Jurisprudência mineira – Agravo de instrumento – Inventário – Direito de acrescer

AGRAVO DE INSTRUMENTO – INVENTÁRIO – DIREITO DE ACRESCER – NÃO-OCORRÊNCIA DE QUALQUER UMA DAS POSSIBILIDADES – TRANSMISSÃO DA HERANÇA NO MOMENTO DO ÓBITO – FALECIMENTO DE HERDEIRA TESTAMENTÁRIA POSTERIOR À MORTE DO TESTADOR

– O direito de acrescer surge apenas quando o testador distribui seu patrimônio entre vários herdeiros ou legatários e um deles não chega a adquirir sua parte por premoriência, exclusão ou renúncia.

Agravo n° 1.0024.89.607260-0/001 – Comarca de Belo Horizonte – Agravantes: Desy Josefina Fróes Guimarães, inventariante do espólio de Baltazar Mendes Guimarães e outras – Relator: DES. ARMANDO FREIRE

A C Ó R D Ã O

Vistos etc., acorda, em Turma, a 1ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM NEGAR PROVIMENTO.

Belo Horizonte, 8 de julho de 2008. – Armando Freire – Relator.

N O T A S  T A Q U I G R Á F I C A S

DES. ARMANDO FREIRE – Trata-se de recurso de agravo de instrumento interposto por Desy Josefina Fróes Guimarães e outras, já qualificadas nos autos, contra decisão proferida pelo MM. Juiz de Direito da 2ª Vara Cível desta Capital, em autos de procedimento de inventário dos bens deixados por Baltazar Mendes Guimarães, que consistiu em indeferir o pedido de exclusão da herdeira testamentária falecida (f.45/46-TJ).

Narram as agravantes que o referido procedimento de inventário teve início no ano de 1989, estando tramitando até hoje. Informam que ajuizaram ação anulatória de cláusula testamentária, ação esta que foi julgada improcedente. Noticiam que além delas (filhas) e do ex-cônjuge (ora inventariante) do de cujus, este instituiu como herdeira testamentária a sua concubina, Sebastiana Maria de Jesus, atribuindo a ela, “respeitada a legítima de suas quatro filhas acima mencionadas, a parte de seus bens que a lei lhe faculta dispor livremente”. Narram, ainda, que, em dezembro de 2005, faleceu a referida herdeira testamentária, sem deixar herdeiros. Aduz que, em virtude disso, opinou o Ministério Público estadual pela atribuição ao quinhão que caberia à mesma a condição de herança jacente, o que restou atendido pelo digno Juízo de origem.

Salientam que não pode prevalecer o entendimento do MM. Magistrado manifestado na r. decisão agravada, visto que a parte que tocaria na herança à herdeira falecida deverá ser acrescida aos seus respectivos quinhões, e não tratada como se herança jacente fosse. Sustentam que a intenção do falecido, na espécie, “mostra-se clara, qual seja, assegurar parte de seu patrimônio a Sebastiana, mas jamais prejudicar suas filhas (herdeiras necessárias)”. Afirmam que “a interpretação proposta pela r. decisão agravada, porém, além de nada assegurar à Sebastiana (que faleceu no curso do inventário), ainda prejudica o patrimônio das filhas, que terão como condômino o Município de Belo Horizonte” no imóvel deixado pelo de cujus. Aduzem que tal circunstância causa diversas dificuldades para a venda do referido imóvel, tendo em vista que a sua alienação deverá ser precedida de lei, por tratar-se de bem público, devendo-se aguardar, ainda, a realização de procedimento licitatório. Asseveram que, por tratar de negócio jurídico o testamento deixado pelo de cujus, deve-se atender mais à intenção da declaração de vontade que ao sentido literal da linguagem. Arrematam dizendo que as hipóteses legais do direito de acrescer não são numerus clausus.

Pugnam, ao final, pelo provimento do recurso.

Presentes as hipóteses previstas no art. 527, inciso II, do CPC, recebi o presente recurso e deferi o seu processamento às f. 60/61.

A parte agravada apresentou contraminuta às f. 66/67.

Informações prestadas pelo digno Juiz da causa às f. 69/70.

A douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer de f. 73/75, opina pelo desprovimento do recurso.

Atendidos os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso interposto.

O digno Juiz a quo proferiu decisão que se encontra reproduzida às f. 45/46-TJ, ora hostilizada, que consistiu em indeferir o pedido de exclusão da herdeira testamentária falecida.

Data venia, tenho que a r. decisão agravada deve ser mantida.

Alegam as agravantes, como relatado, que a parte que tocaria na herança à herdeira testamentária falecida deverá ser acrescida aos seus respectivos quinhões, e não tratada como se herança jacente fosse. Aduzem ainda que, por tratar de negócio jurídico o testamento deixado pelo de cujus, deve-se atender mais à intenção da declaração de vontade que ao sentido literal da linguagem.

Como é sabido, “a questão do direito de acrescer poderá surgir quando o testador distribui seu patrimônio entre vários herdeiros ou legatários e um deles não chega a adquirir sua parte por premoriência, incapacidade ou renúncia” (VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito das sucessões. 6. ed., São Paulo: Atlas, 2006, p. 274).

Sendo assim, são causas que determinam a caducidade do direito do herdeiro, ensejando o acrescimento: a renúncia, a exclusão ou o falecimento antes do testador.

Entretanto, no caso em análise, pelo que se depreende do exame dos autos, não ocorreu qualquer das hipóteses que ensejariam o direito de acrescer, já que não houve renúncia, exclusão ou pré-morte.

