituído pelo art. 9º, do Decreto-lei n° 406/69 não foi revogado pelo art. 10, da Lei Complementar n° 116/03. O tabelião ou oficial de registro prestam serviço sob a forma de trabalho pessoal e em razão da natureza do serviço tem direito ao regime especial de recolhimento, alíquota fixa, e não em percentual sobre toda a importância recebida pelo Delegado a título de remuneração de todo o serviço prestado pelo Cartório Extrajudicial que administra – Recolhimento do imposto na forma do art. 9º, § 1º, do Decreto-Lei n° 406/66. 3. Recurso da Municipalidade provido para declarar constitucional a incidência do ISS sobre os serviços notariais. Recurso Oficial provido para determinar o recolhimento do ISS na forma do art. 9°, § 1º, do Decreto-lei 406/68. Sentença reformada. Ação julgada parcialmente procedente. (TJSP – Ap. nº 656.934.5/0-00 – Fartura – 15ª Câm. de Dir. Público – Des. Rel. Daniella Lemos – DJ 14.08.2008) RELATÓRIO Vistos, Cuida-se de Reexame Necessário e Recurso de Apelação interpostos contra a r. sentença de fls. 171/175 e 179/180, que julgou procedente a ação declaratória de inexigibilidade de crédito tributário que SABRINA MARTINHO ajuizou em face da PREFEITURA MUNICIPAL DE FARTURA, declarando inconstitucional a Lei Complementar Municipal n° 02/05, que prevê a incidência de ISS sobre a atividade notarial, afastando a cobrança sobre os serviços prestados pela requerente, visando a reforma da sentença e a improcedência da ação por ser legal e constitucional a incidência de ISS sobre serviços de Cartório Extrajudicial. Inconformada, recorre a Municipalidade/vencida (fls. 188/191), buscando a reforma da sentença, alegando, em síntese, a saber: a) a alegação e o reconhecimento de inconstitucionalidade da Lei Complementar Federal 116/03 e da Lei Complementar Municipal n° 02/05 pela via eleita é imprópria; b) a incidência do ISS sobre as atividades notariais é legal e constitucional; c) ao Município não cabe questionar a constitucionalidade da Lei Federal, deve aplicá-la até que seja revogada; d) revogação da tutela antecipada e e) improcedência da ação. Contra-razões às fls. 196/230. Recurso Oficial às fls. 175 e 180. É o relatório. VOTO Trata-se, além de recurso oficial, de recurso voluntário interposto pela Municipalidade contra a r. sentença que julgou procedente a ação declaratória de crédito tributário, visando a reforma da decisão por considerar a cobrança de ISS sobre as atividades notariais legal e constitucional. Os recursos merecem provimento. Vejamos: No tocante à incidência do ISS sobre as atividades notarias, bem como a constitucionalidade da cobrança com base na Lei Complementar n° 116/03 e na Lei Municipal Complementar n° 02/05, razão assiste ao recorrente, notadamente em razão da decisão recente do Supremo Tribunal Federal, que considerou constitucional e válida a cobrança do aludido imposto sobre os serviços prestados pelos Cartórios Extrajudiciais. A propósito da matéria a incidência do aludido imposto está prevista na lista de serviços da Lei Complementar Federal n° 116/2003, itens 21 e 21.01 (Serviços de registros públicos, cartorários e notariais) e na respectiva lei municipal complementar. Com efeito, pela prestação de tais serviços, o delegatário exige do usuário o respectivo pagamento. E sobre tal atividade não existe impedimento constitucional ou legal que obste a exigência do ISS sobre tais serviços. O Ministro SEPÚLVEDA PERTENCE ao votar na ADI n° 3089/DF, julgou improcedente o pedido, sob o fundamento de tratar-se de atividade estatal delegada, tal como a exploração de serviços públicos essenciais, mas que, enquanto exercida em caráter privado, é serviço sobre o qual incide o ISS. Tal voto foi acompanhado por mais sete Ministros do STF (cf Informativo do e STF, n° 464, de 23 a 27/04/2007, publicado em 03/05/2007). Em 13/02/2008, o julgamento de referida ADI foi concluído, ocasião em que o Supremo Tribunal Federal decidiu que os