Jurisprudência mineira – Apelação – Ação de inventário – Partilha – Inconformismo de herdeiro – Anuência do Ministério Público – Irregularidade Fiscal – Empecilho

JURISPRUDÊNCIA CÍVEL APELAÇÃO – AÇÃO DE INVENTÁRIO – PARTILHA – HOMOLOGAÇÃO – PLANO DE PARTILHA – INCONFORMISMO DE HERDEIRO – ANUÊNCIA DO MINISTÉRIO PÚBLICO – IRREGULARIDADE FISCAL – EMPECILHO – ART. 1.026 – CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL – INOBSERVÂNCIA – NULIDADE – SENTENÇA CASSADA

– Merece ser cassada a sentença que homologa plano de partilha apresentado pelo inventariante a despeito da manifesta discordância de herdeiro, da cota ministerial em oposição à homologação e, ainda, sem observar o disposto no art. 1.026 do Código de Processo Civil, que dispõe sobre a regularidade fiscal para a decretação da partilha.

Recurso provido.

Apelação Cível n° 1.0024.01.554182-4/002 – Comarca de Belo Horizonte – Apelante: M.T.L.L. – Apelado: E.O.L., espólio de, representado p/ inventariante I.L.O.L. – Relator: Des. Kildare Carvalho

A C Ó R D Ã O

Vistos etc., acorda, em Turma, a 3ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, sob a Presidência do Desembargador Kildare Carvalho, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, em dar provimento.

Belo Horizonte, 17 de maio de 2011. – Kildare Carvalho – Relator.

N O T A S T A Q U I G R Á F I C A S

DES. KILDARE CARVALHO – M.T.L.L. apela da r. sentença de f. 233/234, que homologou a partilha apresentada nos autos do inventário dos bens deixados por E.O.L., cujo espólio é representado pelo inventariante I.L.O.L.

Inconformado, pugna o apelante pela reforma da sentença para que, tornada ineficaz a homologação da partilha, o processo retome a sua marcha, de maneira que se faça a partilha com bens individuados, livre do estado de comunhão. Para tanto, aduz, em síntese, ser impossível o estabelecimento de condomínio sobre os bens inventariados, em razão da inexistência de afeto com os demais herdeiros. Alega, ainda, que a partilha foi julgada sem o pagamento de tributos.

Conheço do recurso, presentes os pressupostos para sua admissão.

A controvérsia instaurada no feito, trazida à apreciação desta instância revisora por força do presente recurso de apelação, reside na insurreição do apelante ante o comando judicial que, em sede de ação de inventário, homologou, por sentença, o plano de partilha apresentado pelo inventariante dos bens deixados com a morte de E.O.L., pai do ora recorrente.

A uma análise detida dos autos, tenho que razão assiste ao recorrente, pelo que merece ser dado provimento ao apelo para cassar a sentença de f. 233/234. Pois bem, em suas razões recursais, por meio das quais reitera o teor de todas suas manifestações lançadas no curso do feito, alega o recorrente inexistir qualquer clima de afeto entre ele e os demais herdeiros do de cujus, pelo que não se justificaria a determinação da partilha dos bens inventariados em forma de condomínio. Assim, almeja seja procedida a avaliação de todos os bens do espólio para que seja possível a partilha de forma individualizada.

À leitura do comando sentencial (f. 233/234), inferese que, ao prolatar a sentença recorrida, o douto Julgador de origem homologou, por sentença, o plano de partilha apresentado pelo inventariante, plano este contra o qual se opôs o ora recorrente, e até mesmo o Órgão Ministerial, nos termos da manifestação de f. 230/231.

Ora, tratando-se de partilha judicial, como no caso em tela, compete ao julgador sanar as divergências e discordâncias entre os herdeiros, de maneira que se atenda, a contento, à finalidade da partilha que, como sabido, consiste na divisão dos bens deixados pelo de cujus aos seus sucessores, representando, assim, a extinção da comunhão, da indivisibilidade dos bens existente desde o falecimento.

