Sub-registro é preocupante no Brasil

Unicef lança campanha para diminuir marca de 500 mil brasileiros que, a cada ano, deixam de ser registrad



Destino de quem não tem certidão de nascimento: ser uma não-pessoa, sem direito a carteira de identidade, carteira de trabalho, CPF e matrícula em escola. O registro civil, gratuito no Brasil desde 1997, é um direito fundamental. Mas 500 mil crianças ainda nascem por ano e não são registradas no País, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

O número corresponde a 16,4% do total de nascidos vivos naquele ano. Uma campanha nacional, lançada ontem em São Paulo, quer tentar reduzir este índice para 6%. A Bahia é o nono Estado entre os de menor déficit, com 16,1%. Os Estados do Norte e Nordeste são os que mais apresentam sub-registro, de acordo com os dados oficiais.

“O principal problema é que muitas pessoas ainda não sabem que o registro é gratuito”, afirma Vilma Cabral, oficial de projetos na Bahia do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), entidade promotora do projeto lançado ontem.

Pela campanha, um vídeo educativo de 30 segundos começa a ser exibido a partir de hoje pelas emissoras afiliadas à TV Globo. O vídeo explica a importância do registro e como fazê-lo. O serviço é oferecido, de graça, em todos os cartórios de Registro Civil de Pessoas Naturais. Em Salvador, também está disponível em seis unidades do SAC.

A iniciativa do Unicef ocorre simultaneamente à mobilização nacional pelo registro civil de nascimento, em curso há quase três anos. Promovida pelo governo federal, a mobilização já conseguiu reduzir o índice, que era de 20,9% em 2002. Em 1994, o déficit era de 22,2%.

MATERNIDADE – A instalação de postos avançados de registro civil nas maternidades públicas constribuiu para este resultado, segundo Vilma Cabral. “Sabemos que mais de 95% dos partos ocorrem em hospital, portanto o ideal é que o registro ocorra lá mesmo”, diz.

A promotora Lícia Maria de Oliveira, do Ministério Público Estadual, concorda. De olho no êxito de experiências semelhantes no Ceará, Maranhão e Sergipe, elaborou uma minuta de acordo de cooperação com o Tribunal de Justiça da Bahia e enviou à corregedoria do órgão, em abril do ano passado.

O acordo faria com que cada maternidade pública disponibilizasse o serviço. Mas a falta de servidores no Judiciário, segundo a promotora, impediu a assinatura do documento. Procurado para comentar o fato, o atual corregedor do Tribunal de Justiça, João Pinheiro, informou por meio de assessoria que pretende marcar um encontro com o governador Paulo Souto para conversar a respeito.

Na reunião, Pinheiro deve pedir aumento no orçamento do Judiciário para disponibilizar servidores para postos em maternidades. O corregedor também pretende pedir que a Maternidade Salvador, prevista para inaugurar em setembro, seja a primeira a oferecer o serviço.

A idéia também é apoiada pelo Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente. “Quanto mais simplificar o processo, melhor”, diz a presidente do órgão, Fátima Lepikson. E continua: “Registrar assim que nasce seria ideal. E, quando a criança nascer fora do hospital, a comunidade precisa informar a um conselho tutelar”, orienta.

Apesar da necessidade de se efetuar o registro, nenhum direito essencial à criança pode ser negado por causa da falta de certidão de nascimento. Ou seja, se um hospital ou posto de saúde deixar de prestar atendimento, ou uma escola impedir a matrícula, os pais podem registrar queixa no Ministério Público Estadual.

Mas, assim que possível, devem registrar a criança. “Escolas, hospitais, postos médicos devem ter toda a informação necessária para ajudar a resolver este problema. Em vez de negar o serviço, devem encaminhar os pais para um cartório”, analisa Fátima Lepikson.

Economia de tempo e dinheiro

Se pudesse sair do hospital com a certidão de nascimento em mãos, o metalúrgico Evandro dos Santos Cerqueira, 19 anos, seria um pai ainda mais feliz. “Nós, que trabalhamos, temos muita dificuldade de tempo e deslocamento para resolver este tipo de coisa”, diz, ao lado da esposa, Vanuza Cristina Silva de Jesus, 20 anos, e de Evandro Filho, de três dias de vida.

A opinião entre os pais é praticamente unânime: o registro de nascimento é um serviço que deveria estar disponível nas maternidades. “Seria bem melhor, porque no cartório sempre tem filas, senha, e às vezes precisa voltar depois”, analisa o manobrista de ônibus André Luís Pinto Carneiro, 31 anos.

A esposa, Maria Conceição Santos Faleiro, 36 anos, concorda. Ontem, ela e o filho Ian Luís, de cinco dias, receberam alta do Instituto de Perinatologia da Bahia, assim como Vanuza e Evandro. Da maternidade, André Luís iria direto para o cartório.

Onde fazer

No cartório de Registro Civil de Pessoas Naturais mais próximo do local de nascimento. Em Salvador, existem mais de 20 opções de cartórios. O registro também pode ser feito nos postos do Serviço de Atendimento Judiciário (SAJ) localizado nos SACS do shopping Barra, Boca do Rio, Cajazeiras, Iguatemi, no Instituto do Cacau e em Periperi.

Serviço

Somente com a certidão de nascimento, as pessoas podem tirar carteira de identidade, carteira de trabalho, título de eleitor, CPF, ter acesso à Previdência Social e a programas governamentais, matricular-se em escolas, abrir conta bancária e obter crédito, entre outros serviços.

Como registrar

Pai ou mãe devem ir ao cartório com os seguintes documentos:

Declaração de Nascido Vivo, fornecida pelo hospital ou médico

Carteira de Identidade ou Certidão de Nascimento do pai e/ou da mãe

Certidão de Casamento (se casados)
A primeira via do registro de nascimento é gratuita, em qualquer época da vida. A segunda via, para pessoas de até cinco anos, custa R$ 2,20; com mais de cinco, R$ 4,50.

Números

48 milhões de crianças no mundo deixam de receber a certidão no primeiro ano de vida
1,7 milhão moram na América Latina

500 mil nascem por ano no Brasil sem serem registradas

Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) 2004



Fonte: A Tarde – BA