O projeto do novo CPC pode ir à sanção presidencial ainda este ano, informa o Senado. O substitutivo da Câmara ( PLS 166/10) será votado na quinta-feira, 4, pela comissão temporária que trata do tema. Depois, irá a plenário para decisão final.
Por essa razão, a expectativa é de que a matéria seja aprovada e encaminhada à sanção presidencial ainda antes do recesso parlamentar. O presidente do Senado, Renan Calheiros, já havia confirmado o projeto na pauta prioritária do plenário no retorno das atividades após as eleições.
Com 1.069 artigos, o novo texto traz normas que buscam simplificar os processos e agilizar o julgamento das ações cíveis, inclusive inibindo recursos que servem para protelar as decisões judiciais. Também estimula a solução consensual dos conflitos levados ao Judiciário, já envolvendo alto grau de consenso.
Elaborado pelo senador Vital do Rêgo, o relatório sobre a matéria foi apresentado na semana passada, pela aprovação do substitutivo, com ajustes. Depois, o presidente da comissão temporária, José Pimentel, concedeu vista coletiva ao texto. O relator conservou a maior parte das inovações introduzidas pela Câmara.
Garantia de direitos
Vital destaca no relatório a importância das normas do processo civil para a concretização de direitos fundamentais, entre esses os da personalidade, da propriedade e da dignidade da pessoa. Ele observa que é por meio do processo que os direitos deixam "o plano das ideias para ingressar no mundo real".
"O processo é a ponte que os injustiçados podem atravessar para encontrar a concretização da Justiça."
Vital do Rêgo ainda assinalou o envolvimento de vastos setores da sociedade civil durante o processo de elaboração e discussão da matéria. Desde o início, foram realizadas audiências públicas e coletadas sugestões por meio eletrônico, entre outras formas de consulta. Ele também registrou que o trabalho deve resultar no primeiro CPC nascido em regime verdadeiramente democrático no país.
Um dos códigos antecedentes foi adotado durante o Estado Novo, na ditadura Vargas. O texto vigente, de 1973, nasceu no regime militar, por obra do então ministro da Justiça Alfredo Buzaid, durante o governo do general Garrastazu Médici.
Centros Judiciários
A comissão temporária recebeu 186 emendas ao substitutivo. Nessa fase, só podiam ser sugeridos ajustes de redação ou supressão de modificações ou acréscimos feitos pelos deputados, com restauração do texto original do Senado, caso houvesse. No final, o relator conservou a maior parte das inovações introduzidas pela Câmara, caso da criação de centros judiciários de solução consensual de conflitos.
De acordo com o substitutivo, sempre haverá uma fase prévia de conciliação e mediação entre as partes, por meio dos centros judiciários, dotados de profissionais especializados em técnicas de conciliação e mediação. O projeto do Senado autorizava a adoção de meios de conciliação e mediação, mas sem definir como obrigatória a fase inicial para que as partes tentassem acordo.
Demandas repetitivas
Outra forma de destravar a Justiça é um instrumento destinado a solucionar demandas repetitivas, com centenas ou milhares de causas semelhantes, situação comum na área previdenciária e de direitos do consumidor. Nesse caso, o texto prevê a possibilidade de instauração do chamado "incidente de resolução de demandas repetitivas", por meio de pedido perante Tribunal Estadual ou Tribunal Regional Federal, como esclarece Carlos Eduardo Elias de Oliveira, consultor do Senado.
"Os juízes de primeiro grau deixarão os processos suspensos até julgamento do incidente, quando o respectivo tribunal fixará uma orientação aplicável a todos os feitos."
Já previsto no texto original, o instrumento recebeu aperfeiçoamento da Câmara mantido no relatório de Vital do Rêgo. Para maior efetividade das decisões, quando se tratar de incidente relativo a prestação de serviço concedido pelo poder público, o resultado do julgamento será comunicado ao órgão ou agência reguladora competente, para que fiscalize o efetivo cumprimento da decisão.
Recursos protelatórios
O consultor esclarece ainda que o relatório, para restringir iniciativas protelatórias, "prestigiou" o acesso ao recurso único. Na prática, promoveu o retorno da versão original do Senado, para restringir as hipóteses de cabimento do "agravo de instrumento", normalmente utilizado contra decisões do juiz não relacionadas ao pedido principal da ação, mas sim a respeito de "questões incidentais", como a admissibilidade de provas e suspensão de prazos. Assim, essas decisões (chamadas interlocutórias) só poderão ser impugnadas em um futuro recurso de apelação contra a sentença.
Como explica ainda o consultor, o manejo de recursos desnecessários é ainda desestimulado com a possibilidade de o Judiciário aplicar multas a quem buscar se servir desses instrumentos com intenção meramente procrastinatória. Além disso, a parte que apelar ficará sujeita ao pagamento de honorários de advogado do lado contrário quando a decisão sobre o recurso for desfavorável, e não somente se vier a perder o processo.
Negociação final
Mesmo reconhecendo que o senador Vital do Rêgo manteve a estrutura do substitutivo, o deputado Paulo Teixeira, que relatou o projeto na Câmara, ainda pretende negociar com membros da comissão temporária o aproveitamento de alguns dispositivos da Câmara que ficaram de fora. Uma reunião ficou marcada para quarta-feira, 3, à tarde, no Senado.
Paulo Teixeira menciona, por exemplo, a necessidade de ampliação das hipóteses de acesso aos agravos de instrumento. Mas destaca, principalmente, a importância da restauração de mecanismo que assegura competência ao juiz para converter uma ação individual em coletiva.
Essa conversão poderia ocorrer quando a causa tiver repercussão além do interesse pessoal do autor. Como exemplo, o deputado cita um pedido para anulação de assembleia de uma sociedade anônima ou numa denúncia sobre poluição ambiental. Ele observa que o mecanismo já existe na legislação processual de outros países, podendo ser um instrumento de pacificação de interesses que pode contribuir para reduzir o volume de processos.
Penhora
O deputado festejou, por outro lado, a decisão de Vital do Rêgo de restaurar o mecanismo que permite a penhora de contas e investimentos em caráter provisório, já existente no código atual e que estava no texto do projeto que foi à Câmara. Os deputados acataram emenda que proibia a retirada dos recursos do devedor, alegando que os juízes praticam abusos. O dinheiro só poderia ser retirado depois de sentença.
Voto vencido na Câmara, Paulo Teixeira disse que a emenda iria deixar campo livre para que os maus devedores esvaziassem suas contas para fugir da obrigação de pagar. Para Vital do Rêgo, esse risco não poderia ser menosprezado. Ele argumentou que o credor merece contar com a celeridade e as garantias necessárias à preservação de seus direitos.
Fonte: Migalhas