Sobre a partilha judicial, aliás, ensina Dimas Messias de Carvalho:

"É deliberada por sentença de mérito, em que o juiz decidirá quanto aos requerimentos dos interessados, determinando os quinhões. É obrigatória, se não ocorrer acordo entre os herdeiros, existir incapazes ou ausentes, […]" (Direito das sucessões, inventário e partilha. Belo Horizonte: Del Rey, 2007, p. 271).

Vale dizer, observadas as disposições legais inerentes ao tema e ainda as questões relativas aos bens inventariados, tais como valor, natureza, liquidez, divisão cômoda, dentre outras, não deve a partilha ser feita de maneira que represente a mera igualdade matemática, como se observa no presente caso, repita-se – contra a vontade do herdeiro apelante.

Nesse sentido, mais uma vez oportuna a lição extraída da obra de Dimas Messias de Carvalho:

"A regra da igualdade não significa, entretanto, que, ao deliberar sobre a partilha, o juiz determina que os herdeiros devam ficar com uma parte ideal em todos os bens, pois a partilha judicial é aquela em que o juiz estabelece, na ausência de acordo, a divisão dos bens e as partes que cabem a cada herdeiro da forma que lhe pareça mais justa e cômoda. A igualdade entre os herdeiros na partilha não se assenta em que todos tirem uma parte aritmética e ideal em cada um dos bens […] A indivisão somente deve persistir, quando desejada pelos próprios interessados ou em casos de impossibilidade física" (op. cit., p. 272).

Diante de tal realidade, entendo não ter sido atendida, a contento, a prestação jurisdicional buscada com o ajuizamento da presente ação, não obstante versar o feito sobre procedimento de jurisdição voluntária.

A propósito, bem ilustram a situação versada no presente caso os comentários acerca do tema, extraídos da obra de Salomão de Araújo Cateb.

Confira-se:

"Sem dúvida que a comunhão é berço de discórdia entre os comunheiros, acarretando inimizades e até contrariedade de ordem financeira, […]".

"O mais importante é evitar litígios futuros, dividindo as famílias. […] A família é mais importante que o patrimônio, mas, algumas vezes, ela se dissipa, digladiando-se os herdeiros por pouca coisa. Cabe ao juiz, condutor do processo, conhecedor da lei e representante do Estado, prevenir litígios" (Direito das sucessões. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2003, p. 274/280).

Não bastassem os argumentos acima tecidos, não se pode deixar de levar em consideração o fato de que não fora observada pelo inventariante, a rigor, o disposto no art. 1.026 do Código de Processo Civil, segundo o qual a partilha somente poderá ser julgada, por sentença, após o devido pagamento do imposto de transmissão a título de morte – ITCD -, bem como a juntada aos autos das certidões ou informações negativas de dívida para com a Fazenda Pública.

Com efeito, compulsando detidamente o processado, levados em consideração todos os bens constantes do plano de partilha apresentado e homologado por sentença, verifica-se que, a rigor, não se pode aferir a regularidade fiscal exigida pela legislação pertinente ao tema, na medida em que não juntadas as certidões negativas referentes a todos os bens imóveis, além do que o pagamento efetuado a título de ITCD, consoante documento de f. 101 e verso, não abrange a totalidade dos bens.

Feitas essas considerações, a cassação da r. sentença é medida que se impõe, visto que não observadas as disposições legais aplicáveis à espécie.

Posto isso, dou provimento ao recurso para cassar a r. sentença de f. 233/234, determinando o retorno dos autos à instância de origem para que, observada a questão atinente à regularidade fiscal e, ainda, procedida a avaliação de todos os bens do espólio, seja determinada a partilha dos bens de forma individualizada, atendendo-se, assim, ao interesse de todos os herdeiros.

Custas, ao final.

Votaram de acordo com o Relator os Desembargadores Silas Vieira e Dídimo Inocêncio de Paula.

Súmula – DERAM PROVIMENTO.

 

Fonte: Diário do Judiciário Eletrônico – MG