Municípios podem exigir ISS sobre serviços notariais e de registro público. Dos onze ministros, somente o relator da ação, Min. Carlos Ayres Brito, disse que a cobrança é ilegal, porque os serviços notariais e de registro seriam imunes a esse tipo de tributação. Para os demais ministros, não há ilegalidade na incidência do ISS sobre essas atividades, previstas nos itens 21 e 21.01 da lista anexa à Lei Complementar n° 116/2003. Segundo o Relator, o serviço notarial e de registro é uma atividade estatal delegada, mas, enquanto atividade privada é um serviço sobre o qual nada impede a incidência do ISS. Assim sendo, nada obsta a cobrança do ISS sobre uma atividade explorada economicamente por particular, como no caso em apreço. Dessa forma, o entendimento atual do Supremo Tribunal Federal é no sentido de admitir a incidência de ISS sobre a receita gerada pela prestação de serviços notariais e registrais, não havendo qualquer inconstitucionalidade. E não poderia ser de outra forma, pois as empresas concessionárias e permissionárias de serviços públicos não gozam de imunidade de tributos (art. 150, VI, “a”, CF), o que afetaria também os delegatários de serviços notariais e registrais. Urge realçar, que a celeuma não é de hoje. Já na vigência da CF/1937 ficou estabelecido na Doutrina e na Jurisprudência da época que o serviço público só poderia ser alcançado pela imunidade tributária se prestado por ente político (União, Estado-membro, DF e Município). Não é o caso dos autos, pois o serviço notarial, em que pese sua natureza pública, sua prestação é feita pelo particular (Oficial e sua estrutura funcional – substituto, escreventes, auxiliares, etc). Neste sentido, Ap. Cível 70010864635, 21ª Câmara Cível/TJRS, Rel Des MARCO AURÉLIO HEINZ. J 09/11/2005 Pontes de Miranda ao comentar a Constituição de 1937, leciona: “A Constituição de 1937 ligou a imunidade à subjetividade. É essencial, neste caso, pertença o serviço à União, ao Estado ou ao Município, para que se vedem as outras unidades de direito constitucional, lançar-lhe tributação” (A Constituição de 1937, vol. I, pág. 319). O Supremo Tribunal Federal examinando questão da imunidade e tendo por base este entendimento foi taxativo: “É pacifico, ainda, que as empresas concessionárias de serviço público não gozam de imunidade tributária. A Constituição de 1937 ligou a imunidade à subjetividade” (RE 17581, rel Min. Ribeiro da Costa, 2ª Turma 29 09 52). Note-se que com o advento da Constituição de 1988, pouca coisa mudou sobre a imunidade, dispondo o art. 150 que, sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios instituir impostos sobre o patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros (VI, letra “a”). E mais, esta vedação é extensiva às autarquias e às fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, no que se refere ao patrimônio, à renda e aos serviços vinculados a suas finalidades essenciais ou às delas decorrentes (parágrafo 3º). As imunidades continuam instituídas em favor das pessoas jurídicas de direito publico. O Supremo Tribunal, voltando a examinar o tema, sob a égide da nova Carta Magna, firmou entendimento: “Não há duvida de que, por força da letra “a” do inciso VI, do art. 150 da Constituição Federal, o Município não pode instituir imposto sobre o patrimônio da União. Porém, imunidade constitucional no dispositivo referendo é “ratione personae”. Significa dizer que há imunidade enquanto a União tiver a posse direta do imóvel. Se a qualquer titulo, aquela posse for transferida a pessoa diversa daquelas discriminadas no dispositivo constitucional, desaparece a imunidade” (RE n° 253 394-SP, rei Mm. Limar Galvão.) Ainda sobre a matéria, sua Excelência, no voto condutor deste paradigma, é enfático: “A imunidade recíproca, como já dito, é “intuito personae” e, por isso, se a União delibera ceder seu próprio a terceiro, pessoa jurídica de direito privado, para exploração de atividade