São Luís (Maranhão) – Realizado na última sexta-feira (01.06), na cidade de São Luís do Maranhão, o 2º Seminário Nacional do Registro Civil 2018 Arpen-Brasil teve como principal foco debater as mudanças introduzidas com a publicação dos Provimentos nº 62 e 63 da Corregedoria Nacional de Justiça (CNJ), além da importância da Lei 13.484/2017, que torna os cartórios de registro civil em ofícios da cidadania.
Ministrada pelo assessor jurídico do Instituto de Registro Civil de Pessoas Naturais do Paraná (Irpen/PR), Fernando Abreu Costa Junior, a primeira palestra do Seminário abordou as mudanças trazidas com a publicação do Provimento nº 63 da Corregedoria Nacional de Justiça (CNJ) – que institui modelos únicos de certidão de nascimento, de casamento e de óbito; dispôs sobre o reconhecimento voluntário e a averbação da paternidade e maternidade socioafetiva; e sobre o registro de nascimento e emissão da respectiva certidão dos filhos havidos por reprodução assistida.
A multiparentalidade, por meio do reconhecimento da paternidade e/ou maternidade socioafetiva, foi tema de grandes questionamentos da plateia presente, em especial, com relação à caracterização da socioafetividade.
“A lei não traz uma definição prática do que configura a socioafetividade, o que gera muitos questionamentos. Por exemplo, para um recém-nascido de até cinco meses. Eu posso reconhecer uma paternidade socioafetiva? Quais são os limites para que se configure socioafetividade?”, questionou o presidente da Arpen-MA, Devanir Garcia.
“Com relação a esses limites, evidentemente, vocês vão ter que atuar com bom senso. Porque é importante fugir da adoção à brasileira. No caso citado, por exemplo, como se cria laços de afetividade com uma criança de cinco meses? Cadê a reciprocidade? Então, é preciso ter bom senso. O Estado está delegando uma competência aos cartórios de extrema importância, então, se surgirem dúvidas, vocês não devem fazer. E se a pessoa insistir, vocês encaminham para o juiz, fundamentando os motivos que fizeram negar o reconhecimento”, respondeu Costa.
Outro questionamento levantado foi sobre como realizar a inclusão de um pai biológico quando a criança já contém em sua certidão um pai registral, que é socioafetivo. “Temos um caso complicado em meu cartório… O João foi registrado no nome do Antônio, que era o marido de sua mãe na época em que ele nasceu. O Antônio sabia que não era o pai biológico do João, mas o registrou como sendo. Já adulto, o João conheceu seu pai biológico, o Francisco, com quem criou laços afetivos. E agora, após a realização de um exame de DNA particular e sabendo da possibilidade da dupla paternidade, o João quer incluir na sua certidão o nome do Francisco, mas sem excluir o nome do Antônio. Como proceder em casos como este?”, questionou uma titular na plateia.
“Para este caso, existem duas possibilidades: uma judicial, que ele explica toda essa história ao juiz e caberia a ele resolver essa situação; e a segunda é a de colocar o pai biológico como pai socioafetivo. Porque, apesar deles terem feito um DNA, ele não foi feito judicialmente, então, para efeitos judiciais o pai que se encontra hoje como pai registral, é o biológico. E esse segundo pai seria, então, socioafetivo. Porque para se inverter a situação, colocando o pai biológico como registral e o de adoção como afetivo, só judicialmente. O titular do cartório não tem o poder judicial de inverter essa ordem na certidão”, disse Costa.
O assessor jurídico do Irpen-PR ainda tratou sobre a forma unilateral que deve ser feito o reconhecimento socioafetivo. Segundo ele, após posicionamento da Corregedoria Nacional de Justiça, a Arpen-Brasil divulgou nota oficial esclarecendo que no registro será possível no máximo dois pais e duas mães, sendo quatro no total, não podendo ser três pais e uma mãe, nem três mães e um pai; e que não se pode fazer o reconhecimento paterno e materno simultaneamente, devendo um dos pais ou uma das mães serem registrais.
