O casamento de vítima de estupro com terceiro não é garantia automática da extinção da punibilidade de condenados pelo crime em questão. Esse é o entendimento da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Os ministros negaram habeas-corpus a dois condenados por crime de estupro um deles namorado da vítima à época.
M.F. foi estuprada pelo então namorado ,V.D., e o amigo dele ,J.A.L., em fevereiro de 1994. Segundo a vítima, V.D. a convidou para uma festa nas proximidades da cidade onde moravam, no Estado de Santa Catarina. No percurso, o casal encontrou J.A.L. e ofereceu-lhe carona.
Com a desculpa de que um dos pneus do carro havia furado, V.D., que namorava M.F. há quase um ano, desceu do automóvel sendo seguido por M.F. e J.A.L. Em seguida, J.A.L. segurou a vítima para que V.D. praticasse o estupro. Depois foi a vez de V.D. segurar M.F. para J.A.L. cometer o crime.
Condenados a mais de 17 anos de reclusão, V.D. e J.A.L. entraram com habeas-corpus no STJ alegando a extinção da punibilidade do crime por eles cometido por causa do casamento da vítima com terceiro em 1995. A ação foi acolhida apenas em parte pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJ-SC) para conceder o arbitramento de honorários de advogado ao defensor dativo dos réus, ficando o pedido principal a declaração do fim à punição rejeitado. Por esse motivo, a defesa dos réus encaminhou habeas-corpus ao STJ.
Para justificar o pedido, o advogado dos réus informou que a vítima M.F. teria se casado com terceiro, fato que, de acordo com o Código Penal, representaria o fim da punibilidade. Segundo a defesa, no julgamento do pedido, o TJ-SC desconsiderou a certidão que comprovaria essa união da vítima.
No habeas-corpus, a defesa dos condenados também alegou não ter ocorrido violência física nem grave ameaça à vítima durante o delito de estupro ressaltando que M.F., em momento algum, teria demonstrado interesse em prosseguir com as investigações. O advogado de V.D. e J.A.L. ressaltou, ainda, que a vítima seria “mulher de vida fácil”.
Em seu voto, o relator do processo, ministro Gilson Dipp, afirmou estar comprovado, na decisão do TJ-SC, “que os crimes de estupro e atentado ao pudor contra a vítima M.F. foram praticados mediante violência real”. O ministro destacou trecho da decisão do TJ-SC, entendendo que “in casu (no caso), a violência foi comprovada pelas palavras dos apelantes e da própria vítima, demonstrando que, enquanto um dos acusados a segurava, o outro praticava o ato sem se preocupar se M.F. estava de acordo ou se sentindo bem, e esta afirmou que, para conseguirem satisfazer suas lascívias, os réus se utilizaram de força física”.
Para Gilson Dipp, se no ato do estupro houve violência física contra a vítima, como está comprovado no caso em questão, não se aplica “a hipótese de extinção da punibilidade prevista no inciso VIII do artigo 107 do Código Penal, a qual exige expressamente, além da ausência de violência ou grave ameaça à pessoa, o atendimento a outros requisitos igualmente não verificados na espécie”.