Jurisprudência mineira – Apelação – Partilha da morada em comum – Propriedade do ex-cônjuge – Não comprovação – Procedência

APELAÇÃO – PARTILHA DA MORADA EM COMUM – PROPRIEDADE DO EX-CÔNJUGE – NÃO COMPROVAÇÃO – PROCEDÊNCIA


– Não é possível partilhar construção realizada em solo alheio, à míngua de direito à meação sobre imóvel pertencente a estranhos ao regime matrimonial.


Apelação Cível nº 1.0153.10.005591-9/001 – Comarca de Cataguases – Apelante: I.C.P. – Apelado: J.C.P.


ACÓRDÃO


Vistos etc., acorda, em Turma, a 8ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em dar provimento.


Belo Horizonte, 12 de agosto de 2014. – Rogério Coutinho – Relator.


NOTAS TAQUIGRÁFICAS


DES. ROGÉRIO COUTINHO – 1 – Trata-se de recurso de apelação interposto por I.C.P. contra sentença que julgou procedente o pedido de partilha postulado por J.C.P.


Em suas razões recursais, pretende a apelante a reforma da decisão, ao argumento de que a casa de morada do casal não pode ser partilhada, já que é bem sujeito ao regime de condomínio. Adicionalmente, sustenta que sequer foi averbada, no registro imobiliário, a construção objeto de partilha, bem como não foi considerada a existência de benfeitorias no local, das quais não se beneficia o apelado (f. 144/147).


Contrarrazões apresentadas (f. 150/152).


A Procuradoria-Geral de Justiça manifestou-se pela desnecessidade de intervenção no feito (f. 158).


É o relatório.


2 – Cinge-se a controvérsia à possibilidade, ou não, da partilha da casa do casal, edificada sobre o lote de 275m2, na Avenida Olinto Almada, 180, na cidade de Astolfo Dutra (f. 124).


É certo que o regime de casamento obedece à legislação vigente ao tempo da celebração do matrimônio.


Considerando que as partes contraíram núpcias em 03.01.1970, pelo regime legal vigente à época – comunhão universal de bens -, devem ser aplicadas as regras do Código Civil de 1916 (f. 07).


Nesse sentido, permito-me citar os arts. 262 e 263 do Código Civil de 1916:


"Art. 262. O regime da comunhão universal importa a comunicação de todos os bens presentes e futuros dos cônjuges e suas dívidas passivas, com as exceções dos artigos seguintes.


Art. 263. São excluídos da comunhão: (Redação dada pela Lei nº 4.121, de 1962).


[…]


XI – Os bens da herança necessária, a que se impuser a cláusula de incomunicabilidade (art. 1.723); (Redação dada pela Lei nº 4.121, de 1962)”.


Com efeito, no regime de comunhão universal de bens, integra a meação todo o acervo patrimonial, ou seja, bens particulares de ambos os cônjuges e os adquiridos, a qualquer título, preexistentes ou não ao casamento.


Assim, pode-se dizer que, mesmo que um dos cônjuges nada tenha trazido ou mesmo adquirido durante o casamento, ainda assim faz jus à metade ideal de todo o patrimônio em comum.


Conforme certidão do Cartório de Registro de Imóveis de f. 85, coube à apelante, quando do inventário,


"[…] a área medindo 511m2 mais ou menos, com benfeitorias correspondentes a 1 lote com 10,30m na frente, 10,15m de fundos por 50,00m de extensão da frente aos da frente aos fundos (sic) confrontando, pela frente, com a Avenida Beira Linha Férrea, fundos com uma rua, e pelos lados, com Sebastião Dini e Ogênio Martins, av., por Cr$7.500,00. 


Coube a cada um dos herdeiros: da área de terras com 254m2, correspondentes a 1 lote que mede 10,15 de frente, 10,20 (dez metros e vinte centímetros), nos fundos por 25,00m de extensão da frente aos fundos pela frente com terrenos do de cujus, e Sebastião Dini, área esta onde está construída uma casa de morada, assoalhada e coberta de telhas com nove cômodos, av. por Cr$15.000,00 somente uma quota-parte correspondente a 1/3, por Cr$5.000,00, para cada um, situado em Astolfo Dutra, Bairro Nossa Senhora de Fátima, ex-Fazenda Boa Vista, por Formal de Partilha em Inventário, de 28/04/71, sentença de 09/03/71 […] no valor de Cr$22.500,00 (vinte e dois mil e quinhentos cruzeiros). Sem condição ou averbação" (sic).


Da análise detida dos autos, depreende-se que a casa que se pretende partilhar foi, na verdade, edificada na área correspondente a 254m2 (transcrição de nº 20.545), e pertence aos herdeiros do falecido cônjuge da apelante, conforme consta do processo de inventário, esboço de partilha, em conjunto com a certidão de registro juntada aos autos (f. 38, 40, 60/62 e 85). 


Ao contrário do decidido pela Juíza de primeiro grau, tais documentos evidenciam que a apelante adquiriu, em virtude de meação e por ocasião do processo de inventário, somente a propriedade da área de 511m2, referente à transcrição de nº 22.374, a qual não é o objeto desta lide.


De fato, o registro imobiliário de f. 124 corrobora que a área de 511m2 é de propriedade da apelante, embora não revele os donos do terreno onde está edificada a casa que se pretende dividir.


Aparentemente, conquanto não tenha havido efetivamente registro, tudo leva a crer que, consoante o esboço de partilha, o terreno em que está edificado o imóvel objeto da lide foi destinado aos três herdeiros da apelante.


Nesse passo, o art. 1.255 do Código Civil é claro ao prever que o proprietário da área adquire as benfeitorias e acessões nela edificadas.


Por essa razão, a sentença merece ser reformada, já que não é possível partilhar construção realizada em solo alheio, à míngua de direito à meação sobre imóvel pertencente a estranhos ao regime matrimonial.


Caso tenha procedido de boa-fé, cabe ao autor, em ação própria, pleitear apenas indenização pela acessão, não havendo que se falar em partilha.


3 – Assim, dou provimento ao recurso.


Custas, pelo apelado, isento.


Votaram de acordo com o Relator os Desembargadores Edgard Penna Amorim e Teresa Cristina da Cunha Peixoto.


Súmula – DERAM PROVIMENTO.

 

Fonte: Diário do Judiciário Eletrônico – MG