que lhe compete, a imunidade não é transferida “. No caso dos autos, os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado por delegação do Poder Público, na forma do art. 236 da Constituição Federal. O conceito de delegação de serviço publico, após algumas variações, está hoje pacificado como sendo a possibilidade do Poder Publico conferir a outra pessoa, quer pública ou privada, atribuições que, originalmente, lhe competem por determinação legal. Evidentemente, delegado a particular o poder de cobrar emolumentos para prestar serviços, não significa que a imunidade do Poder Concedente seja transferida ao prestador de serviço. Aliás, prestador de serviço não é servidor público na definição da Suprema Corte, pois não se submete à aposentadoria compulsória. (MCADIN ° 2 891-RJ, Sepúlveda Pertence). Neste contexto, não se vislumbra vedação ao Município de instituir ISS sobre o serviço prestado por particular, notadamente os notariais, como no presente caso. Cumpre destacar, bem assim que nesse sentido, já vinha se manifestando o Des. EUTÁLIO PORTO desta E. Décima Quinta Câmara. Prova disso, são os fundamentos seguintes, extraídos do voto 3471. proferido da Apelação Cível n° 618 035 5/9, julgado por este Tribunal em 08/03/2007. Confira-se: “Por isso, a transferência das atividades antes realizadas pelo Estado para um particular, não quer dizer que se encontram elas fora do alcance da tributação por serem “atividades públicas”, pois, tal situação acaba por permitir que empresas privadas que hoje exploram atividades antes realizadas pelo Estado, fiquem fora do alcance da tributação em desigualdade com tantas outras empresas que da mesma forma exercem atividades de não menos relevância pública, mas obrigadas a pagar os impostos. E sendo assim, os serviços notariais encontram-se, da mesma forma que qualquer outro particular, alcançados pelo sistema de tributação, concluindo-se pela possibilidade de incidência tributária nos serviços advindos dos cartórios. Estabelece o art. 236 da Constituição Federal que os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Publico`, de forma que, o regime jurídico adotado por aquele que explora esta atividade é de direito privado, em que pese ser o serviço de caráter publico e sob controle estatal, fato, porem, que não desvirtua a natureza privada de quem o exerce, e nem se confunde com o próprio Estado, não advindo daí qualquer condição privilegiada para efeito de incidência tributária. Com efeito, pode-se afirmar, sem hesitação, que os serviços prestados pelos notários e registradores são passíveis de tributação, pouco importando a natureza do valor cobrado por esses serviços, que segundo entendimento manifestado inclusive pelo STF, está dentro do conceito de taxa. Advirta-se, ainda, que não só as serventias extrajudiciais, através dos agentes delegados, estão inseridas na condição de prestadores de serviços públicos com a característica privada, pois, incluem-se também nesta hipótese empresas que são contratadas para realizarem obras, prestarem serviços de saúde, assistência social, educação, fazendo-o sempre mediante regulamentação estatal, e sob sua fiscalização, porém, por sua conta e risco, sendo que, no presente caso, a Lei 8 935/94, determina no art. 22 que os notário e os oficiais de registro responderão, inclusive, pelos danos que eles e seus prepostos causarem a terceiros. Pois não importa o tipo de serviço e sim por quem é ele prestado, se delegado a um particular deverá pagar o tributo devido e se, mais adiante, entender o Estado que deva prestá-lo diretamente, não haverá incidência do tributo, é assim que ocorre com todos os serviços da Administração. Em outros dizeres, se o Poder Publico resolve com seus próprios meios construir uma escola ou prestar serviços hospitalares, evidentemente não pagará o tributo, mas se resolver repassar esses serviços ao setor privado, a situação é outra, pois o pagamento será