Violação dos princípios da moralidade na contratação de parente para atuar em cartório

O registrador e o notário exercem função pública e, portanto, suas atividades se subordinam a todos os princípios constitucionais do art. 37, caput, da Constituição Federal de 1988. O dispositivo  prevê que “a administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.”

Com estes argumentos, a 4ª Câmara Cível do TJRS decidiu anteontem (26) favoravelmente à apelação de Kátia Regina Flores de Almeida que ajuizou ação  popular contra o então titular (Reinaldo Antônio Welfer)  do Registro Civil da Comarca de São Borja que contratou como substituta a sua filha (Raquel Letícia Welfer Kirinus). “Não é possível os ocupantes destes cargos contratarem parentes, transformando o serviço registral em sinecura familiar, passível de sucessão universal, sem ofensa aos princípios da moralidade e da impessoalidade”, considerou o desembargador Araken de Assis, relator.

O juiz Darlan Elis de Borba e Rocha julgou improcedente a ação, entendendo que o registrador não sofre a limitação de não poder contratar parentes. Contra esta decisão, a autora recorreu ao TJRS. Durante a tramitação processual, o registrador faleceu. Como sucessoras processuais do réu Reinaldo, já falecido, foram habilitadas as filhas Loivia e a própria Raquel.

Para o relator, “os notários e os registradores desempenham, como visto, função pública, e não podem se estabelecer livremente”. E continua o desembargador Araken: “a unidade de competência que a lei lhes afeta, e na qual ingressam por concurso público, é criada por lei, entre o notário e o Estado se origina um vínculo institucional, que permite sua fiscalização“. Para o magistrado, o registrador é remunerado “à conta de receita pública, conforme leading case do STF (RE nº 178.236), ou seja, através de custas e emolumentos fixados em lei”.

Com o julgamento no TJRS, a ação popular foi declarada procedente. O contrato de trabalho entre pai e filha foi pronunciado nulo e tornada sem efeito a designação de Raquel como substituta do registro civil de São Borja, “para todos os efeitos legais, porque ato contrário à Constituição é lesivo à moralidade pública”, concluiu o relator.

Detalhe sui-generis é que a ré Loivia figura como sucessora de Reinaldo e sua investidura como registrada designada – posterior à morte do registrador, seu pai – não foi posta em causa na inicial. Com isso, a decisão tornou a designação da filha Raquel como substituta do Registro Civil de São Borja.

O advogado Iberê Athayde Teixeira atuou na defesa dos interesses da autora da ação. (Proc. nº 70020382214).

 

Fonte: Espaço Vital – 28.09.07