Divórcio direto – Cônjuge-virago – Nome de solteira – Necessidade de atribuição de culpa

– Nos termos do art. 1.578 do CC/2002, somente o cônjuge declarado culpado na ação de separação judicial perde o direito de usar o sobrenome do outro e desde que requerido pelo cônjuge inocente.

– Verificando-se que a alteração vai gerar distinção entre o seu nome de família e dos filhos havidos da união dissolvida, deve ser mantido o sobrenome do ex-marido.

Apelação Cível n° 1.0024.07.474216-4/001 – Comarca de Belo Horizonte – Apelante: C.S.B.M.S. – Apelado: G.A.S. – Relatora: Des.ª Teresa Cristina da Cunha Peixoto

A C Ó R D Ã O

Vistos etc., acorda, em Turma, a 8ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, em dar provimento ao recurso.

Belo Horizonte, 17 de abril de 2008. – Teresa Cristina da Cunha Peixoto – Relatora.

N O T A S  T A Q U I G R Á F I C A S

Proferiu sustentação oral, pela apelante, o Dr. Márcio Gabriel Diniz.

DES.ª TERESA CRISTINA DA CUNHA PEIXOTO – Sr. Presidente.

Ouvi, com atenção, a sustentação oral proferida pelo Dr. Márcio Gabriel Diniz.

Meu voto é o seguinte:

Conheço do recurso, por estarem reunidos os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de sua admissibilidade.

Trata-se de “ação de divórcio direto“ ajuizada por G.A.S. contra C.S.B.M.S., alegando que contraíram matrimônio em 30.04.1987, sob o regime de comunhão parcial de bens, de cuja união nasceram dois filhos, L.B.M.S. e G.A.S.J., mas se encontram separados de fato há mais de cinco anos, sendo impossível a reconciliação, já que constituiu nova família. Sustenta que a requerida tem a guarda do filho G. e que contribuiu com pensão alimentícia, já tendo ajuizado revisional de alimentos, ressaltando que a requerida tem renda própria, não dependendo de alimentos, e que o casal não tem bens a partilhar, pugnando pela procedência do pedido.

O MM. Juiz de primeiro grau (f. 39/44) julgou procedente o pedido, decretando o divórcio do casal litigante, “devendo a requerida voltar a usar o nome de solteira, qual seja C.S.B.M.“ (f. 44), deixando de condenar a requerida no pagamento das custas, em face da assistência judiciária deferida, impondo-lhe, contudo, a quitação dos honorários advocatícios, arbitrados em 20% do valor da causa, suspendendo a exigibilidade.

Inconformada, apelou a suplicada (f. 45/55), suscitando, preliminarmente, a ocorrência de decisão extra petita, visto que “o julgador somente poderia determinar a retirada do patronímico do ex-marido do nome da mulher quando expressamente requerido pelo cônjuge, o que, todavia, não ocorreu na hipótese dos autos“ (f. 48), pugnando, por isso, pelo decote.

Sustenta, em sede meritória, que “a determinação do retorno do nome da apelante ao nome de solteira implicará manifesta distinção entre o nome da mãe e o nome do seu filho, afrontando, desta forma, o disposto no inciso II do art. 1.578 do Código Civil (correspondente ao inciso II do art. 25 da Lei do Divórcio)“ (f. 52), requerendo, por isso, o provimento do apelo.

Contra-razões às f. 57/63.

Parecer da douta Procuradoria Geral de Justiça (f. 72/75), opinando pelo provimento do recurso.

Revelam os autos que G.A.S. ajuizou “ação de divórcio direto“ em face de C.S.B.M.S., objetivando a decretação do divórcio do casal, pedido julgado procedente em primeiro grau de jurisdição, determinando que a requerida volte a usar o nome de solteira, com o que não concordou a requerida, através da interposição de recurso.

Nos termos do art. 1.578 do Código Civil brasileiro, o cônjuge declarado culpado na ação de separação judicial perde o direito de usar o sobrenome do outro, desde que expressamente requerido pelo cônjuge inocente e se a alteração não acarretar evidente prejuízo para a sua identificação, manifesta distinção entre o seu nome de família e o dos filhos havidos da união dissolvida e dano grave reconhecido na decisão judicial.

Yussef Said Cahali, ao tratar dos efeitos da separação judicial ensina sobre o tema:

“Porém, à diferença do direito anterior, a perda do sobrenome do cônjuge não ocorre de pleno direito: além da necessidade de requerimento expresso do outro cônjuge, a perda do direito ao uso do sobrenome de casado só se defere se a alteração não acarretar: I – evidente prejuízo para a sua identificação; II – manifesta distinção entre seu nome de família e o dos filhos havidos da união dissolvida; III – dano grave reconhecido na decisão judicial“ (Divórcio e separação. 11. ed. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2005, p. 699).

