Para receber pensão por morte do ex-marido, uma mulher usou certidão de casamento inválida, sem a averbação do divórcio, e documentos pessoais em que ainda constava seu nome de casada. Com essa estratégia, recebeu benefício durante 11 meses do Instituto Nacional de Seguridade Social – INSS, mas acabou condenada por estelionato.
A Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região – TRF-5 manteve a condenação de forma unânime. A decisão negou provimento à apelação criminal da ré e confirmou sentença da 16ª Vara Federal da Paraíba. Ela ainda pode recorrer da decisão. O desembargador federal Manoel Erhardt foi o relator do processo.
O divórcio litigioso foi concluído em 2010, mas o casal já estava separado desde abril de 2008, época em que a mulher foi destituída da curadoria do ex-marido. Ficou evidenciado, na época, que ela não cuidava do então cônjuge, deixando-o com graves doenças, alimentação insuficiente, falta de higiene e evidentes maus tratos. Após o divórcio, representado por sua nova curadora, o ex-marido propôs ação de exoneração de alimentos, tendo o pleito deferido em virtude da ausência do binômio necessidade e possibilidade.
Prejuízo de R$ 18 mil aos cofres públicos
Segundo a denúncia do Ministério Público Federal – MPF, a ré requereu a pensão por morte, em 2014, escondendo a condição de divorciada. Recebendo os valores por quase um ano, ela gerou um prejuízo de R$ 18 mil aos cofres públicos.
A sentença em primeiro grau definiu a pena privativa de liberdade de um ano e quatro meses de reclusão, em regime aberto, além do pagamento de 13 dias-multa, com valor do dia-multa definido em 1/30 do salário mínimo vigente à época do fato, no ano de 2015.
O crime cometido por ela é tipificado no artigo 171, § 3º do Código Penal, que trata de casos em que se obtém “para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento”.
Princípio da insignificância
Nos autos da apelação criminal interposta no TRF-5, a Defensoria Pública da União – DPU requereu a absolvição da ré, alegando atipicidade da conduta, por aplicação do princípio da insignificância, e erro de tipo por ausência de dolo. Para o relator, contudo, não foi possível considerar tais alegações para esse caso.
“Isto porque não se deve considerar tão-somente a lesividade mínima da conduta do agente, tomada em relação ao valor indevidamente sacado, especialmente nos crimes praticados em desfavor de entidade de direito público, pois atinge mediatamente toda a população, lesando ainda a moral administrativa e a fé pública”, destacou Manoel Erhardt.
O magistrado prosseguiu: “No caso, independentemente dos valores obtidos ilicitamente pela ré, é visível a reprovabilidade da sua conduta, pois sacou, por quase doze meses, benefício previdenciário obtido por meio de fraude, mantendo o INSS em erro, obtendo para si vantagem financeira indevida, razão pela qual não há que se falar em aplicação do princípio da insignificância”.
O relator ainda citou jurisprudências do TRF-5 e do Supremo Tribunal Federal – STF que já consolidaram a orientação no sentido de não ser possível a incidência do princípio da insignificância, independentemente dos valores obtidos indevidamente, nos crimes praticados contra a administração pública.
Erro de tipo por ausência de dolo
Erhardt também rebateu o segundo argumento da defesa, que alegava erro de tipo por ausência de dolo: por ser pessoa humilde e de baixa instrução, a ré desconhecia a modificação de seu estado civil de casada para divorciada. “Afigura-se despropositada a alegação quando a prova dos autos demonstra que a ré tinha plenas condições de entender o caráter ilícito de sua conduta e de comportar-se de maneira diversa.”
“Veja-se que a recorrente, em todas os processos em que foi citada, apresentou defesa, na troca de curatela, no divórcio, na desoneração da obrigação de alimentos do ex-marido, até então em seu favor. Ante o cenário ora apresentado, não é crível a versão da recorrente de ausência de dolo. Tinha total conhecimento de seu estado civil, de que não era mais dependente do de cujus, portanto, não teria direito ao benefício previdenciário de pensão por morte que solicitou”, concluiu o relator.
Fonte: Ibdfam