Serventia extrajudicial – titularidade. Oficial substituto. Direito adquirido. Concurso público

Acórdão STJ
Data: 6/6/2006 Fonte: 13.379 Localidade: Minas Gerais
Relator: Laurita Vaz
Legislação: Leis n.ºs 8.935⁄94 e 12.919⁄98; entre outras.

Ementa:

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CARTÓRIO. SERVENTUÁRIO SUBSTITUTO. EFETIVAÇÃO NA TITULARIDADE DA SERVENTIA. NÃO-OCORRÊNCIA. CARÁTER PRECÁRIO. DIREITO LÍQUIDO E CERTO NÃO EVIDENCIADO. PLEITO DE NULIDADE DE EDITAL DE CONCURSO. AUSÊNCIA DE LEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM. 1. Conquanto a designação para o exercício cumulativo das mencionadas serventias tenha ocorrido anteriormente à Constituição de 1988, é nítido o caráter precário no que diz respeito ao Cartório de Registro de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas e o Tabelionato de Protestos de Nova Resende⁄MG , na medida em que o Recorrente foi designado apenas para exercer as funções do cargo interinamente. 2. Uma vez verificada a situação de precariedade do Recorrente, diante dos termos da sua designação, tem-se por totalmente improcedente o pleito de exclusão do concurso do Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Conselheiro Pena, onde exerce – ou exercia à época da impetração – o cargo de Oficial. 3. Quanto às demais questões, relativas ao pedido de declaração de nulidade do Edital n.º 002/99, inclusive, sob a alegação de inconstitucionalidade das Leis n.ºs 8.935/94 e 12.919/98, não se vislumbra, nesse particular, a presença de uma das condições da ação, qual seja: a legitimidade, tendo em vista que o Recorrente não era candidato, nem demonstrou qualquer intenção em sê-lo, falecendo-lhe, pois, legitimidade ativa ad causam para impugnar, em sede de mandado de segurança, a nulidade do Edital n.º 002/99. 4. Recurso parcialmente conhecido e, nessa parte, desprovido.

Íntegra:

RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA Nº 13.379 – MG (2001⁄0084732-0)

RELATORA: MINISTRA LAURITA VAZ

RECORRENTE: CARLOS HENRIQUE FRANCA TEIXEIRA

ADVOGADO: EBER CARVALHO DE MELO E OUTROS

T. ORIGEM: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS

IMPETRADO: DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS

IMPETRADO: DESEMBARGADOR SEGUNDO VICE-PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS

RECORRIDO: ESTADO DE MINAS GERAIS

EMENTA

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CARTÓRIO. SERVENTUÁRIO SUBSTITUTO. EFETIVAÇÃO NA TITULARIDADE DA SERVENTIA. NÃO-OCORRÊNCIA. CARÁTER PRECÁRIO. DIREITO LÍQUIDO E CERTO NÃO EVIDENCIADO. PLEITO DE NULIDADE DE EDITAL DE CONCURSO. AUSÊNCIA DE LEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM.

1. Conquanto a designação para o exercício cumulativo das mencionadas serventias tenha ocorrido anteriormente à Constituição de 1988, é nítido o caráter precário no que diz respeito ao Cartório de Registro de Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas e o Tabelionato de Protestos de Nova Resende⁄MG, na medida em que o Recorrente foi designado apenas para exercer as funções do cargo interinamente.

2. Uma vez verificada a situação de precariedade do Recorrente, diante dos termos da sua designação, tem-se por totalmente improcedente o pleito de exclusão do concurso do Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Conselheiro Pena, onde exerce – ou exercia à época da impetração – o cargo de Oficial.

3. Quanto às demais questões, relativas ao pedido de declaração de nulidade do Edital n.º 002⁄99, inclusive, sob a alegação de inconstitucionalidade das Leis n.ºs 8.935⁄94 e 12.919⁄98, não se vislumbra, nesse particular, a presença de uma das condições da ação, qual seja: a legitimidade, tendo em vista que o Recorrente não era candidato, nem demonstrou qualquer intenção em sê-lo, falecendo-lhe, pois, legitimidade ativa ad causam para impugnar, em sede de mandado de segurança, a nulidade do Edital n.º 002⁄99.

4. Recurso parcialmente conhecido e, nessa parte, desprovido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da QUINTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer parcialmente do recurso e, nessa parte, negar-lhe provimento. Os Srs. Ministros Arnaldo Esteves Lima, Felix Fischer e Gilson Dipp votaram com a Sra. Ministra Relatora.

