Menina ganha nomes dos pais biológicos e afetivos na certidão

Aos 5 anos, uma garotinha ganhou uma nova certidão de nascimento, em Rio Pardo, distante cerca de 145 km de Porto Alegre. No documento, constam os nomes de quatro pais. O registro no cartório da cidade, obtido na última segunda-feira (18) pela família, une os nomes dos pais biológicos e os do casal que detém a guarda da criança.

 

Quem conta a história é Taís Riceli da Rocha Santos, soldado da Brigada Militar de 36 anos, que cuida da criança desde que ela tinha quatro meses de idade. Taís é tia de Leonardo, pai da menina, e junto com o marido, havia batizado a criança. “Ela foi passar uns dias lá em casa, e os pais optaram por entregá-la para mim”, conta a soldado, explicando que Leonardo e Suellen passavam por dificuldades.

 

“Não tínhamos essa ideia. Nós já temos uma filha, e o Sílvio já tem um casal de filhos”, conta Taís. A criança, porém, acabou ficando na casa da família. O próximo passo foi obter a guarda da menina, em um processo que se estendeu por dois anos.

 

O contato de criança com os pais biológicos, porém, nunca cessou. Todos moram perto. Suellen e Leonardo já não estão mais juntos, e a mãe biológica tem inclusive uma segunda filha. Taís explica que, por conta desse bom relacionamento entra as famílias, preferiu não ingressar na Justiça com um pedido de adoção justamente para não modificar os nomes dos pais da criança no documento oficial.

 

A menina compreende a situação, como explica Taís, e não há dias determinados para as visitas dos pais biológicos. “Ela diz que ama tanto a mãe Suellen quanto a mãe Taís”.

 

Documento verde

 

Certo dia, a garota pediu para a mãe que fizesse “o documento verde”. “Era o RG. Eu tenho o documento da guarda definitiva, e fui me informar sobre como poderíamos pedir o documento para ela”, diz Taís.

 

Foi então que ela ficou sabendo que poderia pedir uma nova certidão de nascimento, e que devido a uma nova normativa do Conselho Nacional de Justiça, seria possível incluir o nome dos quatro pais no documento.

 

Todos foram até o cartório, para firmar a nova certidão da garota. No dia anterior, Taís gravou um vídeo em que a filha fala que “iria nascer de novo”. “Eu ganhei uma filha hoje”, emocionou-se Sílvio, na ocasião.

 

No documento, Suellen e Leonardo constam como pais biológicos, e Taís e Sílvio, como pais afetivos.

 

“De padrinho, passei para pai-dindo. Depois, para guardião. E agora, sou pai”, conclui Sílvio Erasmo Souza da Silva, capitão da Brigada Militar e um dos pais da menina.

 

Provimento do CNJ possibilitou a inclusão

 

A inclusão dos quatro nomes na certidão da criança foi possível graças ao provimento 63, editado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) no ano passado, que reconheceu a filiação socioafetiva de forma extrajudicial, ou seja, sem precisar ser encaminhada por meio de um processo na Justiça. Conforme explica o presidente da Associação dos Registradores de Pessoas Naturais do RS, Arioste Schnoor, antes da nova norma, inclusões como as do documento da criança só podiam acontecer via judicial.

 

Trata-se de um direito a famílias recompostas, ou seja, casos em que os filhos são criados por outras pessoas que não os pais biológicos. O provimento faz constar tanto o nome dos pais naturais quanto os pais denominados socioafetivos. Todo o processo é feito junto ao cartório, que decide se defere ou interfere a solicitação.

 

Para ter direito ao reconhecimento, os interessados em ser pais socioafetivos têm que ter no mínimo 18 anos, e ser ao menos 16 anos mais velhos do que o filho que vai ser reconhecido.

 

O provimento define que irmãos, avós e demais ascendentes (bisavós, e assim por diante) não podem ser reconhecidos como pais socioafetivos. A mãe biológica precisa consentir, e se o filho tiver mais do que 12 anos, também precisará concordar com o reconhecimento socioafetivo.

 

Schnoor explica que a reivindicação deve partir dos pais socioafetivos, e uma vez deferida, é irrevogável, exceto por via judicial.

 

Para fazer o novo documento, os pais devem ir até o cartório de registro civil, preencher o requerimento elaborado pelo próprio CNJ, e levar a documentação de identidade da criança e dos pais. Pessoas em situação de carência não precisam pagar taxa. Para os demais, o valor gira em torno de R$ 70.

 

O novo documento dá direitos idênticos aos filhos naturais para os reconhecidos como filhos socioafetivos, em termos alimentícios, sucessivos e todos os demais. Schnoor explica, porém, que a inclusão dos nomes em documentos como carteira de trabalho, carteira de identidade ou passaporte dependem dos órgãos emissores.

 

 

Fonte: G1 (RS)