feito pela Administração Pública, mediante os tributos que ela arrecada, destinando parte destes ao pagamento do particular, incidindo a tributação devida”. Outrossim, deve ser observado que do preço exigido pelo delegatário e pago pelo usuário do serviço cartorário, parte se destina ao delegatário e outro montante das custas devidas vão para o Estado, contribuições devidas à Carteira de Previdência das Serventias Não-Oficializadas, outros encargos ou contribuições instituídas por lei (cf § 2°, art. 58, da Lei Estadual n° 12.227/2006). A título de exemplo, cite-se o registro de pessoa jurídica com ou sem fins lucrativos, incluindo todos os atos do processo e arquivamento, de valor até R$ 590,00. Segundo tabela trazida pela Lei Estadual n° 11.331/2002, o preço a ser cobrado pelo delegatário é de R$ 49,15. Deste total, R$ 30,72 são destinados ao Oficial, R$ 8,73 ao Estado, R$ 6,47 à Carteira das Serventias, R$ 1,62 ao Tribunal de Justiça e R$ 1,62 ao Registro Civil. Com efeito, a base de cálculo do ISS em questão deve ser o valor destinado ao Oficial, excluindo-se os demais encargos com natureza de taxa. Aliás, neste particular, o STF apontou a natureza de taxa dos valores não destinados ao Oficial delegatário – custas e emolumentos (cf ADI 1778-5/MG, Rei. Min. MARCO AURÉLIO, DJ de 31/03/2000). A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal afirmou orientação no sentido de que as custas judiciais e os emolumentos concernentes aos serviços notariais e registrais possuem natureza tributária, qualificando-se quer no que concerne à sua instituição e majoração, quer no que se refere à sua exigibilidade, ao regime jurídico-constitucional pertinente a essa especial modalidade de tributo vinculado, notadamente aos princípios fundamentais que proclamam, dentre outras, as garantias essenciais (a) da reserva de competência impositiva, (b) da legalidade, (c) da anterioridade. Precedentes Doutrina. Nesse sentido trago a colação os julgados recentes deste E. Tribunal de Justiça. Confira-se: Apelação Com Revisão 7523575600 Ementa: AÇÃO ORDINÁRIA – ISSQN – Serviços cartorários (registrais e notariais) – Pretendida imunidade – Não cabimento, pois o prestador não é ente político, mas privado – Serviço de natureza pública, mas cuja prestação é privada – Precedente do e. STF pela constitucionaiidade da exigência (ADI 3089/DF, j. 13/02/2008) – Base de cálculo – Valor destinado ao oficial delegatário, excluídos os demais encargos, como p. ex. custas destinadas ao Estado e a órgão representativo – Improcedência da ação – Apelo municipal provido – APELO PROVIDO. Apelação Com Revisão 4869135000 Ementa: ISS – Serviços da registros públicos, cartorários e notariais – Município de Santa Cruz do Rio Pardo – Denegação de segurança voltada à não incidência do imposto sobre os mesmos, instituído pela legislação municipal – Caráter privado do exercício dos serviços, por conta e risco dos agentes delegados – Hipótese de delegação imprópria – Remuneração daqueles, ademais, inconfundível com taxa – Constitucionalidade da exação – Recurso não provido. Apelação Com Revisão 5413695700 Ementa: APELAÇÃO – Ação Declaratória – ISS incidente sobre serviços prestados por notório e oficial de registro – Serviços delegados exercidos em caráter privado – Natureza sui generis da contraprestação, sendo taxa o valor direcionado ao Estado e remuneração o montante direcionado ao agente delegado, passível de sujeição ao ISS – Diferenciação com outros serviços públicos não permitida pela norma constitucional, sob pena de violação ao princípio da isonomia – Incidência do ISS sobre os emolumentos, excluídos os valores destinados aos órgãos públicos – Sentença mantida – Recursos improvidos. Desta feita, o entendimento a que se chega é o de que não se vislumbra a inconstitucionalidade dos itens 21 e 21.1 da Lista Anexa à Lei Complementar n° 116/03 e os respectivos da Lei Municipal n° 02/05, sendo perfeitamente