Brasília (DF), 06 de junho de 2006 (Data do Julgamento)

MINISTRA LAURITA VAZ

Relatora

RELATÓRIO

A EXMA. SRA. MINISTRA LAURITA VAZ:

Trata-se de recurso ordinário em mandado de segurança interposto por CARLOS HENRIQUE FRANÇA TEIXEIRA, com fundamento no art. 105, inciso II, alínea b, da Constituição Federal, em face do v. acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, ementado nos seguintes termos, in verbis:

“`ADMINISTRATIVO – SERVENTIAS NOTARIAIS E DE REGISTRO – VACÂNCIA – DELEGAÇÃO EM FAVOR DO SUBSTITUTO DO TITULAR QUE NÃO POSSUIR A ESTABILIDADE ASSEGURADA PELO ART. 19 DO ADCT DA CF⁄88. `Não se torna efetiva, em caso de vacância, a delegação dos serviços notariais e de registro em favor do substituto do titular, que não possua a estabilidade assegurada pelo art. 19 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição da República` (art. 66, § 2.º do ADCT da CEMGE) `” (fl. 151)

O Recorrente impetrou a presente ação mandamental a fim de anular o Edital n.º 02⁄99 – que visava ao provimento de vagas nas serventias notarias e de registro públicos, via concurso de ingresso -, sob a alegação de que responde pelo Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Conselheiro Pena, objeto do concurso juntamente com outras serventias.

Sustenta o Recorrente, em síntese, a nulidade do Edital n.º 002⁄99, aos argumentos de que:

(I) “a Lei Federal n.º 8.935⁄84 que veio regulamentar o art. 236 da Constituição Federal, não respeitou os ditames constitucionais visto que tal regulamentação deveria ser feita por Lei Complementar, não Ordinária […] Em conseqüência, a autorização de que fala o art. 18, da Lei 8.935, é inconstitucional, pois a própria lei está em desacordo” (fl. 194). Por essa razão, entende a Recorrente que a Lei Estadual n.º 12.919⁄98, que dispõe sobre o concurso de ingresso e remoção dos serviços notariais e de registro, não pode produzir nenhum efeito, na medida em que editada com base na mencionada autorização;

(II) “Tratando-se de apelo ordinário, mister se faz o prequestionamento dos temas controvertidos no presente recurso” (fl. 198), bem assim que, “face ao silêncio do r. acórdão, acerca de questões fundamentais no deslinde da causa, objeto de impugnação recursal expressa, impõe-se a sua cassação” (fl. 199);

(III) “o Recorrente recebeu a delegação do Poder Público, através da Portaria baixada pelo MM. Juiz de Direito, conforme fls. 48, para exercer as funções do cargo de Oficial, face à vacância ocorrida, de acordo com o art. 208, CF⁄67, com redação dada pela Emenda Constitucional n.º 22⁄82” (fl. 200), não se considerando, pois, vaga a serventia ante a ausência de ato de extinção, a qual não pode ser declarada por meio do Edital n.º 002⁄99;

(IV) operou-se a decadência do direito da Administração de anular seus próprios atos, conforme o disposto no art. 54 da Lei 9.784⁄99 e no art. 236, § 3.º, da CF⁄88;

Outrossim, alega a inobservância pelo Edital de Abertura do concurso do disposto na Lei Federal n.º 8.935⁄94, que exige a participação da OAB, do MP e da ANOREG na primeira fase do certame, além de ofensa ao princípio da isonomia e às garantias individuais, e ainda a necessidade da citação dos demais candidatos na qualidade de litisconsortes necessários, sob pena de nulidade do processo.

Pugna, ao final, pela concessão da segurança para determinar a formação do litisconsórcio, declarar a inconstitucionalidade das Leis n.ºs 8.935⁄94 e 12.919⁄98, a nulidade do Edital n.º 02⁄99, bem como a inexistência de vacância no Cartório de Registro de Imóveis de Conselheiro Pena, e ainda para excluir do concurso a referida serventia.

O Ministério Público Federal manifestou-se às fls. 247⁄251, pelo desprovimento do recurso.

É o relatório.

VOTO

A EXMA. SRA. MINISTRA LAURITA VAZ (Relatora):

De início, passo à análise da tese de decadência do direito da Administração de anular seus próprios atos por vícios de nulidade, tendo em vista que, segundo o Recorrente, houve o transcurso de mais de 5 (cinco) anos, desde a ocorrência da situação de irregularidade, tendo em vista o disposto no art. 236, § 3.º da Constituição Federal de 1988, que dispõe, in verbis:

“O ingresso na atividade notarial e de registro depende de concurso público de provas e títulos, não se permitindo que qualquer serventia fique vaga, sem abertura de concurso de provimento ou de remoção, por mais de seis meses”.

Desse modo, persistindo a situação de vacância na serventia por prazo superior aos 6 (seis) meses concedidos pela Constituição para sua regularização mediante provimento por concurso público, entende o Recorrente que estaria convalidada a eventual irregularidade de sua permanência no exercício do cargo, uma vez decorridos mais de 5 (cinco) anos, nos termos do disposto na Lei n.º 9.784⁄99.

Todavia, cabe esclarecer que, ao contrário do que busca demonstrar o Impetrante, das situações de irregularidade ou ilegalidade não pode advir nenhum direito, nem há espaço para convalidações.

Ademais, o aludido regramento somente tem o condão de demonstrar o estado de precariedade das serventias que permaneçam nessa situação além dos 6 (seis) meses da publicação da Carta Constitucional de 1988.

