Jurisprudência mineira – Ação de substituição de curatela – Óbito do antigo curador – Ação proposta pelo irmão da curatelada – Desnecessidade de realização de estudo social

AÇÃO DE SUBSTITUIÇÃO DE CURATELA – ÓBITO DO ANTIGO CURADOR – AÇÃO PROPOSTA PELO IRMÃO DA CURATELADA – PREVISÃO LEGAL – AUSÊNCIA DE FATO QUE DESABONE SUA CONDUTA OU INDÍCIOS NEGATIVOS DE APTIDÃO – DESNECESSIDADE DE REALIZAÇÃO DE ESTUDO SOCIAL – SENTENÇA MANTIDA


– Em observância ao art. 1.775 do Código Civil, percebe-se que os irmãos têm legitimidade para ser curadores uns dos outros nos casos em que um é interditado.


– Tendo em vista que há previsão legal para que os irmãos sejam curadores e se não houver no caso concreto qualquer indício de que o irmão que ajuizou a ação de substituição de curador não tem aptidão para o exercício do múnus, entende-se pela desnecessidade da realização de estudo social para que o irmão seja nomeado como curador.


– Destaca-se que, se o Ministério Público ou outro legitimado perceber qualquer irregularidade na conduta do curador no exercício do múnus, poderá ser pleiteada em juízo a sua remoção.


Apelação Cível nº 1.0433.14.027777-6/001 – Comarca de Montes Claros – Apelante: Ministério Público do Estado de Minas Gerais – Apelado: J.F.S. – Interessada: M.J.F.A., representada pelo curador J.F.S. – Relatora: Des.ª Vanessa Verdolim Hudson Andrade


ACÓRDÃO


Vistos etc., acorda, em Turma, a 1ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em negar provimento ao recurso.


Belo Horizonte, 14 de julho de 2015. – Vanessa Verdolim Hudson Andrade – Relatora.


NOTAS TAQUIGRÁFICAS

 

DES.ª VANESSA VERDOLIM HUDSON ANDRADE – Trata-se de recurso de apelação interposto às f. 19/24 pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais, nos autos da ação de substituição de curatela que J.F.S. propõe em face de M.J.F.A., demonstrando inconformismo perante a sentença proferida à f. 17, que julgou procedente o pedido de substituição de curatela, para nomear para o encargo J.F.S., determinando que ele firmaria compromisso e dispensando o oferecimento de garantia legal para o exercício do múnus por não constar nos autos a existência de bens em nome da incapaz. Com base no art. 1.768, I, do Código Civil, limitou a representação judicial e extrajudicial da interditanda, vedada a contratação de empréstimo ou financiamento consignado e qualquer ato de disposição de bens e rendas. Dispensou a prestação de contas.


Em suas razões recursais, alega o Ministério Público que, para sustentar o pleito de substituição de curatela, o autor comprovou apenas seu parentesco com a curatelada e o óbito do antigo curador. Aduz que é imprescindível que seja averiguado se o autor realmente possui condições de exercer a curatela antes de que seja nomeado curador. Acrescenta que postulou a realização de estudo social, mas o requerimento ministerial foi ignorado, sendo que a sentença foi proferida sem qualquer comprovação da viabilidade de se deferir a curatela da interditada ao recorrido. Salienta que não está provado, nem de forma mínima, que o autor preservará o bem-estar da curatelada. Assim, pede que a sentença seja cassada.


Contrarrazões às f. 27/30, pela manutenção da sentença.


Parecer da Procuradoria-Geral de Justiça às f. 39/43, pelo provimento do recurso, a fim de que seja cassada a decisão e determinada a realização de estudo social.


Não conheço dos documentos juntados pelo apelado na sua peça de contrarrazões de apelação, às f. 31/34, uma vez que não se trata de documentos novos, mas de simples declarações, que poderiam ter sido obtidas e colacionadas aos autos durante a instrução probatória.


Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço da apelação interposta.


O Ministério Público, atuando como custos legis da curatelada, pretende que a sentença seja cassada, alegando, em síntese, que fora proferida sem qualquer lastro probatório, sendo que foi autorizada a substituição do curador sem que fosse realizado sequer o estudo social que havia sido solicitado pelo ente ministerial.


Data venia, trata-se de questão de mérito, que com ele será decidida.


Verifica-se, na cópia da sentença colacionada à f. 11, que M.J.F.A. fora interditada e declarada absolutamente incapaz para exercer pessoalmente os atos da vida civil. Na oportunidade, o Magistrado nomeou curador aquele requerente que havia pedido a interdição de M.J.F.A., seu irmão S.F.S.


Contudo, conforme certidão de óbito juntada à f. 13, o curador de M.J.F.A. faleceu no ano de 2012.


Assim, a presente ação fora proposta por J.F.S., ora apelado, objetivando sua nomeação como novo curador de M.J.F.A., em substituição ao de cujus.


O autor acrescenta que outra irmã da interditada já havia postulado a substituição da curadoria, mas que esta também veio a óbito, conforme certidão à f. 14.


Nesse contexto, o autor afirma que também é irmão da curatelada e pede que seja nomeado como seu novo curador, destacando que a interditada é beneficiária do amparo social à pessoa com deficiência no INSS, mas que o benefício se encontra cancelado, pelo que se faz necessária a rápida substituição do curador.