“Conversei com o juiz auxiliar da Corregedoria Nacional de Justiça, o doutor Marcio Evangelista, sobre o porquê dessa decisão, e ele me explicou que é para que as pessoas não sejam obrigadas a reconhecer uma paternidade e/ou maternidade socioafetiva inexistente. Ou seja, um cônjuge obrigando o outro. Então, para evitar situações como essa, foi colocada à norma no Provimento”, concluiu Costa.
Ofício da Cidadania
A segunda palestra do dia foi ministrada pelo advogado e ex-presidente do Instituto de Promoção e Defesa do Cidadão e Consumidor do Maranhão (Procon-MA), Hildélis Silva Duarte Junior. Com o tema “Identidade no RCPN”, a apresentação teve como foco mostrar a necessidade de se levar mais serviço públicos de emissão de documentos básicos para todas as regiões do País.
Enfatizando a importância dos cartórios neste processo, Duarte Junior afirmou considerar de extrema importância a Lei 13.484/2017 – que permite que cartórios de registro civil prestassem serviços por meio de convênios com órgãos públicos e entidades interessadas. Segundo ele, o Ofício da Cidadania é um dos elementos garantidores de políticas públicas de cidadania, em especial, pela confiança da população nos cartórios.
“Considero essa lei de extrema importância e sou totalmente favorável a ela. A ideia dos cartórios de registro civil ajudarem na emissão de documentos como RG, passaporte e carteira de trabalho, é fantástica. Porque existem pessoas esperando dias, tendo que viajar para outros municípios para conseguir ter o seu RG, que é um documento básico. E levar esse serviço para a população não é favor, é garantir os direitos previstos a Constituição”, disse.
Para exemplificar a importância de projetos como este, Duarte citou a ampliação das unidades de atendimento do Viva – projeto do Procon-MA que leva para munícipios do interior serviços básicos de emissão de documentos – durante a sua gestão no órgão.
“Hoje o Estado do Maranhão possui 50 unidades de atendimento do Viva. Mesmo assim, ainda existem pessoas que não conseguem ser atendidas em suas cidades. Precisamos de mais Vivas? Claro que sim. É necessário que todos os 217 munícipios do Estado tenham postos para emissão de carteira de identidade. Mas não precisam ser apenas unidades do Viva, os cartórios também podem ajudar na emissão desse e de outros documentos. Estaríamos descentralizando o serviço e criando mais postos de atendimento para a população. Por isso, o Ofício da Cidadania é importante”, disse.
Ao final da palestra, o ex-presidente do Procon-MA foi questionado sobre os motivos do Registro Geral (RG) emitido no Maranhão não possuir a identificação do cartório. De acordo com os presentes, apesar da Lei Federal nº 7.116/1983 – que assegura validade nacional as Carteiras de Identidade e regula sua expedição – determinar que a carteira de identidade contenha a identificação do cartório, os documentos do Estado não trazem a informação, ao contrário de carteiras emitidas em Estados como o Paraná.
“O que acontece no Maranhão, é que a informação que consta do assento é incompleta. Porque livros, folhas e número podem coincidir com outros Estados. Por isso da importância de se inserir o cartório”, explicou o presidente da Arpen-MA, Devanir Garcia.
“Sendo uma Lei Federal, que é válida para todo território nacional, vale um questionamento ao Instituto de Identificação do Maranhão, que é o órgão responsável pelo serviço. Vou fazer um questionamento formal ao órgão porque se está faltando uma informação, eles vão fazer uma modificação”, garantiu Duarte Junior.
Apostilamento
Já no início da tarde, a servidora pública Carla Kantek ministrou palestra sobre as mudanças trazidas no ato do apostilamento realizados dentro dos cartórios extrajudiciais. Fazendo um breve histórico sobre como o Brasil se tornou signatário da Convenção de Haia, a palestrante mostrou que nos últimos três anos foram publicados cinco normativas para tratar do tema, sendo o Provimento 62/2017 da Corregedoria Nacional de Justiça (CNJ) a legislação que regula atualmente esse procedimento dentro dos cartórios.
