Um guia para quem precisa fazer inventário

RIO – Não bastasse a dor de perder um ente querido, muitas vezes, a morte de um parente próximo ainda traz um desafio e tanto pela frente: o inventário. Mas, não tem jeito. Se há bens a serem partilhados, o inventário deve ser feito e é bom estar atento aos prazos, pois quem não der entrada no documento em até 60 dias após a morte do parente, pode estar sujeito a pagar multa (a ser definida pelo Estado).
 

O tema — um dos mais abordados pelos leitores do Morar Bem na seção de cartas de nosso caderno impresso (bem@oglobo.com.br) — é, sem dúvida, daqueles espinhosos em que cada caso precisa ser estudado cuidadosamente. Mas, com a ajuda do advogado Renato Anet, respondemos algumas das questões mais comuns que podem servir de guia a quem precisa dar entrada num processo. Confira:
 

– Como se dá entrada num processo de inventário? É possível fazer isso sozinho ou é necessário ter um advogado ou defensor público?
 

O inventário, via de regra, é processado através de ação judicial, no entanto, se não existir testamento, se todos os herdeiros forem capazes (capacidade civil) e concordes — isto é, estiverem de comum acordo quanto aos termos da partilha dos bens —, poderá ser processado através de escritura pública. Em qualquer das formas de processamento, será sempre necessária a atuação do advogado ou defensor público.
 

– É preciso pagar alguma taxa no início do processo? Há alguma forma de ser isento deste pagamento?
 

Quando o inventário for processado através de ação judicial, será preciso pagar custas e taxas processuais, que devem ser calculadas de acordo com as normas da corregedoria, variando a partir do valor total do montante de bens. Contudo, existe a possibilidade de isenção de tal pagamento e concessão do benefício da gratuidade de justiça nos termos da lei 1.060/1950, caso o requerente comprove não ter condições de arcar com as custas e taxas do processo sem prejuízo do sustento próprio ou de sua família. Já em relação ao inventário extrajudicial, é necessário pagar as custas e emolumentos do cartório de notas que fará a lavratura da escritura, que também serão calculadas de acordo com as normas da corregedoria, variando a partir do valor total do montante de bens. Quanto à isenção de tais pagamentos, também neste caso é possível que seja concedida, desde que o interessado seja assistido pela Defensoria Pública e apresente declaração no cartório, atestando a impossibilidade de pagar.
 

– Existe um prazo para se dar entrada num inventário?
 

De acordo com o artigo 983 do Código de Processo Civil, o processo de inventário deve ser aberto dentro de 60 dias a contar da abertura da sucessão (data de óbito). Caso tal prazo não seja respeitado, o Estado, competente pelo imposto de transmissão (ITDCM), instituirá multa pelo atraso.
 

– No geral, há um tempo médio para o inventário ficar pronto? O que pode atrasar ou postergar o fim do processo?
 

Os inventários processados através de escritura pública são normalmente bem mais céleres do que aqueles processados pela via de ação judicial. Na primeira hipótese, o tempo normalmente envolvido entre a abertura e encerramento é de três a seis meses. Já em relação ao inventário judicial, oscila entre um e três anos, sendo a demora normalmente relacionada à divergência entre os herdeiros quanto a partilha, avaliação dos bens e pagamento do imposto.
 

– Quem pode ser inventariante? Há algum tipo de documento específico para isso?
 

O artigo 990 do Código de Processo Civil, define expressamente quem pode ser nomeado inventariante. São eles: o cônjuge ou companheiro sobrevivente, desde que estivesse convivendo com o outro ao tempo da morte; o herdeiro que se achar na posse e administração do espólio, se não houver cônjuge ou companheiro sobrevivente ou estes não puderem ser nomeados; qualquer herdeiro, nenhum estando na posse e administração do espólio; o testamenteiro, se lhe foi confiada a administração do espólio ou toda a herança estiver distribuída em legados; o inventariante judicial, se houver; pessoa estranha idônea, onde não houver inventariante judicial. Nomeado o inventariante, este será intimado para assinar uma declaração de compromisso, da mesma forma que, quando o inventário for processado de forma extrajudicial, tal declaração também deve constar da escritura de partilha.
 

– É possível vender algum bem durante o processo de inventário? Qual a maneira correta de fazer essa negociação? Se houver vários herdeiros, todos devem devem estar cientes e concordar com a venda ou o inventariante tem liberdade para tomar essa decisão?
 

É possível que seja feita a venda de bens do inventário durante seu processamento, no entanto, isto se aplica somente ao inventário judicial. A venda deve ser feita sempre com autorização do juiz, mediante expedição de alvará de autorização de venda. De acordo com o artigo 992 do Código de Processo Civil, o pedido de alvará para venda somente será acolhido pelo juiz quando for feito pelo inventariante e ouvidos todos os herdeiros.
 

– Normalmente, as pessoas têm medo de comprar um imóvel em inventário. Há algum tipo de documento que possa ser feito pelo vendedor para garantir sua idoneidade?
 

A compra deve ser feita com as mesmas cautelas e providências adotadas na compra regular de um imóvel, devendo ser apurada, por exemplo, a existência de dívidas relativas ao imóvel, tais como IPTU e condomínio, sendo que, o único documento adicional que deve ser exigido é exatamente o alvará de autorização de venda expedido e assinado pelo juiz do inventário.
 

– E depois de efetuada a venda feita durante o inventário… se houver vários herdeiros, qual a forma correta de receber o pagamento? Ele sai em nome do espólio e é depositado em alguma conta para ser repartido ao fim do processo? Ou é pago ao inventariante que deve fazer essa divisão dos ganhos?
 

No caso de compra de bens extraídos de inventário em processamento, o pagamento deve ser feito sempre através de depósito judicial do valor integral, em uma conta judicial a favor do juízo do inventário. Qualquer que seja o número de herdeiros, este valor será destinado a quitação de dívidas dentro do inventário ou mesmo partilha aos herdeiros. Ficando tal responsabilidade a encargo do inventariante, sempre com autorização do juiz.
 

– É possível financiar, por bancos privados ou públicos, a compra de um imóvel em inventário?
 

Não existe nenhuma proibição. No entanto, por se tratar de uma transação não convencional, a burocracia das instituições para concessão do crédito poderá ser ainda maior.
 

– É possível calcular o quanto um imóvel se desvaloriza, em média, por estar em processo de inventário?
 

A situação prática é que no inventário o imóvel deve ser vendido, no mínimo, pelo valor que tiver sido avaliado no processo, sendo que, na maioria das vezes, entre a data da avaliação e a venda efetiva existe um lapso médio de um ano. Sendo assim, quando o imóvel é vendido, o valor da avaliação, muitas vezes, já está defasado.
 

– Que taxas são pagas quando o inventário é concluído?
 

Não existe nenhum pagamento adicional a ser feito dentro do processo, quando da conclusão do inventário. Por outro lado, podem existir custas e taxas a serem pagas nos Cartórios de Registro de Imóveis (RGI) para o registro do formal de partilha (documento final extraído do inventário).
 

– E ao vender um imóvel herdado… paga-se ou não ganho de capital (caso não haja nenhum motivo para isenção)?
 

Não há resposta definida para essa questão, porque a Receita Federal entende ser devido o imposto e normalmente formaliza a cobrança, ao passo que, o Judiciário vem se posicionando com o entendimento de que a cobrança é ilegal.

 

Fonte: O Globo