Por outro lado, ainda que incidisse in casu o prazo decadencial previsto no art. 54 da Lei n.º 9.784⁄99 – de 5 (cinco) anos para a anulação do ato administrativo -, cabe salientar que, a teor do entendimento consolidado tanto nesta Corte quanto no Supremo Tribunal Federal, o prazo qüinqüenal para a anulação começa a contar a partir da vigência do mencionado regramento. Desse modo, não restaria configurada a decadência.

Melhor sorte não socorre o Recorrente, no que diz respeito ao prequestionamento. Isso porque, cuidando-se de recurso ordinário, ao contrário do aduzido, não há necessidade do cumprimento desse pré-requisito para viabilizar o seu conhecimento.

Outrossim, insurge-se o Recorrente contra a inclusão do Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Conselheiro Pena no concurso público para provimento dos serviços notarias e registrais vagos, em cumprimento ao disposto no art. 236, § 3.º, da Constituição Federal de 1988, sob a alegação de que a referida serventia não se encontra vaga, sendo por ele exercido, a título efetivo.

Não obstante esta Corte Superior de Justiça, na esteira da orientação traçada pelo Excelso Pretório, tenha firmado entendimento no sentido de que o substituto de Serventia possui direito adquirido à efetivação na titularidade, nos termos do art. 208 da Constituição de 1967, com a redação da EC n.º 22⁄82, se a vacância do cargo tiver ocorrido antes do advento da atual Carta Constitucional, que previu, em seu art. 236, § 3º, a necessidade de prévia aprovação em concurso público para o ingresso na atividade notarial e de registro, a regra não tem aplicabilidade na hipótese sub examine.

Acerca da questão, são bastante elucidativos os seguintes trechos extraídos das informações prestadas pela Autoridade Impetrada, in verbis:

“Com efeito, é a própria inicial quem informa que o impetrante somente veio a exercer as funções de escrevente a partir de 05 de dezembro de 1985, e nessa situação permaneceu até que, aos 19 de setembro de 1987 foi designado para responder pela serventia na condição de Oficial interino.

É evidente, como se vê, que o impetrante não preenche os requisitos do art. 208 da Constituição Federal de 1967, que exige o adimplemento de 5 anos de exercício, como substituto, até 31.12.83.” (fl. 122; grifos acrescidos.)

Assim, uma vez verificada a situação de precariedade do Recorrente, diante dos termos da designação, acostada aos autos à fl. 48, tem-se por totalmente improcedente o pleito de exclusão da serventia do concurso, onde exerce – ou exercia à época da impetração – o cargo de Oficial.

Quanto às demais questões, relativas a existência de vícios de nulidade do Edital n.º 002⁄99, inclusive, sob a alegação de inconstitucionalidade das Leis n.ºs 8.935⁄94 e 12.919⁄98, não se vislumbra, nesse particular, a presença de uma das condições da ação, qual seja: a legitimidade.

Isso porque, não sendo o Impetrante candidato, nem tendo ele demonstrado qualquer intenção em sê-lo, falece-lhe legitimidade ativa ad causam para impugnar, em sede de mandado de segurança, a nulidade do Edital n.º 002⁄99.

A simples pretensão de permanecer no cargo até que sobrevenha concurso válido constitui interesse meramente indireto, não passível de ser tutelado pela via mandamental, sobretudo diante das informações da Autoridade Impetrada no sentido de que “não houve inscrições para o provimento da serventia pretendida na impetração donde o presente mandamus ter restado, ao que parece, prejudicado” (fl. 131), motivo pelo qual também não há razão para a formação de litisconsórcio.

Ante o exposto, CONHEÇO PARCIALMENTE do recurso e, nessa parte, NEGO-LHE PROVIMENTO.

É como voto.

MINISTRA LAURITA VAZ

Relatora

CERTIDÃO DE JULGAMENTO

QUINTA TURMA

Número Registro: 2001⁄0084732-0 / RMS 13379/MG

Número Origem: 1854124

PAUTA: 06⁄06⁄2006 – JULGADO: 06⁄06⁄2006

Relatora: Exma. Sra. Ministra LAURITA VAZ

Presidenta da Sessão: Exma. Sra. Ministra LAURITA VAZ

Subprocuradora-Geral da República: Exma. Sra. Dra. ÁUREA MARIA ETELVINA N. LUSTOSA PIERRE

Secretário: Bel. LAURO ROCHA REIS

AUTUAÇÃO

RECORRENTE: CARLOS HENRIQUE FRANCA TEIXEIRA

ADVOGADO: EBER CARVALHO DE MELO E OUTROS

T. ORIGEM: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS

IMPETRADO: DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS

IMPETRADO: DESEMBARGADOR SEGUNDO VICE PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS

RECORRIDO: ESTADO DE MINAS GERAIS

ASSUNTO: Administrativo – Cartório – Titularidade

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia QUINTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

“A Turma, por unanimidade, conheceu parcialmente do recurso e, nessa parte, negou-lhe provimento.”

Os Srs. Ministros Arnaldo Esteves Lima, Felix Fischer e Gilson Dipp votaram com a Sra. Ministra Relatora.

Brasília, 06 de junho de 2006

LAURO ROCHA REIS
Secretário

(DJ: 01.08.2006)