“O apostilamento era feito pelo Ministério das Relações Exteriores, mas foi delegado ao Poder Judiciário, que delegou aos cartórios extrajudiciais. Com a delegação para as serventias extrajudiciais, o CNJ regulamentou a matéria por meio de Provimento. E o Provimento 62, que foi publicado no fim do ano passado, está regulamentando de novo a matéria, fazendo alguns ajustes, para que as pessoas confiem mais nos documentos emitidos no Brasil”, disse.
Entre as principais mudanças trazidas com a última determinação da Corregedoria Nacional de Justiça, Carla destacou a inclusão de diplomas escolares reconhecidos pelo Ministério da Educação (MEC), na lista de documentos que podem ser apostilados; e a determinação de que cada natureza de cartórios só realize o apostilamento de documentos de sua própria competência. Por conta desta determinação, algumas pessoas expressaram sua dúvida com relação ao apostilamento de documentos que não são gerados dentro de cartórios, como é o caso de diplomas escolares.
“No caso dos diplomas, como se tratam de documentos particulares, qualquer natureza de cartório pode realizar o apostilamento. A norma da competência é válida para aqueles documentos que são gerados dentro dos cartórios”, explicou Carla.
Outro questionamento sobre o tema foi com relação à possibilidade de apostilar a cópia autenticada de um diploma escolar, já que tais documentos são utilizados para envio em universidades do exterior, e nem sempre, o interessado deseja enviar o documento original para outro país.“O que precisa checar, nesses casos, é se a universidade vai aceitar. Porque no diploma original, você vai atestar a autenticidade do reitor; mas na cópia, você está apostilando o ato público e não o documento. Ou seja, está autenticando a autenticidade do signatário que autenticou o documento e não de quem assinou o documento. Então, é importante se atentar para o que estamos apostilando, se é a autenticação ou o documento em si”, explicou.
CRC Nacional
O encerramento 2º Seminário Nacional do Registro Civil 2018 Arpen-Brasil ficou por conta do supervisor da CRC Nacional, Humberto Briones, que realizou um treinamento prático sobre como utilizar a Central de Informações do Registro Civil (CRC Nacional).
Durante o treinamento, a plateia sugeriu algumas mudanças na Central, como o desenvolvimento de um sistema que consiga ser utilizado com serviço de internet abaixo de 10MB e a possibilidade de se utilizar o certificado A1.
“No caso dos certificados, essa não é uma determinação nossa. É uma exigência da Corregedoria e do CNJ. Porque eles consideram que o certificado A1 não é seguro. E eles só autorizaram a liberar a CRC com o certificado A3. Eles têm medo do oficial colocar o certificado no nome dele e qualquer escrevente acessar, o que tornaria a Central insegura. Mais ainda por conta da geração de CPF. O que poderia gerar fraudes”, explicou Briones.
Uma possível mudança no modo de envio da comunicação de pedidos entre as serventias também foi solicitada. “O Provimento da Corregedoria torna obrigatória à utilização da CRC e dispensa o uso de malote, em função da obrigatoriedade da utilização da CRC. Então, se o camarada não acessa a CRC, esse é um problema dele e não meu. Eu não deveria ser impedido de enviar comunicação para ele. Ele que arque com as consequências”, questionou um titular na plateia.
“Está sendo instalado um comitê em cada Estado da CRC Nacional para que todas as decisões dentro da Central sejam debatidas em conjunto. Mas considero essa sugestão extremamente válida porque pode forçar os cartórios que não estão acessando a CRC a utilizarem. Como presidente da Arpen-Brasil, recebo essa sugestão e vou conversar com sobre o tema”, disse Arion Cavalheiro.
Para encerrar o treinamento, o presidente da Arpen-MA, Devanir Garcia; e o presidente da Arpen-Brasil, Arion Cavalheiro, voltaram ao palco para realizarem a assinatura do termo de adesão da Arpen-MA a Central de Registro Civil Nacional (CRC Nacional).
Fonte: Arpen/BR