Jurisprudência mineira – Ação anulatória de negócio jurídico – Compra e venda de imóvel – Separação de fato – Bem adquirido após rompimento do vínculo conjugal

AÇÃO ANULATÓRIA DE NEGÓCIO JURÍDICO – COMPRA E VENDA DE IMÓVEL – SEPARAÇÃO DE FATO – BEM ADQUIRIDO APÓS O ROMPIMENTO DO VÍNCULO CONJUGAL – OUTORGA UXÓRIA – DESNECESSIDADE – SENTENÇA MANTIDA
 
– Tendo o contrato de promessa de compra e venda do imóvel sido celebrado após o fim do relacionamento conjugal do proprietário do bem com a autora, separados de fato há anos, não há que se falar em anulação do negócio jurídico, pela ausência de outorga uxória.
 
– Preliminar rejeitada e recurso não provido.
 
Apelação Cível nº 1.0431.10.006073-7/001 – Comarca de Monte Carmelo – Apelante: M.A.F.R. – Apelados: Cartório do 2º Ofício de Notas de Monte Carmelo, V.O. – Relator: Des. Alvimar de Ávila
 
ACÓRDÃO
 
Vistos etc., acorda, em Turma, a 12ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, à unanimidade, em rejeitar a preliminar e negar provimento ao recurso.
 
Belo Horizonte, 4 de dezembro de 2013. – Alvimar de Ávila – Relator.
 
NOTAS TAQUIGRÁFICAS
 
DES. ALVIMAR DE ÁVILA – Trata-se de recurso de apelação interposto por M.A.F.R., nos autos da "ação anulatória de escritura pública de compra e venda c/c anulatória de registro em matrícula de imóvel c/c pedido de tutela antecipada c/c reintegração de posse", movida em face de V.O. e Cartório do 2º Ofício de Notas de Monte Carmelo, contra sentença que julgou improcedente o pedido inicial (f. 118/125).
 
A apelante alega que o conjunto probatório demonstra que houve declaração falsa do estado civil do de cujus alienante do imóvel, H.I.R., que se afirmou solteiro, quando era casado pelo regime da comunhão universal de bens, para desviar o patrimônio do casal, já que é meeira do bem. Defende que o Cartório réu não agiu com prudência e foi negligente em efetuar a lavratura de transferência do imóvel sem a apresentação do documento de comprovação de estado civil, a certidão de nascimento atualizada. Sustenta que, independentemente do regime de casamento, não pode o cônjuge alienar, hipotecar ou gravar de ônus real os bens imóveis ou direitos reais sobre imóveis alheios, sem anuência do outro cônjuge, por expressa vedação contida nos arts. 235 e 242 do CC de 1916. Pugna pela anulação da compra e venda, cancelamento da Escritura Pública de Venda e Compra do bem, averbação na matrícula do imóvel do estado civil do Sr. H.I.R., bem como a averbação do nome e CPF de sua esposa, ora apelante (f. 126/131).
 
Sem preparo, por litigar a recorrente sob o pálio da assistência judiciária.
 
Os apelados apresentam contrarrazões às f. 134/144 e 145/154, alegando o segundo recorrido a intempestividade do recurso e pugnando, ambos, pelo não provimento do apelo.
 
Primeiramente, alega o segundo apelado a intempestividade do recurso aviado em 05.04.2013, afirmando que a sentença foi publicada no DJe em 20.03.2013, com início do prazo recursal em 21.03.2013 e término em 04.04.2013.
 
A Secretaria do Juízo deixou de certificar a data da publicação da sentença, limitando-se a informar a data do envio para publicação (f. 125-v).
 
O apelado trouxe aos autos o impresso de f. 155/156, em que se lê que a súmula da sentença foi "divulgada" em 20.03.2013. Consultando o DJe no site do Tribunal de Justiça, verifiquei que a edição contendo a súmula da sentença do presente feito foi disponibilizada em 20.03.2013, motivo pelo qual se considera publicada em 21.03.2013. O prazo inicial teve início em 22.03.2013 e término em 05.04.2013, data do protocolo do recurso.
 
Rejeito, portanto, a preliminar de intempestividade da apelação.
 
Conheço do recurso, presentes os pressupostos de sua admissibilidade.
 
Cuida o feito de ação anulatória de escritura pública de compra e venda c/c anulatória de registro em matrícula de imóvel c/c reintegração de posse movida pela autora, M.A.F.R., ora apelante, em face da primeira ré, V.O., adquirente do imóvel, e do segundo réu, Cartório do 2º Ofício de Notas de Monte Carmelo.
 