Os documentos de identidade às f. 08 e 09 comprovam que o autor e a curatelada são irmãos, filhos da mesma mãe, A.F.S. À f. 15, verifica-se que o Juiz a quo concedeu a tutela antecipada, nos seguintes termos:


“[…] defiro a antecipação de tutela para conceder ao requerente o direito de exercer o múnus da curadoria provisória da irmã M.J.F.A., fixando os limites da curatela apenas na representação judicial e extrajudicial do(a) interditando(a), vedando-se expressamente qualquer ato de disposição de bens e rendas, cuja movimentação financeira mensal total não pode ultrapassar o valor de um salário mínimo”.


Ato contínuo, foi aberta vista ao Ministério Público, que se manifestou à f. 16 pela realização de estudo social do caso. Verificase que o Ministério Público nem sequer agravou da decisão interlocutória que deferiu a tutela antecipada para nomear o autor como curador provisório. E não trouxe qualquer óbice legal ou impedimento à sua pretensão.


Em seguida, a sentença fora proferida sem o deferimento da diligência pretendida pelo Ministério Público, e o pedido de substituição de curatela foi julgado procedente.


A ação de interdição é procedimento de jurisdição voluntária e destina-se, precipuamente, a proteger aqueles que, embora maiores, não têm capacidade para gerir seus próprios bens e praticar atos da vida civil. De acordo com o art. 1.767 do Código Civil, estão sujeitos à interdição aqueles que não tiverem o necessário discernimento para os atos da vida civil.


Quanto à escolha do curador, assim dispõe o art. 1.775 do Código Civil:


“Art. 1.775. O cônjuge ou companheiro, não separado judicialmente ou de fato, é, de direito, curador do outro, quando interdito. § 1º Na falta do cônjuge ou companheiro, é curador legítimo o pai ou a mãe; na falta destes, o descendente que se demonstrar mais apto.


§ 2º Entre os descendentes, os mais próximos precedem aos mais remotos.


§ 3º Na falta das pessoas mencionadas neste artigo, compete ao juiz a escolha do curador”.


Em observância ao artigo supra, fácil perceber que o autor, como irmão da curatelada, tem legitimidade para ser curador desta.


Acrescente-se que não se trata, aqui, de processo de interdição, mas de substituição de curador.


Note-se que o interditado não pode ficar sem curador que defenda seus interesses, tanto que é prevista a curatela provisória. Seria, assim, o caso de converter a curatela deferida em provisória, até que fosse feito o estudo social.


No entanto, o pedido é feito sem alegação de qualquer fato que enseje a desconfiança de que o curador é inidôneo. A decisão limitou a curatela à representação judicial e extrajudicial, vedando qualquer ato de disposição de renda e limitando a movimentação financeira mensal total a um salário mínimo.


Não vejo qualquer risco em manter a curatela, em prol dos interesses da curatelada, que tem, inclusive, benefício do INSS, que está suspenso por falta de curador.


Assim, tendo em vista que há previsão legal para o pedido e não há nos autos qualquer indício de que o autor não tem aptidão para o exercício do múnus, entende-se pela desnecessidade da anulação da sentença, pelo que não merece reparos a sentença que julgou o pedido procedente.


Acrescenta-se que dilação probatória constitui fase processual que, dentro dos limites impostos pela legislação e pelo princípio do devido processo legal, em seus corolários da ampla defesa e do contraditório, fica a critério do julgador, visto que a prova a ele se dirige.


Dessarte, preleciona o art. 130 de nosso diploma processual civil que "caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias à instrução do processo", podendo indeferir "as diligências inúteis ou meramente protelatórias".


Diante do exposto, considerando que o autor é irmão da curatelada e, pelo que consta nos autos, não há nada que o desabone para o mister, conclui-se que o pleito não merece ser acolhido. Destaca-se que, se o Ministério Público ou outro legitimado perceber qualquer irregularidade na conduta do autor como curador, poderá ser pleiteada em juízo a sua remoção.


No entanto, tenho por bem que o estudo social requerido deve ser realizado, até considerando que a preocupação do apelante não é desarrazoada. Comprovado que o curador nomeado não é idôneo, poderá ser afastado, se for o caso.


Em conclusão, nego provimento ao recurso e mantenho a sentença, sem prejuízo do estudo social requerido e que deve ser realizado.

 

Com recomendação.


DES. ARMANDO FREIRE – A substituição é providencial nessas circunstâncias e, ademais, não há elementos objetivos que possam sustentar a contraindicação do nomeado.


Em sendo assim, dispensa-se, inclusive, a obrigatoriedade de se diligenciar, na sequência, apurando-se as reais condições do nomeado de bem assumir o encargo e exercer devidamente a curatela da irmã. De mais a mais, certo é que nada impede a instauração de um futuro incidente, visando à destituição, caso apurados, objetivamente, fatos que se prestem a recomendar a substituição.


Com essas breves ressalvas, acompanho a em. Relatora, negando provimento ao recurso.


DES. ALBERTO VILAS BOAS – Comungo da argumentação da Relatora quando enfatiza que é possível promover a substituição do curador falecido por outra pessoa que, na espécie em exame, é idônea e irmã do curatelado.


Não assim, entretanto, quanto à possibilidade de, após o retorno dos autos, ser feito o estudo social quanto à pertinência da substituição feita pela autoridade judiciária.


Com efeito, ou o substituto tem condições de exercer a curatela ou, se não tem, isso deverá ser objeto de específico incidente a ser postulado pelo Ministério Público na forma prevista no art. 1.194, CPC.


Nego provimento ao apelo, mas não adiro à recomendação contida no voto da Relatora, data venia.


Súmula – NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO.

 

 

Fonte: Diário do Judiciário Eletrônico – MG