válida, legal e constitucional a incidência do ISS sobre os serviços notariais e neste aspecto, razão assiste ao Município/recorrente. No tocante à análise do pedido subsidiário deduzido na inicial, não apreciado pelo MM. Juiz sentenciante, notadamente por ter acolhido a tese principal da apelada, reconhecendo a inconstitucionalidade das Leis Federal e Municipal que instituíram a possibilidade do Município exigir o ISS sobre os serviços notariais, com base no art. 515, §§ 1º e 2º, do Código de Processo Civil, passo a apreciá-lo. Vejamos; Sustenta a apelada na inicial, alternativamente, que em sendo considerado exigível o tributo, seja o ISS cobrado de acordo com o disposto no art. 9º, do Decreto-lei 406/68, que não foi revogado pela Lei Complementar 116/03, notadamente por se tratar de prestação de serviço sob a forma de trabalho, pessoal do próprio contribuinte, calculando-se o aludido imposto por meio de alíquotas fixas em função da natureza do serviço. Como cediço, e vêm sendo decidido por esta Colenda Câmara, cujo entendimento compartilho, o art. 10, da Lei Complementar n° 116/03, não revogou o art. 9º, do Decreto-Lei n° 406/68. Isto porque a aludida Lei Complementar somente revogou expressamente os arts. 8º, 10, 11 e 12, inexistindo, portanto, qualquer incompatibilidade entre as normas anteriores e as novas. Nesse sentido, anotamos: “TRIBUTÁRIO. PROCESSO CIVIL. ISS. REVOGAÇÃO. ART. 9º, §§ 1º E 3º, DO DECRETO-LEI N. 406/68. REVOGAÇÃO. ART. 10 DA LEI N. 116/2003. NÃO-OCORRÊNCIA. 1. O art. 9º, §§ 1º e 3º, do Decreto-Lei n. 406/68, que dispõe acerca da incidência de ISS sobre as sociedades civis uniprofissionais, não foi revogado pelo art. 10 da Lei n. 116/2003. 2. Recurso especial improvido. (REsp 713752 / PB, RECURSO ESPECIAL, 2004/0183752-0, Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, T2 – SEGUNDA TURMA, 23/05/2006. TRIBUTÁRIO – ISSQN- Sociedade uniprofissional – ISS – Regime de recolhimento – Decreto-lei n° 406/68 – art. 9º – Revogação – Lei Complementar n° 116/03. A sociedade uniprofissional, sem caráter empresarial, formada para a prestação de serviços especializados, com responsabilidade pessoal, benefícia-se do tratamento diferenciado no pagamento do ISS, previsto no art. 9º, parágrafo terceiro, do Decreto-lei 406/68. Da Lei Complementar n° 116/03 não consta revogação expressa do artigo 9º, do Decreto-lei 406/68, do qual somente foram revogados os artigos 8º, 10, 11 e 12, e não há incompatibilidade ente as normas anteriores e as novas. Rejeita-se a preliminar e confirma-se a sentença, prejudicado o recurso voluntário (TJMG – Apelação Cível/Reexame Necessário n° 1.0702.05.191.924-0/02 – Uberlândia – Re. Exmo. Sr. Des. Almeida Melo – DJ 07.03.2006). Logo, é perfeitamente possível a aplicação do Decreto-lei n° 406/68, notadamente porque fora recepcionado pela Constituição Federal, como já se posicionou o pleno do C. Supremo Tribunal Federal. Confira-se: Supremo Tribunal Federal – STF. ISS- SOCIEDADE UNIPROFISSIONAL – Parâmetros. A Constituição Federal de 1988 implicou a recepção do Decreto-Lei n° 406/68 no que, mediante os preceitos do artigo 9º, parágrafos Iº e 3º, rege o Imposto sobre Serviços devido pelas Sociedades Uniprofissionais – parágrafo quinto do artigo 34 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Carta da República de 1988. Precedente. Recurso Extraordinário n° 200.324-7 RJ. por mim relatado perante o Plenário em 4.11.1.999. (STF – RE n° 237.689 – 2a T. – Rei. Min. Marco Aurélio – DJU 04.08.2000). GRIFEI. No caso, a autora, oficiala do Tabelião de Notas e de Protesto de Letra e Títulos de Fartura – São Paulo (documento de fls. 40) por prestar serviços sob a forma de trabalho pessoal deve fazer o pagamento do ISSQN, que é devido e constitucional, nos termos da fundamentação acima, na forma do artigo 9º, § 1º, do Decreto-Lei n° 406/68, não havendo qualquer ilegalidade ou incompatibilidade. O tabelião ou oficial de registro