A autora alega que era casada com H.I.R., desde 16.01.1971, pelo regime da comunhão universal de bens, com quem teve três filhos. Sustenta que, após o nascimento do filho mais novo, nascido em 17.05.1974, o varão veio a abandonar o lar e mudou-se para a cidade de Monte Carmelo, onde adquiriu o imóvel descrito na inicial, em 23.04.2008. Esse bem foi transferido à 1ª ré em 1º.11.2010, poucos dias antes do falecimento do Sr. H.I.R., que se deu em 12.11.2010.
 
Como afirma a requerente e pode ser verificado na documentação que instrui o feito, o de cujus declarou, no momento do registro da Escritura Pública de Compra e Venda do bem, em 22.10.2010, ser solteiro (f. 24). Em razão do estado civil declarado pelo proprietário do imóvel, no momento do registro da Escritura Pública de Compra e Venda em nome da adquirente V.O., em 24.11.2010, o Cartório não exigiu certidão de casamento, mas apenas a certidão de nascimento do transmitente, sendo realizado o registro do negócio jurídico realizado sem a participação da autora, esposa do vendedor. Entende a autora ter sido prejudicada pelo negócio jurídico realizado entre o seu falecido marido e a ré V.O., uma vez que dele não participou, em que pese envolver bem imóvel pertencente ao patrimônio do casal.
 
Razão não assiste à autora.
 
Primeiramente, vale ressaltar que os bens adquiridos após a separação de fato do casal não se comunicam, pertencendo apenas àquele que comprova a sua aquisição.
 
É a situação dos autos, uma vez que as testemunhas comprovam que o de cujus apresentava-se como solteiro há mais de 20 anos (f. 114), não comentava de sua esposa ou filhos (f. 115) e vivia sob o mesmo teto com a 1ª ré desde 2003 ou 2004 (f. 77). Está satisfatoriamente comprovado nos autos que a autora e o Sr. H.I.R. estavam separados de fato na data da "aquisição" e da transmissão do bem imóvel objeto da discussão. E, ainda que casados em regime de comunhão universal de bens, no que tange aos bens adquiridos após o matrimônio, somente serão partilhados entre o casal aqueles adquiridos na constância do casamento, o que não inclui aqueles adquiridos após o rompimento de fato do vínculo matrimonial.
 
 A separação de fato do casal, no presente caso, significou a ruptura definitiva do vínculo conjugal, sem possibilidade de reconciliação, afastando, com isso, a partilha de bens adquiridos após o rompimento da vida em comum.
 
Nesse sentido:
 
"A cônjuge-virago separada de fato do marido há muitos anos não faz jus aos bens por ele adquiridos posteriormente a tal afastamento, ainda que não desfeitos, oficialmente, os laços mediante separação judicial. Precedentes do STJ […]" (REsp nº 32.218/SP, Quarta Turma, Relator o Ministro Aldir Passarinho Jr., DJ de 03.09.2001, p. 224).
 
Repita-se, restando demonstrando que o contrato de compra e venda do imóvel, objeto da lide, deu-se somente após o fim do relacionamento conjugal, não há que se falar em anulação da venda do imóvel e de averbação do estado civil do transmitente, por quanto o referido bem fora adquirido em época posterior à separação de fato do casal e, ante a inexistência de qualquer prova em contrário, não poderia o aludido bem ser partilhado, sendo, também, desnecessária a outorga uxória para a venda do bem.
 
O Código Civil estabelece que a outorga uxória somente se faz necessária quando houver alienação de bens do casal, na constância do casamento, qualquer que seja o regime existente entre as partes, ou no caso de alienação de imóveis comuns, mesmo depois de rompida a sociedade conjugal, mas adquiridos na constância do casamento.
 
Nesse sentido, a jurisprudência:
 
"Devem ser excluídos da partilha em ação de divórcio direto os bens adquiridos por um dos cônjuges após a separação de fato” (Apelação Cível nº 1.0701.02.001057-8/001(1), Relator o Des. Caetano Levi Lopes, Data do acórdão: 10.02.2004, TJMG).
 
Por essas razões e pelos fundamentos postos na sentença, não merece acolhida a irresignação da recorrente. 
 
Pelo exposto, rejeito a preliminar e nego provimento ao recurso.
 
Custas recursais, pela apelante, suspensa a exigibilidade, nos termos do art. 12 da Lei nº 1.060/50.
 
DES. SALDANHA DA FONSECA – De acordo com o Relator.
 
DES. DOMINGOS COELHO – De acordo com o Relator.
 
Súmula – REJEITARAM A PRELIMINAR E NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO.


Fonte: Diário do Judiciário Eletrônico – MG