Estrangeiros condenados mas com filho brasileiro podem permanecer no Brasil desde que comprovada a dependência econômica da criança, apesar de o Estatuto do Estrangeiro (Lei n. 6.815/80), em seu artigo 75, parágrafo 1º, consignar que a concepção de filho posterior ao motivo da expulsão não constitui circunstância suficiente para impedir o referido ato expulsório. A conclusão é da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, ao conceder habeas-corpus ao norte-americano R.C.A. para permanecer em Fortaleza, Ceará, levando em consideração o interesse e bem-estar da criança, pois a expulsão dificultaria eventual cobrança de alimentos.
O norte-americano foi preso em agosto de 2002, por supostamente infringir artigos do Código Penal na cidade de Fortaleza, tendo sido apenado a seis anos de reclusão em regime semi-aberto. Um mandado de prisão preventiva para fins de extradição foi revogado em dezembro de 2004, alguns meses após R.C.A . ter recebido o benefício de progressão de regime para o aberto. Em março deste ano, no entanto, o ministro da Justiça assinou decreto de expulsão contra o norte-americano.
No pedido de habeas-corpus, a defesa alegou que, desde 2004, quando foi posto em liberdade, o estrangeiro vem tentando se ressocializar de modo honesto, prestando consultoria e ajudando outros como ele a investir na cidade. Pessoalmente, iniciou um relacionamento amoroso que dura até hoje, do qual resultou uma criança, comprovada como sua por meio do exame de DNA. Foram juntadas ao processo, ainda, declarações da companheira e da mãe desta de que o paciente é quem sustenta financeiramente a família.
A defesa sustentou, ainda, que ele não poderia nem deveria de ser expulso, pois isso destruiria a célula familiar, desestruturando três vidas. “Se o requerente for expulso, como ele se manteria nos EUA? Onde ficaria? Como chegaria para seus familiares que ele não vê e com quem praticamente não tem contato há quase 13 anos, pedindo ajuda? Como ficaria sua mulher, sozinha para manter a filha? Como ficaria o bebê, sem o apoio financeiro e o carinho do pai? Como conseguiria dinheiro para levar sua mulher e filha para os EUA? Como conseguiria viajar de volta para o Brasil se for expulso?”, questionou o advogado.
Ao defender a expulsão, a União argumentou que o paciente não está ao abrigo das excludentes de expulsão previstas no artigo 75 do Estatuto do Estrangeiro, pois não era, ao tempo do fato criminoso, casado com brasileira nem tinha prole nascida no país. “O envolvimento do estrangeiro com a nacional brasileira, mãe de sua filha, bem como o nascimento da menor, deu-se após o cometimento dos crimes que ensejaram a abertura do processo expulsório”, sustentou.
A Seção concedeu habeas-corpus para evitar a expulsão, entendendo que a proibição de expulsar estrangeiro que tenha filho brasileiro objetiva resguardar os interesses da criança, não apenas financeiramente, mas a sua proteção em sentido integral, inclusive com a garantia dos direitos à identidade, à convivência familiar, à assistência dos pais. “Embora tenha sido a filha concebida após o cometimento do crime que ensejou o processo expulsório, o artigo 75, II, “b”, da Lei n. 6.815/80 deve ser interpretado sistematicamente com as regras constitucionais de proteção à família e também com a observância dos interesses da menor nos termos do Estatuto da Criança e do Adolescente”, concluiu o relator, ministro Castro Meira.
Fonte: Diário de Notícias