Assim, tanto os termos da lei quanto da doutrina deixam claro que é necessário o requerimento expresso do cônjuge inocente, para a perda do sobrenome do cônjuge, o que, no caso em espeque, não veio expresso, até porque o autor não atribuiu culpa a qualquer das partes, mas postula o divórcio direto com base no tempo decorrido da separação de fato.

Registro que o pedido de determinação ao Cartório de Registro Civil do Terceiro Subdistrito de Belo Horizonte/MG, para que proceda à devida averbação, deduzindo-se assim seus efeitos jurídicos e legais não pode ser tido como requerimento para perda do sobrenome do cônjuge, uma vez que a legislação exige que haja pedido expresso e, no caso, somente o pedido teria sido implícito.

Dessa feita, caracterizada está a decisão extra petita, devendo haver o decote, e não a nulidade da sentença, como, aliás, requerido pela apelante.

Ainda que assim não fosse, anoto que, no caso em espeque, além de não ter sido atribuída culpa a qualquer dos cônjuges, mormente a requerida, o certo é que a alteração comprovadamente acarretará distinção entre o seu nome de família e dos filhos havidos da união dissolvida, já que o filho menor do casal recém-divorciado chama-se G.A.S.J., pelo que, em razão de somente ter o nome do pai, a supressão do sobrenome da requerida acabará por gerar uma distinção com seu filho, o que a legislação visa afastar.

Regina Beatriz Tavares da Silva, na obra Novo Código Civil comentado, 3. ed., Coordenação de Ricardo Fiúza, Ed. Saraiva, 2004, p. 1.429/1.430, esclarece que:

“O nome é o direito da personalidade, que, na expressão do saudoso Prof. Carlos Alberto Bittar, opera a `ligação entre o indivíduo e a sociedade em geral`, identificando a pessoa em suas relações profissionais e sociais (v. Carlos Alberto Bittar, Os direitos da personalidade, 3. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1999, p. 124). Sua aquisição dá-se pelo nascimento, com o respectivo registro, podendo ser modificado, com o casamento, por meio da aquisição do patronímico do cônjuge, na conformidade deste Código Civil (art. 1.565, § 1º). A Constituição da República, em seu art. 5º, tutela os direitos da personalidade, estabelecendo sua inviolabilidade. […].

Na redação atual, para que ocorra a perda do nome, é necessário que, além da decretação da culpa do cônjuge, seja feito pedido expresso pelo outro consorte. Também foram estabelecidas ressalvas à perda do nome, nos casos em que a alteração do sobrenome possa acarretar evidente prejuízo para a identificação, manifesta distinção entre o nome de família e os dos filhos havidos da união dissolvida ou, ainda, dano grave reconhecido em decisão judicial“.

Nesse sentido:

“Direito civil. Divórcio direto. Separação de fato. Prova do biênio factual. Boletins de ocorrência não elididos por outra prova válida. Nome de casada. Manutenção. Art. 25, II, Lei 6.515/77. Alimentos em favor dos filhos. Fixação. Apelação provida.

1. O boletim de ocorrência, como documento público que é, goza de presunção de veracidade juris tantum, devendo ser elidido por prova em contrário.

2. Não elidida, vale como prova do tempo mínimo de separação de fato, necessário ao divórcio direto, tal como exige o art. 226, § 6º, da CF.

3. Se, ao deixar a mulher de usar o nome de casada, ocorrer manifesta distinção entre o seu nome de família e o dos filhos havidos da união dissolvida, o art. 25 da Lei 6.515/77 autoriza-lhe a continuar usando o nome de família do ex-marido.

4. Os alimentos devem ser fixados segundo o binômio possibilidade do alimentante/necessidade do alimentando“ (Processo nº 1.0525.05.071978-6/001(1), Rel. Des. Nepomuceno Silva, publ. em 17.05.2007).

Dessa forma, além de inexistir pedido expresso para a perda do sobrenome do marido, o que, por si só, já é capaz de decotar da sentença a parte que condenou a requerida a voltar a usar o nome de solteira, também restou comprovado, nos autos, que a referida alteração acarretará distinção entre seu nome e de seus filhos.

Mediante tais considerações, dou provimento ao recurso, para decotar a determinação contida na decisão singular de que a requerida volte a usar o nome de solteira.

Custas recursais, pelo apelado, na forma da lei.

DES. FERNANDO BOTELHO – Sr. Presidente.

Ouvi, com atenção, a precisa sustentação oral da tribuna feita pelo Dr. Márcio Gabriel Diniz e não cheguei à outra conclusão, do exame dos autos, senão àquela que consta do voto da eminente Relatora, que enfrentou a matéria com a precisão de costume.

Dou provimento ao recurso, nos termos do voto de S. Ex.ª.

DES. FERNANDO BRÁULIO – De acordo.

Súmula – DERAM PROVIMENTO AO RECURSO.


Fonte: Jornal “Minas Gerais” – 07/08/2008