Neste blog publiquei recentemente dois tópicos com relato histórico do papel das serventias de registro e notas na solução consensual de conflitos, seja por meio dos Juizados de Paz, seja pela formalização de escritura pública de transação.
Pois bem. Em 2013 a Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo autorizou a implementação da mediação e conciliação nas Serventias Extrajudiciais do Estado de São Paulo, por meio do Provimento CG nº 17/2013 e parecer respectivo.
O ato normativo foi, contudo, questionado pela Seccional Paulista da Ordem dos Advogados do Brasil, que formulou pedido de providências ao Conselho Nacional de Justiça, protocolado sob o nº 0003397-43.2013.2.00.0000.
A Conselheira Gisela Gondin Ramos, Advogada indicada pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, afirmou, na oportunidade que: “o ato da Corregedoria Geral de Justiça de São Paulo parece extrapolar o âmbito regulamentar que lhe é próprio, imiscuindo-se em matéria de competência exclusiva da União Federal, cominando atribuição às Serventias de Notas que não lhe são próprias”.
E por fim deferiu “o pedido cautelar para determinar a suspensão da entrada em vigor do Provimento n. 17, de 5 de junho de 2013, da Corregedoria Geral da Justiça do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo até deliberação final pelo Conselho Nacional de Justiça”. Leia o voto na íntegra.
Em sessão plenária realizada em 10 de setembro de 2013, o Conselho, por maioria, “ratificou a liminar, nos termos apresentados pela Relatora”, conforme certidão de julgamento.
Até o presente momento o pedido está pendente de apreciação.
No entanto, a questão merece ser reanalisada, à luz do novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015), diploma que em inúmeros dispositivos prestigiou a solução consensual dos conflitos.
Nesse sentido, estabeleceu que:
Art. 3º Não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito.
[…]
§ 2º O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos.
§ 3º A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial.
[…]
Art. 165. Os tribunais criarão centros judiciários de solução consensual de conflitos, responsáveis pela realização de sessões e audiências de conciliação e mediação e pelo desenvolvimento de programas destinados a auxiliar, orientar e estimular a autocomposição.
§ 1º A composição e a organização dos centros serão definidas pelo respectivo tribunal, observadas as normas do Conselho Nacional de Justiça.
§ 2º O conciliador, que atuará preferencialmente nos casos em que não houver vínculo anterior entre as partes, poderá sugerir soluções para o litígio, sendo vedada a utilização de qualquer tipo de constrangimento ou intimidação para que as partes conciliem.
§ 3º O mediador, que atuará preferencialmente nos casos em que houver vínculo anterior entre as partes, auxiliará aos interessados a compreender as questões e os interesses em conflito, de modo que eles possam, pelo restabelecimento da comunicação, identificar, por si próprios, soluções consensuais que gerem benefícios mútuos.
[…]
Art. 167. Os conciliadores, os mediadores e as câmaras privadas de conciliação e mediação serão inscritos em cadastro nacional e em cadastro de tribunal de justiça ou de tribunal regional federal, que manterá registro de profissionais habilitados, com indicação de sua área profissional.
§ 1º Preenchendo o requisito da capacitação mínima, por meio de curso realizado por entidade credenciada, conforme parâmetro curricular definido pelo Conselho Nacional de Justiça em conjunto com o Ministério da Justiça, o conciliador ou o mediador, com o respectivo certificado, poderá requerer sua inscrição no cadastro nacional e no cadastro de tribunal de justiça ou de tribunal regional federal.
§ 2º Efetivado o registro, que poderá ser precedido de concurso público, o tribunal remeterá ao diretor do foro da comarca, seção ou subseção judiciária onde atuará o conciliador ou o mediador os dados necessários para que seu nome passe a constar da respectiva lista, a ser observada na distribuição alternada e aleatória, respeitado o princípio da igualdade dentro da mesma área de atuação profissional.
§ 3º Do credenciamento das câmaras e do cadastro de conciliadores e mediadores constarão todos os dados relevantes para a sua atuação, tais como o número de processos de que participou, o sucesso ou insucesso da atividade, a matéria sobre a qual versou a controvérsia, bem como outros dados que o tribunal julgar relevantes.
§ 4º Os dados colhidos na forma do § 3º serão classificados sistematicamente pelo tribunal, que os publicará, ao menos anualmente, para conhecimento da população e para fins estatísticos e de avaliação da conciliação, da mediação, das câmaras privadas de conciliação e de mediação, dos conciliadores e dos mediadores.
§ 5º Os conciliadores e mediadores judiciais cadastrados na forma do caput, se advogados, estarão impedidos de exercer a advocacia nos juízos em que desempenhem suas funções.
§ 6º O tribunal poderá optar pela criação de quadro próprio de conciliadores e mediadores, a ser preenchido por concurso público de provas e títulos, observadas as disposições deste Capítulo.
Art. 168. As partes podem escolher, de comum acordo, o conciliador, o mediador ou a câmara privada de conciliação e de mediação.
§ 1º O conciliador ou mediador escolhido pelas partes poderá ou não estar cadastrado no tribunal.
§ 2º Inexistindo acordo quanto à escolha do mediador ou conciliador, haverá distribuição entre aqueles cadastrados no registro do tribunal, observada a respectiva formação.
§ 3º Sempre que recomendável, haverá a designação de mais de um mediador ou conciliador.
Art. 169. Ressalvada a hipótese do art. 167, § 6º, o conciliador e o mediador receberão pelo seu trabalho remuneração prevista em tabela fixada pelo tribunal, conforme parâmetros estabelecidos pelo Conselho Nacional de Justiça.
§ 1º A mediação e a conciliação podem ser realizadas como trabalho voluntário, observada a legislação pertinente e a regulamentação do tribunal.
§ 2º Os tribunais determinarão o percentual de audiências não remuneradas que deverão ser suportadas pelas câmaras privadas de conciliação e mediação, com o fim de atender aos processos em que deferida gratuidade da justiça, como contrapartida de seu credenciamento.
[…]
Art. 175. As disposições desta Seção não excluem outras formas de conciliação e mediação extrajudiciais vinculadas a órgãos institucionais ou realizadas por intermédio de profissionais independentes, que poderão ser regulamentadas por lei específica.
Parágrafo único. Os dispositivos desta Seção aplicam-se, no que couber, às câmaras privadas de conciliação e mediação.
Ou seja, o novo Código de Processo Civil previu expressamente que os tribunais criarão centros judiciários de solução consensual de conflitos, competindo ao respectivo tribunal a composição e a organização desses centros (art. 165 e § 1º). E mais: previu a possibilidade de outras formas de conciliação e mediação extrajudiciais vinculadas a órgãos institucionais ou realizadas por intermédio de profissionais independentes (art. 175).
Notários e registradores são profissionais do direito, dotados de fé pública, a quem é delegado o exercício da atividade notarial e de registro, após aprovação em concurso público, sujeitos à fiscalização do Poder Judiciário (Lei nº 8.935/1994, art. 3º; 14, inciso I; e 37).
Nesse contexto, conclui-se que o Provimento CG nº 17/2013, da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo é plenamente compatível com a regulamentação preconizada pelo novo Código de Processo Civil, em relação à conciliação e à mediação.
Reginaldo Velloso – Tabelião e Mestre em Direito Comercial pela Universidade de São Paulo
Fonte: Blog Reginaldo Velloso