Após decreto que reconhece esses grupos, governo moldará projetos para que beneficiem também comunidades como ciganos e caiçaras
Cerca de 5 milhões de pessoas no Brasil fazem parte de comunidades tradicionais. Elas ocupam um quarto do território brasileiro e representam segmentos diversos – desde os mais conhecidos, como indígenas e quilombolas, até os de menor expressão, como os faxinais (que vivem no Paraná, plantam mate e criam porcos) e os pomeranos (etnia européia que vive no Espírito Santo). Grande parte desses povos mora em lugares distantes e não tem acesso às políticas governamentais, o que os torna mais suscetíveis à pobreza.
“Os municípios de menor IDH [Índice de Desenvolvimento Humano] costumam ter comunidades tradicionais. Como o acesso a políticas é muito pequeno, elas acabam puxando o desenvolvimento da região para baixo”, diz Aderval Costa Filho, coordenador do Núcleo de Povos e Comunidades Tradicionais, ligado à Secretaria de Articulação Institucional e Parcerias do Ministério do Desenvolvimento Social.
Com o objetivo de melhorar os efeitos dos projetos e programas públicos para esses grupos, o governo federal está elaborando a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais. A iniciativa, que deve ficar pronta até maio, pretende estabelecer diretrizes para todos os setores do governo federal. De acordo com o coordenador, elas serão divididas em quatro eixos: acesso aos bens naturais, infra-estrutura, inclusão social e fomento à produção sustentável.
As ações deverão abranger, entre outros pontos, políticas de melhoria do acesso a escolas e postos de saúde; projetos que diminuam o impacto de grandes empreendimentos nos territórios tradicionais; políticas de inclusão social e de reconhecimento da cidadania (como a redução do sub-registro civil); e o incentivo a atividades relacionadas a pesca, extrativismo de ervas e plantas, lavoura e outros produtos comuns a essas populações.
“A implementação [da política nacional] tem mais a ver com a adaptação de programas e políticas governamentais do que com a criação de novas. Todas as políticas pensadas em termos universais têm que ser adaptadas às realidades particulares”, argumenta Costa Filho. Segundo ele, a realização das ações vai passar pelo crivo de associações que fazem parte da Comissão Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais, criada em dezembro de 2004. Foi por meio dela que se constituiu um decreto presidencial, em 7 de fevereiro deste ano, reconhecendo as populações tradicionais.
A comissão é composta por representantes do governo federal e de 15 comunidades tradicionais: faxinais, fundo de pasto, geraizeiros, pantaneiros, caiçaras, ribeirinhos, seringueiros, castanheiros, quebradeiras de coco de babaçu, ciganos, comunidades de terreiros, pomeranos, sertanejos e agroextrativistas. Elas fazem parte do grupo por estarem estabelecidas em forma de organizações. “O governo estabelece a interlocução com as associações. Normalmente, o acesso aos recursos públicos é feito por meio das associações, que tem CNPJ [Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica]. As comunidades que não têm precisam do apoio do governo para formalizar essa organização”, diz o coordenador.
A Política Nacional está sendo elaborada pelos ministérios, mas uma proposta preliminar – que inclui os quatro eixos – foi apresentada pela comissão. Ela aborda, inclusive, modificações no sistema previdenciário, destaca Costa Filho. “Há muitas atividades ocupacionais e religiosas que não são contempladas pelo sistema previdenciário. A aposentadoria de um sacerdote da igreja católica está assegurada, mas a de um babalorixá (pai-de-santo) não está”, exemplifica.
O que são comunidades tradicionais
O decreto que reconheceu essas comunidade as define do seguinte modo:
“São grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem como tais, que possuem formas próprias de organização social, que ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas geradas e transmitidas pela tradição”.
Fonte: PNUD