Reconhecimento post mortem de união estável é possível? Especialista comenta

Uma pessoa que alega ter vivido união estável pode buscar tal reconhecimento após a morte do suposto companheiro? A dúvida intriga tantas pessoas e volta à discussão com certa frequência, diante de casos que repercutem na mídia e perduram na Justiça. Diretor nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, o advogado e professor Rolf Madaleno comenta tal possibilidade.

Segundo o especialista, o reconhecimento de união estável post mortem é possível, mas inclui uma série de implicações. “A dificuldade maior é que vai gerar, entre os herdeiros e o autor da ação, um litígio que suspende o processo de inventário enquanto existir essa outra pendência judicial”, atenta o advogado.

A existência ou não de uma união estável, ele lembra, deve ser demonstrada por ação própria específica e é bastante comum. “Quando os herdeiros não reconhecem a ocorrência dessa união, se faz imperativo o ajuizamento da ação de reconhecimento post mortem”, explica.

Pressupostos

“O que realmente conta em uma ação de reconhecimento post mortem de uma união estável é a caracterização desse relacionamento, se efetivamente segue os pressupostos previstos na lei”, ressalta Rolf. Ele cita o artigo 1.723 do Código Civil, que elenca fatores fundamentais para configuração da união estável.

Segundo Rolf, a lei aponta, entre outros requisitos, a coabitação e a ciência dos demais acerca da existência daquele relacionamento como fundamentais para que o pleito seja atendido. “A relação deve ser pública e notória. Não adianta ser um relacionamento escondido, mantido sem que a sociedade, familiares e pessoas mais próximas tivessem conhecimento. Uma relação furtiva não poderá ser reconhecida como união estável.”

“O principal elemento de configuração da união estável é a intenção de constituir família, o que é feito às claras, de forma induvidosa, não escondido. A estabilidade dessa união (também pressuposto para o reconhecimento) surge como decorrência natural da convivência”, acrescenta o jurista.

União estável simultânea

O advogado atenta que também são frequentes as ações de reconhecimento de uniões estáveis simultâneas a um casamento ou mesmo a outra união estável. “Há cada vez mais processos nesse sentido, até porque existe uma forte doutrina que defende essa possibilidade”, diz Rolf Madaleno.

Ele avalia que, embora “vários grandes expoentes do Direito reconheçam e já exista, inclusive, precedentes judiciais na possibilidade de uniões estáveis simultâneas”, os tribunais superiores têm sido refratários a esses reconhecimentos.

Rolf Madaleno lembra que participou como advogado de um caso julgado pelo Superior Tribunal de Justiça – STJ sobre uma união estável paralela a um casamento que fugiu à regra. “Nesse precedente, a união simultânea foi reconhecida única e exclusivamente para efeitos de atribuição de alimentos da companheira”, detalha.

“É da nossa cultura que as relações sejam monogâmicas e exclusivas. Por isso, tribunais superiores, especialmente o STJ, não tem reconhecido a procedência de relacionamentos simultâneos como uniões estáveis. Talvez com o tempo isso mude, porque, em Direito de Família, nada é estanque, tudo é dinâmico”, assinala Rolf.

 

Fonte: Ibdfam