presta serviço sob a forma de trabalho pessoal e em razão da natureza do serviço, estritamente pessoal, tem direito ao regime especial de recolhimento, alíquota fixa, e não em percentual sobre toda a importância recebida pelo Delegado a título de remuneração de todo o serviço prestado pelo Cartório Extrajudicial que administra. É importante ressaltar que a cobrança do imposto por meio de valor fixo, anual, é mais favorável à autora/apelada e não implica na violação dos princípios da isonomia (art. 150, II, da CF) e da capacidade contributiva (art. 145, § 1 °, da CF) e sim na observância de tais vetores constitucionais. A respeito do tema ensina o Prof. AIRES FERNANDINHO BARRETO em sua obra “ISS NA CONSTITUIÇÃO E NA LEI”, Editora Dialética, 2003, p. 313/314, 316 e 317): “A empresa é a organização técnico-econômica que se dispõe, mediante a combinação de natureza capital e trabalho, a produzir bens ou a prestar serviços visando a obtenção de lucros. É precisamente essa circunstância que autoriza (exige) a previsão de bases de cálculo diferentes para as sociedades de capital e para as sociedades de trabalho. A distinção é exigência dos princípios da isonomia e da capacidade contributiva. É que, diferentemente das sociedades de capital, as sociedades de profissionais representam a reunião de esforços que, em nível de trabalho pessoal, cada sócio poderia desenvolver individualmente. Diante da radical desigualdade entre sociedade de capital e sociedade de trabalho, tratá-las igualmente implicaria ofensa frontal aos princípios referidos. Igualar sociedades em que o elemento predominante é o trabalho pessoal dos próprios contribuintes, com aqueles outros em que a preeminência do capital sobrepuja de longe, o trabalho pessoal, seria ferir o mais fundo possível esses princípios. Por isso que, indo ao encontro das exigências desses vetores constitucionais, previu o legislador complementar que as sociedades de capital suportariam o ISS tendo por base de cálculo o preço do serviço, enquanto as sociedade de trabalho a ele ficariam submetidas em função da base de cálculo diversa e minorada: aquela decorrente da conjugação dos §§ 1º e 3º, do art. 9º, do Decreto-lei 406/68, com a redação que lhe foi dada pela Lei Complementar 56/87. O critério previsto na norma de caráter complementar realiza, na sua inteireza, pois, assim o princípio da igualdade como princípio da capacidade contributiva. Esses princípios, aliás, sempre estiveram presentes nas últimas Constituições. Em síntese, são incensuráveis e coerentes com os preceitos magnos da Constituição de 1988, os critérios eleitos pelo legislador nacional (§ 3º, do art. 9º, do Decreto-lei 406/68, redação do Decreto-lei 834/69)”. Na realidade, no caso em tela, a tributação deve ser entendida apenas sobre o trabalho pessoal daquele que responde pela delegação (autora – Delegada). O ISSQN deve ser cobrado da autora pelo apelante na forma do regime especial (alíquota fixa) estabelecido no art. 9°, § 1º, Decreto-lei 406/68 não revogado pela Lei Complementar 116/03, em especial pela natureza do servido prestado, que é essencialmente pessoal e exercido por delegação do Poder Público, e não sobre a receita bruta de toda arrecadação. Ante o exposto, pelo meu voto, dá-se provimento ao recurso voluntário para reconhecer a constitucionalidade da incidência do ISSQN sobre os serviços notariais do Município de Fartura e também ao Recurso Oficial para determinar o recolhimento do imposto pelo regime especial estabelecido no Decreto-lei 406/68, julgando a ação parcialmente procedente e revogando a tutela antecipada. Havendo sucumbência recíproca cada parte arcará com os honorários advocatícios de seus patronos, compensando-se as custas e despesas processuais, nos termos do art. 21, do Código de Processo Civil. DANIELLA LEMOS – Relatora. |
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Fonte: Boletim Eletrônico INR n. 2754 – 15/08/2008 |