A criação de uma nova taxa obrigando o registro em cartório de cada contrato de financiamento de carros novos e usados, que iria gerar uma verba extra de R$ 31,2 milhões por mês para os cartórios de Minas Gerais, não é a única aberração do Projeto de Lei 2.706/08. Além da nova tarifa, proposta pelo deputado estadual Leonardo Moreira (filho do deputado federal Edmar Moreira, o dono do castelo de R$ 25 milhões em São João Nepomuceno, na Zona da Mata mineira), o dispositivo prevê também um “ajuste” nas tabelas de emolumentos.
Nesta semana, a proposta deve entrar em votação na Comissão de Fiscalização Financeira e Orçamentária, a última etapa antes de votação em plenário. Se for aprovada pela Assembleia Legislativa, a alteração pode elevar o custo de bater o carimbo em uma simples procuração dos atuais R$ 15 para R$ 22, o que corresponde a uma alta de 46%. Outra reivindicação que está em pauta é praticamente dobrar o valor do registro de um testamento, que passaria de R$ 153 para cerca de R$ 280.
Em sua defesa, os cartórios alegam no projeto que outros encargos vão baixar de preço, pela primeira vez na história. Mas basta uma análise criteriosa do texto para perceber que eles aceitam reduzir apenas os valores dos serviços deficitários que, por custarem caro demais, acabam espantando clientes. É o caso, por exemplo, da permissão para lavrar separação, inventário e divórcio em processos consensuais. Um divórcio pode custar mais de R$ 10 mil no cartório, já que há uma taxa de R$ 1,03 mil para cada imóvel da partilha. Para tentar tornar o serviço atrativo, portanto, os cartórios aceitaram, no projeto, cobrar um fixo de “apenas” R$ 2,4 mil para um total de partilha de até R$ 1,68 milhão. “Onde o cartório tem prejuízo, ele quer diminuir o preço. Onde tem lucro, quer aumentar”, diz uma fonte.
Nos bastidores, os representantes de cartórios estão receosos em relação ao rigor que será adotado pelo relator do projeto, deputado Juarez Távora (PV). Para quarta-feira, está sendo aguardada a apresentação do seu parecer perante a Comissão de Fiscalização Financeira e Orçamentária da Casa. “Não posso antecipar o meu parecer, mas minha tendência é não permitir nenhum aumento”, afirma o deputado, que pediu os comparativos de cada tabela praticada em Minas nos cartórios de notas, registro civil, registro de imóveis e protestos. Ele lembra que os preços das tarifas já foram corrigidos em 25% desde 2004 pelo índice autorizado em lei. Só no ano passado, a alta foi de 12%.
Távora quer saber também qual é a composição de custos de cada serviço oferecido. “O que explica um reconhecimento de firma sair a R$ 3,14 por folha se uma fotocópia não custa mais de R$ 0,10? Ao que parece, os cartórios lucram cerca de R$ 2 por folha e fornecem milhares delas por dia, em que pese a responsabilidade de se autenticar um documento”, compara ele, subtraindo do valor os descontos com Imposto de Renda, taxa de fiscalização judiciária e o repasse de 5,66% para compensação dos atos gratuitos de registro civil, como certidões de nascimento e de óbito. Esses documentos saem de graça para a população – mas são remunerados aos cartórios de registro civil por um fundo de compensação mantido pela arrecadação das taxas descontadas por eles próprios. Cada certidão de nascimento é coberta por um repasse de R$ 37,50, que os cartórios reivindicam reajustar no projeto para R$ 43,75 (20%).
“Existem de fato algumas distorções, como os grandes cartórios da 10 maiores cidades de Minas, que estão incluídos entre os 100 que ganham acima do normal. Mas os outros 2,9 mil lutam para viver com dignidade”, compara Ari Álvares Pires Neto, vice-presidente da Associação de Serventuários de Justiça e da Associação de Notários e Registradores de Minas Gerais (SERJUS/Anoreg/MG). Segundo Claudinei Turatti, diretor do Recivil (sindicato dos oficiais de registro civil), o projeto que está tramitando vai beneficiar os cerca de 400 cartórios em Minas que são deficitários. “É preciso evitar que esses cartórios fechem”, diz.
Fonte: Jornal Estado de Minas