Ao contrário, a herdeira testamentária Sebastiana Maria de Jesus foi contemplada com a totalidade da sua parte, quando aberta a sucessão dos bens deixados por Baltazar Mendes Guimarães, falecido aos 04 de junho de 1989 (f. 14-TJ). Passados mais de dezesseis anos desta data, é que ela veio a falecer também, gerando a controvérsia sob análise.

Com efeito, depreende-se do comando expresso no art. 1.784 do Código Civil, que, no momento exato do falecimento, os bens se transmitem aos herdeiros legítimos e testamentários do de cujus. Isto porque “Adotou-se o princípio originário do droit de saisine, que dá à sentença de partilha caráter meramente declaratório, haja vista que a transmissão dos bens aos herdeiros e legatários se dá no momento do óbito do transmitente” (REsp 805.806/RJ, Rel.ª Ministra Denise Arruda, Primeira Turma, julgado em 13.11.2007, DJ de 18.02.2008, p. 1)

Ora, sendo assim, no momento da morte do Sr. Baltazar Mendes Guimarães, os seus bens passaram a pertencer à esfera jurídica patrimonial dos seus herdeiros necessários e da herdeira testamentária. Logo, com a morte desta última, não há que se falar em direito de acrescer, uma vez que, como dito, ela já havia adquirido a sua parte.

Assim, não havendo sucessores conhecidos da herdeira testamentária, sem entrar no mérito de questão ainda por decidir, entendo que a herança deve mesmo ser declarada jacente, como bem sinalizou o MM. Magistrado, uma vez que tal procedimento se dá quando, aberta a sucessão, não existem herdeiros conhecidos.

Nessa mesma linha, não há que se falar em preservar a intenção do testador, visto que a disposição de última vontade do de cujus restou satisfeita quando do seu falecimento e a conseqüente transmissão da parte que cabia à herdeira testamentária.

Diante do exposto, nego provimento ao recurso.

Custas, ex lege.

DES. ALBERTO VILAS BOAS – Sr. Presidente. Peço vista dos autos.

Súmula – PEDIU VISTA O 1º VOGAL. APÓS VOTAR O RELATOR NEGANDO PROVIMENTO.

N O T A S  T A Q U I G R Á F I C A S

PRESIDENTE (DES. EDUARDO ANDRADE) – O julgamento deste feito foi adiado na sessão do dia 10.06.08, a pedido do 1º Vogal, após votar o Relator negando provimento.

Com a palavra o Des. Alberto Vilas Boas.

DES. ALBERTO VILAS BOAS – No âmbito do testamento público firmado por Baltazar Mendes Guimarães, estabeleceu-se que, respeitada a legítima de suas filhas, instituía-se como herdeira testamentária a companheira Sebastiana Maria de Jesus e atribuiu-se-lhe “a parte de seus bens que a lei lhe faculta dispor livremente”.

Aberta a sucessão e após ter sido validada judicialmente a deliberação de última vontade, certo é que a aludida beneficiária faleceu sem deixar herdeiros, e, em conseqüência, o Juiz a quo atribuiu ao quinhão a condição de herança jacente.

Pedi vista dos autos em razão do conteúdo do voto do Relator e dos termos do memorial firmado pelo ilustre advogado Carlos Victor Muzzi Filho, que sustenta ser cabível o direito de acrescer em favor das herdeiras legítimas.

Não lhe assiste razão, data venia.

Com efeito, observado o contexto do art. 1.941 do CC, que reproduz, na essência, o art. 1.710 do CC/16, dele se extrai que o direito de acrescer se manifesta quando existem diversos herdeiros testamentários e, na falta de algum e desde que não tenha ocorrido prévia discriminação da parte de cada herdeiro, nem indicado substituto, é possível que ocorra o acréscimo no quinhão dos demais.

Dentro desse contexto, considero que a razão lógica do direito de acrescer se encontra na pluralidade de herdeiros testamentários chamados à herança em quinhões não determinados, como anota Mauro Antonini (PELUSO, Cezar (coord.). Código Civil comentado. São Paulo: Manole, 2007, p. 1.890).

Certo que, inviabilizado o direito de acrescer, o art. 1.944 do CC, enfatiza que “transmite-se aos herdeiros legítimos a quota vaga do nomeado”, e a aludida regra aplica-se na espécie em exame, na medida em que Sebastiana de Jesus não deixou herdeiros e assim sua fração assume a condição de herança jacente.

Não desconheço que esta interpretação criará situação peculiar mediante a formação de condomínio entre as herdeiras legítimas e o Município de Belo Horizonte, mas é a única viável dentro do sistema normativo infraconstitucional.

Nego provimento.

DES. EDUARDO ANDRADE – Peço vista dos autos.

Súmula – PEDIU VISTA O 2º VOGAL, APÓS VOTAR O 1º VOGAL NEGANDO PROVIMENTO.

N O T A S  T A Q U I G R Á F I C A S

PRESIDENTE (DES. EDUARDO ANDRADE) – O julgamento deste feito foi adiado na sessão do dia 10.06.08, a pedido do 1º Vogal, após votar o Relator negando provimento.

Foi novamente adiado na sessão do dia 01.07.08, a pedido do 2º Vogal, após votar o 1º negando provimento.

O meu voto é o seguinte:

Na sessão do dia 01.07.2008, pedi vista dos autos, após votar o Primeiro Vogal negando provimento.

Consignando a sedução da tese defendida pelo ilustre advogado, não encontrei, no entanto, respaldo a ela, nem na doutrina e nem na jurisprudência, daí por que, acompanhando os votos precedentes, também nego provimento ao recurso.

Súmula – NEGARAM PROVIMENTO.

 

Fonte: Diário do Judiciário Eletrônico – MG