Reconhecido direito de Ajudante de Cartório ocupar titularidade de Registro de Imóveis

Considerando princípios da segurança jurídica e da boa-fé, a 3ª Câmara Cível do TJRS reconheceu a legalidade de ato administrativo, publicado em 15/8/1994, que efetivou Ajudante de Cartório como titular do Registro de Imóveis da Comarca de Novo Hamburgo sem a realização de concurso público. Conforme o Colegiado, a decisão administrativa seguiu entendimento pacificado à época quanto ao direito adquirido, assegurando aos substitutos das serventias extrajudiciais a efetivação como titular do cartório quando da vacância do cargo, preenchidos alguns requisitos (confira abaixo).

A servidora tomou posse como Ajudante do Cartório em 21/1/75 e após 18 anos, em 1994, recebeu a delegação do Presidente do TJRS à época. Ela apelou da sentença que julgou procedente a ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público para anular esse ato administrativo, já tendo decorrido 10 anos e quatro meses de sua designação. O MP ingressou com o processo em 30/12/04, alegando que o boletim é posterior à promulgação da Constituição Federal de 1988, que exige a realização de concurso público de provas e títulos para o ingresso na atividade notarial e de registro.

Legalidade

O relator do recurso, Desembargador Nelson Antonio Monteiro Pacheco, salientou que a designação da servidora como titular do cartório foi em consonância a Constituição Federal de 1967, com redação conferida pela Emenda Constitucional nº 22/82. Conforme os dispositivos, o substituto de serventia extrajudicial ocuparia a titularidade da mesma, quando da vacância, desde que contassem com cinco anos de exercício nessa condição na serventia até 31/12/83.

Na avaliação do magistrado, o fato de a vacância ter ocorrido em 6/7/94, posterior à promulgação da atual Carta Magna, “não retira o direito adquirido, de acordo com o entendimento que vigorava à época.” Destacou que nova lei não pode prejudicar essa garantia. “É a primazia do princípio da legalidade que está em discussão.”

Segurança jurídica

Ressaltou que não é aceitável determinar a abertura de vacância e realização de concurso no caso, diante da segurança jurídica e da tutela da boa-fé decorrente do ato jurídico-administrativo baixado há mais de 14 anos. Acaso mantida a sentença, frisou, terminaria por gerar inúmeros prejuízos à servidora, bem como à comunidade de Novo Hamburgo em razão dos inúmeros registros firmados pela apelante por tanto tempo.

No caso, afirmou, a alta Administração do Tribunal de Justiça à época seguiu entendimento de que havia boa-fé da apelante, que recebeu a delegação e já a exercitou por 18 anos. “Não está havendo aqui atentado contra a aplicação da venire contra factum proprium na relação de direito público estabelecida entre o Estado e a delgatária do serviço de Registro de Imóveis da Comarca de Novo Hamburgo?”

Reconheceu, ainda, estar prescrito o direito da ação, que deveria ter sido promovida no prazo de cinco anos a contar da publicação do ato, ocorrido em 15/8/94. O MP ajuizou a demanda em 30/12/04, ou seja, 10 anos e quatro meses após, configurando-se a prescrição qüinqüenal.

Votos

O Desembargador Paulo de Tarso Vieira Sanseverino votou de acordo com o relator.

Acompanhando o mesmo entendimento, a Desembargadora Matilde Chabar Maia, destacou que a manutenção da sentença para cumprir a nova ordem constitucional, “vai de encontro aos princípios da segurança jurídica e da tutela da boa-fé decorrente do ato jurídico-administrativo baixado há mais de catorze anos, situação de fato e de direito que não se poderá simplesmente arredar sob o apanágio da estrita legalidade.”

Para a magistrada, o princípio da confiança impõe que atos administrativos nulos ou anuláveis sejam estabilizados, decorrido certo lapso de tempo “que não se confunde com o de decadência do poder de invalidar, desde que se reconheça a boa-fé do beneficiário e o ato se baseie em algum princípio de direito.”

Ressaltou, ainda, que no exame da legalidade é preciso respeitar os princípios norteadores do ordenamento jurídico. “A segurança jurídica e a boa-fé, como corolários do Estado Democrático de Direito (art. 1º da Constituição Federal de 1988), constituem-se no próprio conteúdo da legalidade.”

Proc. 70022969026

 

Fonte: TJRS